segunda-feira, 31 de maio de 2010

G. I. Gurdjieff - O Arauto do Bem que Virá


O primeiro livro publicado por G. I. Gurdjieff, seu primogênito, como ele o chamou. Uma peça chave para adentrar na estrutura profunda de seus outros escritos.

quinta-feira, 27 de maio de 2010

Hafiz - Não viemos aprisionar / Eu chovo / Por que apenas pedir para o asno




Não viemos aqui para aprisionar,
Mas sim para nos entregarmos cada vez mais profundamente
À liberdade e alegria.

Não viemos a este mundo extraordinário
Para nos mantermos reféns apartados do amor.

Corra, meu querido,
De tudo que possa não fortalecer
As preciosas asas que estão brotando em você!

Corra como louco, meu querido,
De qualquer pessoa disposta
A colocar uma faca afiada
Na visão sagrada e terna
De seu lindo coração!

Temos a tarefa de nos amigarmos
Daqueles aspectos da obediência
Que ficam fora de nossa casa
E gritam à nossa razão:
“Oh, por favor,
Venha brincar aqui fora.”

Pois não viemos aqui para aprisionar
Ou confinar nossos espíritos maravilhosos,

E sim, para experimentarmos cada vez mais profundamente
Nossa coragem, liberdade e Luz divinas.


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Eu chovo
Pois seus prados chamam
Por Deus.
Eu teço luz nas palavras para que
Quando sua mente as capture

Seus olhos abandonem sua tristeza,
Ficando brilhantes, cada vez mais brilhantes, fazendo conosco
Como a vela faz com o escuro.

Eu embrulhei minha risada como um presente de aniversário
E deixei-a ao lado de sua cama.

Eu plantei a sabedoria no meu coração
Perto de todos os postes de sinalização no céu.

Um homem rico
Frequentemente se torna excêntrico.

Uma alma divinamente enlouquecida
Transforma-se numa generosidade infinita.

Amarrando sacos de ouro de gratidão
Aos pés balançantes de luas, planetas,
Dervixes extáticos que pairam no ar e pássaros cantantes.

Eu falo
Porque cada célula no seu corpo
Está tentando se comunicar com Deus.

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Por que apenas pedir para o asno em mim
Falar com o asno em você,

Quando tenho internamente tantos outros
Animais lindos e pássaros coloridos brilhantes
Que estão todos desejando dizer algo maravilhoso
E estimulante para seu coração?

Vamos abrir todas as portas fechadas sobre nossos olhos
Que nos impedem de conhecer a Inteligência
Que gera o amor
E de termos uma conversa mais vívida e satisfatória
Com o Amigo.

Vamos soltar nossos falcões dourados
Para que eles possam se encontrar nos céus
Onde nossos espíritos pertencem -
Brincando como duas crianças felizes.

Vamos dar as mãos e nos embriagarmos perto do sol
E cantar doces canções para Deus
Até que Ele se junte a nós com algumas notas
De Seu alaúde e tambor sublimes.

Se vocês tiverem alguma idéia melhor
De como passar uma noite solitária,
Então falem, amores, falem,
Pois Hafiz e todo o mundo escutarão.

Por que trazer apenas seu asno para mim
Pedindo por feno mofado
E uma conferência entediante com um idiota
No que diz respeito a esse assunto precioso -
Um assunto tão precioso como o amor,

Quando tenho tantos outros animais divinos
e pássaros coloridos brilhantes dentro de mim
que estão desejando saudar você docemente!

segunda-feira, 24 de maio de 2010

Siddharameshwar Maharaj - Você é "Aquilo"

Mumbai, 26 de outubro de 1935



Parabrahman não é perceptível aos sentidos, mas existe. “Aquilo” que não é perceptível é Parabrahman. “Aquilo” é Real, é o que existe, mas não é visível. Se alguém diz que “Aquilo” não existe, mesmo essa pessoa que diz isso é ela mesma Parabrahman. Se há uma forma, esse corpo, esse formato pode ser conhecido, pode ser percebido e compreendido. Entretanto, o formato ou a forma do Ser, o Qual não é de modo algum formato ou forma, não é perceptível. A pessoa termina a inquirição dizendo que “Aquilo” não é conhecível, mas é sempre Um com ela. A tragédia é que você não admite “Sua” existência e que “Aquilo” existe como seu Ser apenas. O entendimento que “eu sou o Entendimento, eu sou Shiva, eu sou Shiva” (Shivoham, Shivoham) é percebido pelo olho da “Visão-Interior do Entendimento”, que é Shiva.


