quinta-feira, 25 de fevereiro de 2010

Rodney Collin - Teoria da Harmonia Consciente

(Notas relacionadas ao trabalho sobre si, baseado nos ensinamentos do Quarto Caminho)


Considerando a circulação livre como uma condição de saúde, é muito claro que uma circulação forte traga saúde e novas possibilidades para todas as partes de um organismo. Onde há constrição, a doença ataca. Penso que isso seja verdade em todas as escalas. Obviamente, é assim no corpo. Mas também é assim na nossa vida, onde o que circula é a memória. Aquelas partes ou incidentes em nossas vidas que não queremos lembrar, começam a apodrecer, e seu veneno pode se espalhar até mesmo para o presente em todos os tipos de medos e prejuízos. Por outro lado, através de plena memória do passado, o que agora entendemos e almejamos pode fluir de volta para essas partes, curar, mudar sua natureza.
Vemos a mesma coisa num grupo. Quando as idéias e os sentimentos fluem com liberdade e confiança entre todas as pessoas nele, há saúde e vida. Quando um obstáculo surge e uma pessoa se desentende com a outra e não a escuta, novamente venenos se desenvolvem, e portano, os preconceitos tem de ser derretidos ou as discussões resolvidas, antes que a circulação e o grupo possam ficar bem novamente.
Quando nos lembramos de coisas erradas que fizemos, uma espécie de inflamação desenvolve-se. Há um choque entre o que realmente fizemos e aquilo que passamos a sentir, desde então, como o correto. Nossas idéias presentes, carregadas pela corrente da memória, assim como os glóbulos brancos no sangue, encontram um lugar envenenado e tentam curá-lo. Até que façam isso, o local pode ficar muito dolorido e inflamado. Esse é um sinal de que algo está acontecendo.

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O remorso é uma coisa muito estranha. Se pudéssemos imaginar o remorso sem qualquer emoção negativa ligada a ele, poderíamos aprender muito sobre isso.
Mas esses momentos que chamamos por esse nome geralmente acontecem quando vemos a nós mesmos e os resultados de nossas ações passadas sem querer. Penso que devemos fazer isso intencionalmente, pretendendo isso. Temos de tentar lembrar de nós mesmos ao mesmo tempo, lembrar as nossas vidas em detalhe. Através de uma lembrança real e intencional veremos os resultados de nossas ações e atitudes passadas, veremos com quem estamos endividados. Eventualmente, ninguém pode mover-se a menos que suas dívidas sejam pagas. Mas antes de serem pagas, elas devem ser vistas e reconhecidas. E isso só é possível através da lembrança de si*.

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Tudo pode mudar com o tempo, sem limite, mas, provavelmente, numa determinada ordem relacionada exatamente ao pagamento do Karma.

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Eu tenho um entendimento muito forte de que só é possível sair de nossa posição pagando primeiramente todas os nossos débitos. E uma vez que, de fato, estamos em débito com todas as pessoas que já conhecemos, isso significa que temos de corrigir todas as relações na vida corrente, se isso ainda for possível, ou interiormente na nossa mente, se não for possível. Evidentemente a oração correta pode ser uma maneira de fazer isso.
Marcou muito para mim como Ouspensky, ao falar sobre seus pais, parentes ou velhos amigos, sempre recordava as suas possibilidades, seus melhores lados, o que poderiam tornar-se, e nunca lembrava algo negativo ou desagradável sobre eles. Isso também parece ligado com a mesma idéia - de tornar as pessoas melhores do que são.
Para qualquer pessoa que falasse sobre os estados superiores de consciência, ou emoções positivas, ou experiências do homem superior, Ouspensky costumava responder: "Mais tarde você vai ver...' Ou 'Ainda não. . '. ou "Nós vamos chegar a esse ponto mais tarde. . '. ou "Quando chegar a tal ponto, você. . '. sempre com o entendimento de que a pessoa poderia e acabaria por chegar às mais altas possibilidades. Dessa forma, ele tornou possível para eles fazerem isso. E desse mesmo modo, sem que se soubesse como isso acontecia, ele tirava o medo, o medo do fracasso.

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Quando as pessoas estão no caminho certo, provavelmente deveríamos perpetuar apenas aquilo que pertence à sua compreensão mais elevada. Algo relacionado com tornar as pessoas melhores do que elas são, anulando os seus lados fracos. De alguma forma, dessa maneira elas são ajudadas e a pessoa ajuda a si mesma. É bem misterioso.

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Existe alguma matemática interior de causa e efeito que invisivelmente regula a vida dos homens e nenhum sofrimento real é desperdiçado. Apenas o sofrimento imaginário é puro desperdício, levando a lugar nenhum. Sofrimento real é pagamento – pelo que, só Deus sabe, pois não conseguimos lembrar o que estamos devendo – mas é o pagamento de algo que, mais cedo ou mais tarde, deverá ser pago. Apenas não sofra mais do que é necessário, esse é o ponto. Pois sofrer mecanicamente, começar a sofrer por hábito, é começar toda a cadeia novamente. Se podemos evitar isso, mais cedo ou mais tarde o tempo difícil deve passar, e todos os tipos de novas possibilidades aparecem, as quais finalmente, então, através da provação- seremos capaz de usar.

