sábado, 18 de março de 2017

G. I. Gurdjieff - Essentuki, 1918



Já disse que existem pessoas que estão sedentas e famintas pela verdade. Se elas examinarem os problemas da vida e forem sinceras com relaçâo a si mesmas, muito em breve ficarão convencidas que não é possível viver como têm vivido e serem o que têm sido até então.
É essencial que haja uma saída dessa situação.
O homem pode desenvolver suas capacidades e poderes ocultos apenas ao limpar sua máquina da sujeira que se acumulou nela no curso de sua vida. Mas de modo a poder empreender essa limpeza de uma maneira mais racional, ele tem de ver aonde, como e o quê deve ser limpo. Mas ver isso de si mesmo é quase impossível. Para poder ver algo, a pessoa tem que ver de fora, ajuda mútua é necessária.
Se você lembrar do exemplo que eu dei (da identificação*) você verá o quão cega uma pessoa está quando se identifica com seus humores, sentimentos e pensamentos. Mas a nossa dependência das coisas está limitada apenas ao que pode ser observado num primeiro balanço? Pois essas coisas estão tão em evidência que não podem passar desapercebidas. Lembrem-se quando falamos sobre o caráter das pessoas, dividindo-as grosseiramente em boas e más. Conforme a pessoa começa a conhecer a si mesma, ela descobre novos domínios de sua vontade, vê que o seu "eu quero" não tem poder algum. Descobre domínios que não estão sujeitos a ela, coisas tão confundidas e sutis que é impossível encontrar uma saída delas sem ajuda de algum guia que tenha a autoridade para isso, sem a ajuda de alguém que conheça.
Brevemente, esse é o estado das coisas no reino do autoconhecimento: para fazer, a pessoa deve conhecer, mas para conhecer é preciso descobrir 'como' conhecer. Não podemos descobrir isso por nós mesmo.
Além do autocohecimento, há um outro lado da busca - o autodesenvolvimento.
É claro que aqui também a pessoa que é deixada apenas com seus próprios recursos não pode adquirir o conhecimento de como desenvolver a si mesma e, ainda menos, o que exatamente desenvolver.
Gradualmente, ao encontrar pessoas que estão buscando e ao conversar com elas e ler livros relevantes, ela é atraída para uma esfera de questões relacionadas ao autodesenvolvimento.
E o que encontrará ali? Primeiramente, um abismo de charlatanismo imperdoável. Mas antes que aprenda a separar o joio do trigo, um longo tempo deve passar e talvez o próprio impulso de encontrar a verdade irá se esvair e abandoná-la.
Portanto, quanto mais a pessoa estuda os obstáculos e enganos que aguardam a cada passo nessa esfera, mais se torna convencida de que é impossível trilhar esse caminho do autodesenvolvimento seguindo instruções casuais de pessoas casuais ou do tipo de informação selecionada de conversas e leituras casuais.
O Grande Conhecimento é transmitido sucessivamente de era a era, de pessoa para pessoa, de raça para raça. Os grandes centros de iniciação na Índia, Assíria, Egito, Grécia iluminam o mundo com uma luz brilhante. Os nomes reverenciados dos Grandes Iniciados , os portadores vivos da Verdade, são passados com reverência de geração para geração. A Verdade está fixada através de escritos simbólicos e lendas e é assim transmitida para o povo para a sua preservação na forma de costumes e diferentes cerimônias.
(Em transmissões orais, memoriais, arte sagrada, tais como as danças sagradas, música, escultura e vários rituais e costumes.) Após algum período experimental definido é transmitida abertamente para aqueles que buscam-na e é preservada pela tradição oral na corrente daqueles que são conhecedores. Depois de passado um certo período, esses centros de iniciação morrem um após o outro e o conhecimento antigo parte para os canais subterrâneos, nas profundezas, ocultando-se dos olhos dos buscadores.
Os detentores do conhecimento também se ocultam, tornam-se desconhecidos daqueles que os circundam, mas eles não deixam de existir.