Entendimento é percepção. A terra está dando suporte a todas a criaturas. Ela é chamada de solo ou Bhoomi. Assim como todas as coisas que aparecem aos nossos sentidos estão no solo, nesta terra, também, tudo o que é visível é percebido na existência invisível de Parabrahman. É por causa “Disso” que tudo começa e termina. Não podemos ir a lugar nenhum além “Disso”. Tudo termina, é destruído, mas “Aquilo” que não pode terminar, permanece, e o que permanece é “Aquilo”. “Aquilo” é o mesmo em todas as situações. “Aquilo” que é indescritível e inimaginável. O que não pode ser capturado pela lógica e por conjecturas - é “Aquilo”. “Isso” de fato existe. Se alguém tentar falar “Aquilo se parece com tal coisa” ou “com aquela coisa”, suas afirmações serão falsas. Não é possível falar sobre “Aquilo”. Deixe qualquer pessoa colocar uma proposição de qualquer tipo sobre “Aquilo” e ainda assim, “Aquilo” não é capturado por essa proposição. Portanto, não importa o quê a pessoa fale, mesmo se ela for muito sábia, “Aquilo” não pode ser descrito. Dessa forma, você deveria se aproximar desse assunto de maneira muito sutil e com determinação. Você tem de nulificar a crença na realidade da existência corpórea e da suposta realidade da existência do universo aparente. Apenas então você entenderá “Aquilo”.


É dito que Brahman é “Todo-Permeador”, mas quando o “todo” não é real, como pode Brahman estar permeando-o? O que vemos não é real, então como pode ser permeado por Brahman? No sono profundo não há “nada” que seja percebido ou permeado. Quando você está desperto e está presente, o que você vê é o “visto”, é a forma. A forma é o que é visto. Dizer que é visto significa dizer que é conhecido ou percebido. Apenas assim dizemos: “Eu vejo isso”. Entretanto, o que quer que seja visto é visto pelos órgãos dos sentidos e os órgãos dos sentidos são conhecidos pelo intelecto, bem como pelo Conhecimento. Agora, por favor, preste bastante atenção. Quem vê o Conhecimento? O estado de “conhecer”, o “Conhecimento”, é ele mesmo visto, mas Aquele “que o vê” não pode ser descrito. "Aquele que vê” não pode ser descrito, ainda assim, referência é feita a “Ele”. Portanto, “ver” significa “conhecer”, “perceber”, e aquilo que é percebido, é percebido por, ou permeado por, Brahman. Apenas aquilo que é assim permeado é conhecido ou percebido. Enquanto aquilo que for conhecido estiver no estado de ser visto (visível), ele é permeado. Entretanto, quando as coisas aparentes desaparecem, o que há para ser permeado? “Ser permeado” por Brahman é apenas ser visto ou conhecido. O “Conhecer” termina e então não resta nada para ser permeado.


