sábado, 30 de outubro de 2010

Nisargadatta Maharaj - Março e Abril de 1981



29 de março de 1981


Pergunta: Se a consciência em todas as formas diferentes é idêntica, por que, então, os pensamentos e as ações diferem de um ser humano para o outro?

Maharaj: Os pensamentos e as ações pertencem ao corpo-mente e o corpo-mente é a essência dos cinco elementos. A natureza da forma depende dos vários graus dos cinco elementos e dos três gunas. Os pensamentos e as ações dependem do condicionamento recebido desde o momento que a consciência surgiu ali. Sem a consciência, haveria apenas formas mortas.

A consciência e o corpo são mantidos em funcionamento pelos alimentos e remédios que consumimos. Em cada forma os pensamentos, as palavras e as ações dependem não apenas do condicionamento que a forma recebeu depois que foi criada, mas também dependem até mesmo do condicionamento no momento da concepção. A consciência estava latente naquela química pré-natal.

Que incrível é o fato de a pessoa identifica-se com o corpo. A quanto tempo você vem seguindo a espiritualidade?

P: Há quarenta anos. Estive seguindo o “Quem sou eu?” do Ramana Maharshi e li o livro dos ensinamentos do Maharaj.

M: Até aí, muito bom. O que você entende do seu próprio Ser? O que você é?

P: A consciência.

M: O Definitivo é anterior a qualquer experiência. O “sentido de eu sou” (I amness) é o início da experiência. No Definitivo apareceu o “sentido de conhecer” (knowingness) e a questão surgiu: “Quem, ou o que, sou eu?” Esse sentimento de ser não é colorido por forma. É apenas um sentimento de “eu sou”. Essa foi a primeira experiência.

P: Isso é Maya.

M: Por que você não obtém uma resposta para “quem sou eu”, você dá a resposta que isso é Maya. Você não pode capturar isso através de uma resposta. Com o que você se identifica?

P: Eu sou o Brahman.

M: Essa não é a sua experiência direta. Você está apenas repetindo o que leu e ouviu. O que você pensa que você é?

P: Eu experimentei …

M: A experiência pode ocorrer quando o “sentido de eu sou” está aí, mas antes dessa experiência “eu sou”, qual era o estado?

P: Eu não sei.

M: Estou falando para você porque você tem a sabedoria para entender.

P: Eu posso parar esse “sentido de eu sou” e estar antes do “sentido de eu sou”?

M: Que processo natural você pode parar? Tudo é espontâneo. Atualmente você está na consciência, que está ativa, vibrante. Não pense que você é algo separado dessa consciência ativa e vibrante. Você, a consciência, é o produto da comida consumida.

No nível da consciência ativa, que é o Ser e que é atividade, não pode haver identidade de um corpo.

P: Como posso ser convencido disso?

M: Quando você permanece quieto em seu Ser, você recebe a convicção. Você permanece em quietude.



6 de abril de 1981


Pergunta: Quando sento-me aqui fazendo perguntas para você, sinto-me em paz. Isso não é um sinal que mostra progresso?

Maharaj: Do que você esta falando? Você está falando coisas do nível do jardim da infância. Não vou me dirigir a você como um estudante da classe mumuksha, vou dirigir-me para a classe do sadhaka. Há quanto tempo você pratica a espiritualidade?

P: Desde a infância, pois minha família vem praticando espiritualidade já há gerações, portanto tenho a espiritualidade como um hobby.

M: Muito bom. No entanto, você ainda está no nível do jardim da infância. A única solução para você é abandonar sua identidade com o corpo-mente.

P: Sei de tudo isso intelectualmente, mas não experimento assim, por isso venho para o satsang.

M: O que você quer dizer com satsang? Isso é apenas um jargão espiritual convencional. Agora você sai daqui com a idéia “eu sou Brahman, sem nenhuma forma ou desenho e sem nenhuma inclinação mental. Eu sou a consciência manifesta.” Quando perceber que você é sem forma, não haverá casta ou credo para você, não sobrarão conceitos.

O mumukshu está no jardim da infância, ele é inclinado espiritualmente mas está identificado com o corpo-mente. O sadhaka é aquele que desidentificou-se do corpo-mente. O Siddha é aquele que estabilizou-se no conhecimento “eu sou” e nesse processo transcendeu-o. Nesta jornada você sabe muito bem onde você está.


[Falando para outra pessoa] A mãe deste jovem estava em seu leito de morte, mas eu disse com convicção que ela não iria morrer. Isso aconteceu anos atrás e hoje ela ainda está viva. A mãe dele estava tão convencida de que iria morrer que comprou algumas flores específicas que ela gostava para o seu funeral. Eu ordenei que ela levantasse que fosse preparar um chá para mim.