De tempos em tempos as correntes rompem para a superfície, mostrando que em algum lugar bem profundo a poderosa corrente do antigo conhecimento e ser antigos continua a fluir mesmo em nossos dias.
Atravessar para essa corrente, encontrá-la, é a tarefa e o objetivo da busca. Pois, tendo encontrado, a pessoa pode confiar-se inteiramente ao caminho que pretende trilar. Então resta apenas "fazer" para poder "saber" e "ser".
Nesse caminho a pessoa não estará totalmente sozinha. Em momentos difíceis ela receberá suporte e orientação, pois todos os buscadores que seguem esse caminho estão conectados por uma corrente ininterrupta.
Para uma pessoa que está buscando com todo o seu ser, com todo o seu eu interior, vem uma convicção infalível de que descobrir como 'conhecer' de modo a 'fazer' é possível apenas ao encontrar um guia com experiência e conhecimento.
E é aqui que o faro da pessoa é mais importante do que em qualquer lugar. Todo buscador geralmente sonha com tal guia, mas raramente questiona-se sincera e objetivamente: se ele mesmo é digno de ser guiado, se está pronto para seguir o caminho.
Pergunte a si mesmo. O que você quer? Onde você tem a intenção de ir? O que você está empreendendo? E será que aquilo que você quer é apenas um devaneio?
Questione-se a respeito de seus objetivos e expectativas, suas intenções e meios de alcança-las. Sobre as demandas que poderão recair sobre você e a respeito de seu preparo para atendê-las.
Um caminho difícil e longo está diante de você. Você está se preparando para um terreno estranho e desconhecido. O caminho é infinitamente longo, Você não sabe se será possível descansar no caminho. Você deve estar preparado para o pior.
Meça a sua força. Será ela suficiente para toda a jornada e o quão breve você pode iniciar?
Cada minuto é precioso. Uma vez decidido ir não a motivo para perder tempo.
Não cogite tentar voltar para trás. Esse experimento pode custar caro. O guia se propõe apenas a levar-lhe para lá e se você desejar voltar ele não tem obrigação de voltar om você. Você será deixado sozinho e aflições recairão sobre você se se você fraquejar ou esquecer o Caminho. Você jamais voltará. E mesmo se você lembrar-se do Caminho, a questão ainda permanecerá< você retornará a salvo e inteiro? Pois muitos infortúnios esperam o viajante solitário que não está familiarizado com o Caminho e os costumes que vogam lá. Tenha em mente que a sua visão tem a propriedade de representar objetos distantes como se estivessem perto de você. Enganado pela proximidade da meta, cegado por sua  beleza e ignorante da medida de sua própria força, você não notará os obstáculos no caminho, não verá as valas que confundem o caminho. Num prado verdejante coberto de flores luxuriosas, na mata espessa um abismo está escondido. É muito fácil tropeçar e cair nele se os seus olhos não estiverem concentrados no passo que você está dando. Não esqueça de concentrar toda a sua atenção no setor mais próximo do caminho. Não se preocupe com objetivos distantes se você não quiser cair no precipício.
Ainda assim não esqueça do seu objetivo. Lembre-se dele o tempo todo e mantenha um empenho ativo nessa direção, de modo a não perder a direção correta. E uma vez que você tiver começado esteja atento, porque as coisas que você tiver passado ficarão para trás e não surgirão novamente. Assim, se você falhar em notar aquilo naquele determinado momento, você não notará nunca mais. Não seja curioso de mais, nem desperdice tempo em coisas que atraem sua atenção sem merecimento.
O tempo é precioso e não deve ser desperdiçado em coisas que não tem relação direta com sua tarefa.
Lembre-se onde você está e por que você está aqui.
Não se poupe e lembre-se que nenhum esforço é feito em vão.

*Pesquisar no blog o termo 'identificação' para a melhor compreensão.