O leite e o creme estão juntos no leite. Quando o creme é separado, ele perece separado aos nossos sentidos. Ele é o ingrediente importante do leite. Ele torna-se separado se o separarmos, de outro modo ele é um com o leite. A extensão vazia e a qualidade de permear são termos falsos. Aquele que permanece depois que a imaginação desaparece, é o Ser. Ele não estiver no reino da imaginação. Quando os conceitos, a imaginação, a capacidade de mover, o movimento, a compreensão, a consciência, etc., forem vistos, apenas então nos tornaremos cientes dos princípios masculino e feminino (Purusha e Prakruti). Inerente neles estão os três Gunas, os cinco elementos, os estados de consciência e as várias circunstâncias e numerosas propriedades da matéria. “Aquilo” que está ciente de tudo isso é chamado “A Natureza da Existência. O Objetivo Principal, O Poder Além, O Poder do Conhecer, O Lampejo da Totalidade ou do Ser Cósmico, O Lampejo da Imensidão de Brahman ou O Deus Primordial”, etc. Aquela compreensão que surge desse nome e forma é a experiência simples e mais natural de “Ser” que o Purushottama sente, ainda assim, é o tipo de percepção direta que a imaginação não pode compreender.


O esforço espiritual mais puro e simples é escutar (Shravana), e em seguida vem “pensar”, que é superior a ele. Quando não há “conhecedor” seja como um ser, ou como a qualidade de compreensão, a mente é imergida em seu estado mais elevado. Onde o estado de esforço ou Sadhana termina, há “Conhecimento Espiritual” ou Vidnyana. A vida da pessoa é realizada quando o esforço espiritual culmina na “Façanha Final”. Aquilo que está além das qualidades (Gunas) é permanente, não se move, não é perturbado por nada. Não pode ser destruído, é o sólido mais impenetrável, é sem fim e nunca desaparece. Você é “Aquilo”. Essa compreensão garante que “Aquilo” nunca termine. Então o problema da Ilusão é resolvido, é como se ela não fosse vista de modo algum. A ilusão se vai. Por exemplo, no sonho um homem vê que ele é casado e tem mulher e filhos, mas quando ele desperta, onde estão eles? Onde ele irá procurá-los? Onde eles irão encontrá-lo? Quando o homem desperta, o sonho prova-se falso. A percepção das outras coisas estava acontecendo devido à ignorância e essa ignorância era o sonho. O sonho era aquela ignorância e essa era a vida mundana. O vasto céu estava sendo visto, a vasta terra estava lá, muitos homens estavam vivendo na face daquela terra e eles pareciam estar felizes. Muitas famílias estavam vivendo felizmente e minha própria pequena família estava entre elas. Entretanto, aquela família, um pequeno ponto, não estava lá na perspectiva da Consciência Espiritual, ou Ciência (Awareness). Todo aquele cenário era mostrado pela ignorância. A família geralmente não é entendida em sua “Realidade” por pessoa alguma. Aquele que conhece a realidade é muito raro, uma vez que o “Conhecedor” é Paramatman. Ao “Conhecer” a Realidade, você desperta. O sonho termina. O que isso significa? O que é o despertar? Significa que agora há o “Conhecimento da Realidade”. O Despertar é Conhecimento e Conhecimento significa que você está desperto.


Experimentar a vida mundana é em si mesmo experimentar a Ignorância. O homem pode estar desfrutando uma vida luxuriosa muito feliz, mas ele está mergulhado na Ignorância. Ou, por outro lado pode estar levando uma vida cheia de problemas e trabalho duro, mas ainda o que ele aprecia é a Ignorância. A vida mundana, não importa de que nível seja - é apenas Ignorância o que a pessoa está apreciando. A Ignorância apareceu, o que é evidente é a Ignorância. Então, vem uma mudança: o Conhecimento aparece e com isso vem o despertar. O homem desperta e diz: “Oh, que vida mundana era essa, agora tudo aquilo provou ser falso.” Quando a pessoa desperta ela ainda vê, mas tudo é indescritível, impronunciável.


Isso é para ser sentido suave e sutilmente pela discriminação (Viveka). A experiência do despertar deve reconhecer seus próprios sinais, sua própria natureza. O livro “Dasbodh”* foi completado pela “palavra do Ser”. Aquele que medita em Paramatman, conhece esse “Livro da Vida”.