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Alguém passa por sua vida e deixa uma imagem que você não consegue esquecer, nem encontrar conforto. Mas você não deixou tais traços na vida de alguma outra pessoa, sem se importar ou mesmo sem saber? Todo nós já não fizemos isso? Tudo deve se esgotar. Todas as dívidas devem ser pagas. Tudo o que causamos temos de sofrer, antes de podermos nos tornar livres. Portanto, aqueles que desejam a liberdade só podem dizer: 'Venha o que vier, eu vou aceitar'.
Não é porque eu tenha o direito dizer o que digo, mas sim porque foi mostrado que é assim. Nos últimos meses de Ouspensky vimos como ele aceitava estar velho, doente, feio, desamparado, com dor, mal compreendido; e realmente ele fez de tudo para impedir que os outros o confortassem, para sofrer conscientemente, para tornar mais difícil que as pessoas o compreendessem. Pois ser compreendido é o que todos os homens mais desejam, mais do que comida, conforto, até mesmo mais que a vida. E sacrificar ser compreendido pelas pessoas comuns de maneira ordinária é ao mesmo tempo tornar-se livre, e tornar possível um entendimento completamente diferente para aqueles que desejem isso. A partir dessa aceitação absoluta do que tinha de acontecer, do esforço para pagar mais, de sofrer de bom grado e pagar antecipadamente a conta apresentada pelo destino, Ouspensky tornou-se um outro homem e, em parte, vimos como isso foi feito.
Assim, enquanto que para as pessoas comuns só se pode desejar aliviar o sofrimento tanto quanto possível, para aqueles que se conectaram com este caminho de escape, só podemos dizer: "Se você puder sofrer da maneira correta, é bom. Se não puder, não importa.”

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Estou muito interessado na idéia do sofrimento voluntário e involuntário. Primeiro “sacrifique o seu sofrimento”; apenas se a vida toda é vivida de acordo com esse princípio, a idéia do sofrimento intencional parece se tornar prática. Eu acho que é quase impossível para aqueles cujas vidas estão cheias de sofrimento involuntário serem capazes de conceber o sofrimento como uma coisa positiva. Seu objetivo será sempre, e deve ser, fugir do sofrimento. Ao mesmo tempo, isso me parece um objetivo muito limitado. Eu me lembro como me chocou a primeira vez que ouvi uma certa pessoa dizer que o seu objetivo era "não sofrer". Depois eu vi que não poderia ser diferente, porque com toda a força dela, ela estava muito à mercê do sofrimento involuntário.

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O sofrimento é um fixador, como o moderante utilizado para fixar um corante. Ele tende a fixar qualquer parte da natureza do homem que esteja mais sobressalente enquanto o sofrimento está sendo suportado. Naturalmente, se for involuntário, tende a trazer com ele ressentimento, auto-piedade e assim por diante, e fixa-os. Por outro lado, se o homem se recusa a sofrer, exceto quando ele esteja fazendo esforços para um objetivo definido e sabendo o que quer, então ali ele tende a fixar o objetivo e a determinação. Isso é muito útil.

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Precisamos de sofrimento. Nós todos temos de ser purificados. E o sofrimento é o grande purificador. Podíamos desejar que ele não viesse, fosse para nós ou para aqueles a quem desejávamos crescimento e purificação mais do que qualquer outra coisa?

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Se somos pressionados duramente, é para que possamos encontrar fé e nos tornarmos livres. Nosso passado está cheio de lugares fracos, de evasões, desonestidades que pensamos que foram enterrados e esquecidos. Mas eles têm de eclodir. Às vezes é muito amargo. Agora, com essa influência forte que está brilhando sobre nós, todas as falhas estão aparecendo. Nada mais pode ser escondido. Pois tudo tem de ser firme e sólido sob o nosso trabalho. Portanto, quando somos pressionados, lutando com as consequências do passado, é realmente uma prova de que nosso trabalho está forte e correto. Significa que nos está sendo dada a oportunidade de ir mais rápido. Se todas as consequências do passado vêm à superfície é assim que podemos enfrentá-las e nos livrarmos delas de uma vez por todas. E sob uma grande pressão podemos encontrar uma fé que, no conforto, jamais precisaríamos.

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Estou certo que, de certa forma é um princípio esotérico que as gravações** têm de ser 'tornadas corretas'. Não é uma questão de esconder os erros, os dissabores ou qualquer coisa desse tipo. Mas se alguém na peça age fora do personagem, por assim dizer, a gravação tem de corrigir isso. O texto da peça tem que ser mais perfeito do que a peça em si. Como isso pode ser é praticamente impossível dizer. O Novo Testamento deve ser o exemplo perfeito: está tudo certo.