Naquela época, minha atitude era “eu sou o Brahman”, hoje em dia essa atitude foi descartada. Naquela época eu tinha uma firme convicção que qualquer coisa que eu coloca-se a mão tomaria forma, o que eu quisesse aconteceria.

Neste mesmo local muitas coisas aconteceram. Os Bhajans têm acontecido aqui desde 1932. Eu fui o primeiro inquilino no prédio Vanmali.


[Houveram mais conversas sobre outros milagres que aconteceram ali. Muitos milagres aconteceram em torno de Maharaj, mas ele nunca se ocupava em falar do passado ou do futuro]


M: As pessoas vinham aqui esperando resolver seus problemas e quando eu perguntava por que elas tinham vindo, elas simplesmente relatavam seus problemas. Eu lhes dizia: “O próprio fato de você ter vindo aqui significa que seu problema está fadado a se resolver. Você pode ir.” Agora todos vocês estão vindo aqui, quem os está atraindo para cá? É o seu próprio sentido de ser (beingness). Vocês são atraídos para este lugar por causa de uma certa qualidade em vocês. Você estão se estabilizando no estado mais elevado. Não é uma atração mundana que os traz aqui. Nem vocês nem ninguém mais sabe nada sobre essa atração. A atração para vocês é por estar em sua morada eterna, esse é o lar de vocês. Quando essa atração surge, vocês vêm aqui.


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22 de abril de 1981

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Maharaj: O universo inteiro é experimentado na consciência "eu sou". Se isso não estiver aí, o que mais pode existir? Essa consciência está tocando um tambor, todos são levados pelo som do tambor. Quem procura pelo tamborileiro? Que está batendo e tocando o tabor? É tão incrível que ninguem nem mesmo olhe de relance para essa centelha de consciência.

Pergunta: Quando me estabilizo na consciência, isso é meditação?

M: Quem está estabilizando? Não é a própria consciência?

Esta moça compreendeu sua natureza. Tudo se deve à fé dela no Guru. Qualquer coisa que se refira a mim é sagrado para ela. A menos que você tenha uma fé assim no Guru você não alcançará a fé no seu Ser. Algumas pessoas vão de um swami a outro, para quê? Para lamber suas sobras. Se elas lambessem suas próprias sobras, quão melhor seria.

Firme-se à sua própria consciência, permaneça nela. Todo o fardo de seus conceitos você deveria fundir em sua consciência, mas não use sua consciência para construir edifícios de conceitos.

P: Os hábitos são uma grande força que nos fazem nos perder, não são?

M: O hábito de considerar o Ser como sendo o corpo influenciou a todos demasiadamente. O conhecimento 'eu sou' é o seu Guru, esteja nele.

Quem é esse que canta o bhajan? É o intelecto desse Guru - quem é você, um intruso? É claro, a ação de todo mundo depende desse intelecto, mas quando esse intelecto atinge o seu ápice, ele funde-se em Parabrahman.

Vocês todos continuam a escrever um diário de seus prórpios conceitos - eu lhes digo, finalmente, é totalmente inútil. Isso servirá apenas como um instrumento de aprisionamento.

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7 de março de 1981



Pergunta: Ao seguir o que Maharaj diz, o resultado pode ser um tipo de comportamento que será considerado peculiar no mundo.

Maharaj: O comportamento de quem? E considerado peculiar por quem? Tudo o que existe é a essência dos cinco elementos. Através dessa apercepção, a natureza dos cinco elementos não vai mudar. A essência dos cinco elementos é esse sentido de presença momentâneo, enquanto comparado com a eternidade.

Você vem aqui com um sentimento de amor com relação a mim e você vai se beneficiar na medida em como você me perceber. Se continuar a me ver como um indivíduo, essa será a medida do seu benefício. Se você me ver como eu vejo a mim mesmo e como vejo você, essa será a medida ulterior de seu benefício. O estado real é aquele estado que era anterior ao aparecimento da consciência. Muito poucos irão chagar a esse estado. A maioria de vocês não irá querer ir além da identificação com uma entidade ou um corpo.

Essa identificação que vem mudando desde a infância até o seu presente estado e que continuará mudando no curso do tempo, é puramente sazonal.

Você se identifica com o corpo por força de boatos. Seus pais lhe falaram que você nasceu numa certa data e que este corpo é o que você é. Então, baseado em boatos você formou sua identidade com uma certa imagem. Você pode pensar que agora você se tornou um jnani e que conhecerá sua identidade muito bem, mas muito frequentemente isso é um caso de engano sensorial. Qualquer que seja sua imagem de si mesmo não será nada além de um conceito.

Apenas compreenda o que você é e prossiga sua vida cotidiana da melhor maneira que puder.

P: A devoção diária (puja) é observada aqui?

M: Sim. Aqui o adorador é a consciência e o objeto da adoração é também a consciência.