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“Quando o conhecimento objetivo (dos objetos) chega ao fim, o observador não sobrevive como aquele que vê. Nesse momento, o orgulho do “eu” (ego) é derretido". (Dasbodh, Capítulo 6, Verso 16)



Aquele que vê permanece somente enquanto os objetos são vistos como reais. O ego é conceitual e também é o observador. Se você chama esta cidade de 'Mumbai', então ela aparece como Mumbai; se você a chama de Terra, ela irá parecer como Terra. Tudo depende do conceito de quem está vendo. Se você chama uma coisa de 'uma cadeira', ela é percebida como uma cadeira; se você chamá-la de madeira, ela é percebida como madeira. Se você chamar tudo de Brahman, então tudo é percebido como Brahman. Se você chamar isso de mundo, será percebido como o mundo. A percepção dos objetos depende do conceito de quem está vendo. Mas Brahman está além do conceito. Não pode ser capturado por nenhum conceito.


Há uma mulher que um homem chama de “esposa”, o outro a chama de sua “irmã” e um terceiro chama de sua “filha”. Na verdade ela não é nada além de um pedaço de carne e ossos. O que quer que você diga, acontece. Tudo é conceitual e depende do conceito de quem vê (o vedor). O mundo e o ser são conceituais. O “vedor” que chama a manifestação (o mundo) de verdade, é o “ego”. Esse ego tem de ser erradicado. Se o “ego” se esvai, então apenas Brahman permanece.

O rei Dhrutarashtra do Mahabharata era cego. Ele deu nascimento a uma centena de Kauravas (descendentes) e se orgulhou deles. De fato, aquele que toma posse do corpo como sendo ele mesmo é o cego Dhrutarashtra. Ele também é aquele chamado de Ravana no Ramayana. Todos os objetos são demônios e porque você dá a eles esse status, você é rei deles, Ravana. Ravana não é o rei legítimo, ele não é o Senhor. Porque você considera os objetos serem verdadeiros, você se torna Ravana. Você tem de livrar-se desse Ravana. “Eu” não existe. Livrar-se do “eu” pode ser chamado de morte desejada. No Ramayana, é dito que Ravana era um grande devoto do senhor Shiva e a pedido de Ravana, Shiva deu a ele a dádiva da morte desejada. Esse Ravana governa as quatorze regências, isto é, os quatorze sentidos: cinco de conhecimento e cinco de ação, a mente, o intelecto, a consciência e o ego. Quando os Deuses começam a governar a Terra, os demônios vão para o mundo inferior e quando os demônios governam a Terra, os Deuses se retiram para realizar penitência. Se os objetos são tomados como verdadeiros, significa que os demônios estão governando e Deus está ausente. Não há traço Dele. Mas quando os Deuses tornam-se vitoriosos, ou seja, quando a convicção de que todos os objetos são falsos torna-se firme, então o demônio “eu” também desaparece. Quando o ego é destruído, então tudo é Brahman. A comida, o banco de madeira no qual ele senta para se alimentar, a esposa e a água são todos manifestações de Brahman. Todos são Brahman. Você deveria estudar e praticar isso. Então será o governo de Deus. Brahman é sem atributos: não é cor, não é música, não é amarelo ou preto, etc. O ghee que é líquido e o ghee sólido é o mesmo, assim como a água é o mesmo que o gelo. Quando uma semente encontra a terra, há uma eminência de consciência.