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Tive a sensação de que é preciso repassar com cuidado a nossa vida e pagar nossos débitos. E isso pareceu de alguma forma envolver pedir perdão a todos que conhecemos; pois afinal de contas, estamos em débito, de uma forma ou de outra, com todas as pessoas que já conhecemos, prejudicamos de alguma forma, seja grande ou pequena, e somos nós que devemos procurar ser perdoados de nossos débitos, se quisermos nos tornar livres para nos movermos.

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A vida é muito difícil para quem vê contradições nos outros, mas não em si mesmo.

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Enquanto algumas pessoas estão escravizadas ao ficarem culpando os outros, outras ficam igualmente escravizadas culpando a si mesmas. É a mesma coisa. A Liberdade é quando vemos a nós mesmos de forma imparcial da mesma forma que vemos um desconhecido interessante, sem elogios ou censura.

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Temos de admitir que infelicidade, experiências dolorosas e até mesmo erros óbvios, podem nos ensinar muito, e tomadas da maneira correta essas mesmas falhas e desconfortos podem ser a matéria-prima da qual a compreensão e a vontade são feitas. A reconstrução da vida de alguém não necessariamente significa que essas dificuldades devam ser evitadas. Pelo contrário, pode implicar que nós tenhamos de enfrentar as dificuldades que nesta vida temos evitado.

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É muito doloroso ver inevitavelmente que falhamos, quando sabemos que os incidentes do sono que normalmente parecem tão pequenos, não são pequenos de maneira alguma, e sim determinam toda a nossa vida. Às vezes é preciso deixar a amargura do fracasso ir fundo ao máximo e não tentar nos salvarmos dela. Ao mesmo tempo, penso que é muito importante compreender que essa é a nossa natureza, temos todos falhado neste caminho, e iremos falhar, sendo o que somos. É como se tivéssemos de engolir tudo isso, aceitar os outros por aquilo que são e a nós mesmos pelo que somos e irmos para um lugar novo além de ambos, onde possamos olhar para o mundo e para nós mesmos com uma espécie de tolerância objetiva e com carinho. Não é nesse nível, numa luta entre uma parte de nós mesmos e outra parte que a solução reside, mas em chegar além, num lugar calmo onde os dois lados pareçam igualmente pequenos e insignificantes.
Estivemos na Catedral em Florença. Você entra na porta principal e encontra todas as pessoas, os sacerdotes, os meninos do coro, turistas, agitando-se no nível do solo. Ali, cada um parece importante para si mesmo, e de fato é. Mas então, penosamente você sobe uma escada espiral escura em direção à cúpula e, finalmente, sai numa galeria que corre em volta do interior dela. De repente, toda a Igreja estende-se abaixo de você com todas aquelas pessoas pequeninas indistinguíveis umas das outras, e tanto você quanto elas estão igualmente perdidos no grande vazio que parece fazer todos os nossos pensamentos anteriores desaparecerem como inúteis. De alguma forma, essa galeria parecia significar o conhecimento de si mesmo como se é realmente, a plena consciência de si.
Mas quando tínhamos visto o máximo que podíamos suportar, emergimos numa escada oculta que subia para o topo da cúpula e finalmente saía para fora. Então, havia toda Florença, e as colinas, bosques, aldeias e paisagens distantes espalhavam-se abaixo de você debaixo do sol e do céu. Tudo o que tínhamos visto e sentido no interior da catedral, dentro de nós mesmos, mais uma vez desapareceu em relação ao grande universo. Pois essa era a realidade, e os outros apenas uma imagem dela em pedra. De modo que essa vista, bem ali debaixo da cruz, de repente parecia uma imagem da verdadeira consciência, a consciência objetiva do mundo como ele é, a liberdade.

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Quando novas tensões e forças começam a trabalhar em nós, elas causam uma revolução muito dolorosa nas profundezas de nosso ser. Para alguns, a maior dificuldade é suportar a si mesmo, e não ficar perdido em remorso. Mas aquele que aprendeu a não se levar tão a sério, não se deixa tornar fascinado por sua cólica espiritual.

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Parece uma das condições de passar para outro nível, que devêssemos sentir e reconhecer que tudo que temos feito neste nível é um fracasso total em comparação com o que deveria ter sido feito. Acho que Ouspensky realmente sentia isso e sei que ele realmente passou para um outro nível, onde tudo é possível novamente.

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Todos nós continuamente passamos da sinceridade para a pretensão, da pretensão para o remorso, do remorso para a sinceridade. Temos de observar o ciclo, mas não deixarmos nos abater por isso. É da natureza humana. Nós aceitamos, tentando olhar para isso de um ponto de vista superior, mais objetivo, mais impessoal. Culpar a nós mesmos em demasia é levar-se demasiadamente a sério. Ninguém fica desanimado por seus próprios fracassos, exceto aquele que foi vão o bastante para acreditar estar acima de toda falha.

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Remorso e amor são a mesma coisa. Remorso é amor real, ou melhor, o amor é o prazer, o remorso a dor. Se estamos realmente acordados sentimos remorso na proporção dos prejuízos que fizemos aos outros, é o pagamento.