Tudo o que você vê ou percebe não é nada além da Realidade (Brahman). Há apenas consciência qualificada assim como braceletes e braçadeiras são ambos feitos de ouro.Você deveria parar de insistir em que apenas o bem deveria acontecer com este corpo. Você concebe que se tornou o corpo grosseiro porque apenas um corpo é objeto de seu conceito. Os servos e os atendentes deveriam ser considerados como sendo Deus. Não há nenhum outro Brahman. “Com ou sem atributos, tudo é Govinda (Deus).” É porque categorizamos os objetos que há Jiva (ego). Você percebe esposa, filha, cavalo ou cachorro como separados. Todos eles não são nada além de Krishna. Não precisamos mudar a forma dos objetos. Apenas a atitude daquele que vê, deve mudar. Brahman é o mesmo até quando está num estado com atributos. Você deveria ver Brahman em qualquer estado que Ele exista. Mesmo os átomos e as moléculas de uma cadeira são todos o Senhor Krishna. Uma vez que essa atitude é adotada pela pessoa, ela mesma torna-se Brahman. Mesmo que ela durma, acorde ou coma, ela nunca comeu uma refeição. Quando tudo é Brahman, quem está comendo e dormindo? Aquele que é sem qualidades e aquele que fala, ou seja, com qualidades - são ambos Deus. Esteja um rei sentado num trono ou numa caçada, ele é sempre rei. Aquele que é animado é o ídolo da consciência. A pessoa é uma devota quando ela dá nomes diferentes a diferentes objetos e a si mesma. A pessoa é um Sadhu (santo) ou Paramatman, quando olha para toda a criação como sendo Brahman. Esquecer Brahman e comer comida é apenas transformá-la em fezes. Os bichos da seda são melhores do que aqueles que esquecem Brahman, pois a seda de seus casulos é usada por sacerdotes enquanto eles adoram a Deus.


Aqueles que desejam o inferno podem digerir o inferno. Os Deuses e os demônios estão bem aqui. Juntos eles bateram o oceano do mundo e obtiveram néctar e vinho. O Senhor Vishnu deu néctar aos Deuses e vinho aos demônios. 'Vishnu fez isso' significa que a consciência interna do sentido fez isso. O néctar e o vinho estão bem aqui. Está em nossas próprias mãos beber o néctar e nos tornarmos imortais. Aquele que 'despertar' atingirá a Realidade. Tudo é Deus. Que todos sejam felizes. Se você praticar isso e levar isso ao coração, então tudo será Brahman. Temos que regar uma planta até que ela crie raiz, depois ela cresce por si mesma. Você deveria persistir na sua prática até que atinja Brahman.




*Livro do Mestre Perfeito - Shri Samartha Ramdas Maharaj (séc. XVII)

terça-feira, 18 de maio de 2010

Jalaluddin Rumi - O Ser jamais deveria ser esquecido





Há uma coisa neste mundo que nunca deveria ser esquecida. Se você se esquecesse de tudo o mais mas não se esquecesse disso, não teria nenhum motivo para se preocupar. Mas se você executou e lembrou de tudo mas se esqueceu dessa única coisa, é como se você não tivesse feito nada.
É como se um rei lhe mandasse para o país para realizar uma tarefa específica. Se você vai, realiza uma centena de outras tarefas mas não executa aquela tarefa particular, então é como se você não tivesse feito absolutamente nada. Dessa forma, todos vêm a este mundo para uma tarefa específica, e ela é o seu propósito. Se não realizarem essa tarefa, então eles não terão feito nada.
A todas as coisas uma tarefa é atribuída. Os céus enviam chuva e luz para as ervas do campo germinarem e brotarem para a vida. A Terra recebe as sementes e dá frutos, ela aceita e revela centenas de milhares de maravilhas, numerosas demais para que se possa falar a respeito. As montanhas provêm minas de ouro e prata. Todas essas coisas, os céus, a terra e as montanhas, fazem, mas eles não realizam aquela única coisa, aquela tarefa particular que é realizada por nós.



"Oferecemos a Confiança aos céus,
À terra e às montanhas,
Eles se recusaram a sustentá-la e ficaram com medo dela,
Mas os homens carregaram-na.
Certamente eles são tolos e pecadores."




Desse modo, as pessoas recebem uma tarefa e quando ela é realizada todos os seus pecados e suas idiotices são dissolvidos.
Você diz: "Olhe para todo o trabalho que eu realizei, mesmo não tendo executado aquela tarefa." Você não foi criado para essas outras tarefas! É como se lhe fosse dada uma espada de aço indiano de valor inestimável, tal como só se pode encontrar nos tesouros dos reis e você a tratasse como uma faca de açougueiro usada para cortar carne decomposta, dizendo: "Eu não estou deixando esta espada ficar ociosa, faço uso dela de muitas maneiras úteis." Ou seja, é como pegar uma taça de ouro maciço para cozinhar nabos, quando um único grão daquele ouro poderia comprar uma centena de panelas. Ou é como se você pegasse uma adaga feita em Damasco, da melhor qualidade, para pendurar uma cabaça quebrada, dizendo: "Eu estou fazendo um bom uso dela. Estou pendurando uma cabaça nela. Eu não estou deixando esta adaga ir para o lixo." Que tolo isso seria! A cabaça pode perfeitamente ser pendurada com um prego de madeira ou de ferro de valor insignificante; por que usar uma adaga que vale cem libras?
Um poeta disse uma vez:



Você é mais precioso do que o céu e a terra.
O que mais posso dizer?
Você não sabe seu próprio valor.



Deus diz: "Eu vou comprar você ... seus momentos, suas respirações, seus bens, suas vidas. Gastá-los Comigo. Vou transferí-los para Mim e seu preço é a liberdade divina, a graça e a sabedoria. Esse é o seu valor aos Meus olhos." Mas se mantivermos nossa vida para nós mesmos, perderemos os tesouros que foram concedidos. Como a pessoa que martelou a adaga de cem libras na parede para pendurar uma cabaça, a sua grande fortuna foi reduzida a um prego.
Ainda assim, você oferece uma outra desculpa dizendo: "Mas eu me aplico à tarefas nobres. Eu estudo as leis, filosofia, lógica, astronomia, medicina e tudo mais."
Bem, para quem, além de você mesmo, você estuda isso? Se são as leis, é para que ninguém possa roubar-lhe o pão, tirar-lhe as roupas ou matá-lo, em suma, é para sua própria segurança. Se for astronomia, as fases das esferas e sua influência sobre a Terra, sejam elas leves ou pesadas, trazendo tranquilidade ou situações de perigo, todas essas coisas dizem respeito à sua própria situação, servindo a seus fins. Se for medicina, é relacionado com a sua própria saúde e também serve a você. Quando considera bem este assunto, percebe que a raiz de todos os seus estudos é você mesmo. Todas essas tarefas elevadas são apenas ramos de você.
Se esses assuntos estão repletos de tantas maravilhas e mundos de conhecimento sem fim, considere por quais mundos você, que é a raiz, passa!
Se seus ramos têm suas leis, seus remédios, suas histórias, pense sobre o que transparece dentro de você que é a fonte, que leis espirituais e medicamentos afetam o seu futuro e destino interiores e que histórias retratam suas lutas do coração!
Para a Alma existe outro alimento além deste alimento do dormir e do comer, mas você se esqueceu desse outro alimento. Noite e dia você só nutre o seu corpo. Agora, este corpo é como um cavalo, e este mundo inferior é seu estábulo. O alimento que o cavalo come não é o alimento do cavaleiro. Você é o cavaleiro e tem seu próprio alimento e descanso, seu próprio prazer. Mas, uma vez que o animal tem o controle, você fica para trás, no estábulo do cavalo. Você não pode ser encontrado entre as classes de reis e príncipes do mundo eterno. Seu coração está lá, mas sendo seu corpo, o que tem o controle, você está sujeito à suas regras e permanece seu prisioneiro.
Quando Majnun, como conta a história, seguia para a casa de sua amada Laila, enquanto ele estava plenamente consciente, dirigia seu camelo naquela direção desejada. Porém, quando por um momento ele ficou absorvido em pensamentos sobre Laila e esqueceu de seu camelo, o camelo virou-se na direção do vilarejo onde sua cria estava. Quando voltou a si, Majnun descobriu que tinha voltado para trás uma distância de dois dias de viagem. Durante três meses ele continuou dessa forma, sem chegar perto de seu objetivo. Finalmente, ele saltou do camelo dizendo: "Este camelo é minha ruína!" E continuou a pé, cantando:



O desejo de meu camelo ficou para trás agora,
Meu próprio desejo está a frente.
Nossos propósitos se cruzaram,
Não podemos mais concordar.



Certa vez, Burhan al-Din foi saudado por alguém, que disse: "Eu tenho ouvido elogios de você proferidos por amigos." Burhan al-Din respondeu: "Espere até que eu encontre seus amigos para ver se eles me conhecem bem o suficiente para me elogiar. Se eles me conhecem só através do boca a boca, então não me conhecem verdadeiramente. Pois as palavras não duram. As sílabas e os sons não resistem. Este corpo, estes lábios e esta boca não vão resistir. Todas essas coisas são meros acidentes do momento. Mas se eles me conhecem pelas minhas obras e conhecem o meu Ser essencial, então eu sei que eles serão capazes de me elogiar e esse elogio irá para onde ele pertence."
Essa é como a história que se conta de um rei. Esse rei confiou seu filho a uma equipe de sábios acadêmicos. No devido tempo, eles lhe ensinaram as ciências da astrologia, geomancia e da interpretação de sinais, até que ele se tornou um mestre completo, apesar de sua absoluta estupidez e falta de sagacidade.
Um dia o rei segurou um anel em sua mão e fez um teste com seu filho: "Vamos, diga-me o que eu estou segurando em minha mão." "O que você está segurando é redondo, amarelo, tem algo inscrito e é oco", respondeu o príncipe. "Você deu todos os sinais corretamente", disse o rei. "Agora diga o que é." "Deve ser uma peneira." Respondeu o príncipe. "O quê?", clamou o rei. "Você sabe todos os detalhes minuciosos, que confundiriam a cabeça de qualquer um. Como é que com toda sua aprendizagem e conhecimentos poderosos, foi escapar de você o simples fato de que uma peneira não caberia em um punho?"

Dessa mesma forma, os grandes estudiosos das eras procuraram detalhes minuciosos e insignificantes sobre todas as questões. Eles conhecem perfeita e completamente aquelas ciências que não dizem respeito à Alma. Mas quanto ao que é verdadeiramente importante e nos diz respeito mais intimamente do que qualquer outra coisa, ou seja, nosso próprio Ser, isso seus grandes estudiosos não conhecem. Eles fazem declarações sobre tudo dizendo: "Isto é verdadeiro e aquilo não é falso. Isso está certo e aquilo está errado." No entanto, eles não conhecem o seu próprio Ser; se é verdadeiro ou falso, se é puro ou impuro. Ora, sendo oco e amarelo, inscrito e circular, esses traços são acidentais; jogue o anel no fogo e nenhum deles permanecerá. Ele se torna o seu Ser essencial, purificado de todas as aparências. Assim é com o conhecimento dos acadêmicos, o que eles sabem não tem nenhuma conexão com a realidade essencial que só existe quando todos esses “sinais” se vão. Eles falam com sabedoria, fazem longas exposições e, finalmente, anunciam que o que o rei tem na mão é uma peneira. Eles não têm conhecimento sobre a raiz da questão: o objetivo da vida.

Eu sou um pássaro. Sou um rouxinol. Se eles me dizem: "Faça algum outro tipo de som," Eu não posso. Minha língua é o que é. Eu não posso falar de outro modo. No entanto, aqueles que aprendem o canto dos pássaros não são os próprios pássaros, pelo contrário, eles são os inimigos dos pássaros e quem os captura. Eles cantam e assobiam para que os outros os considerem como sendo aves. Peça-lhes para produzir um som diferente e eles podem fazê-lo, porque o som é apenas assumido por eles. Não é próprio deles verdadeiramente. Como os estudiosos, eles são capazes de cantar outras canções, porque aprenderam a roubar essas canções e mostrar uma música diferente roubada de cada peito.

quarta-feira, 12 de maio de 2010

P. D. Ouspensky - As primeiras tentativas de lembrança de Si e a divisão da atenção



Tudo que Gurdjieff disse, tudo o que eu mesmo pensei e, especialmente, tudo o que minhas tentativas de lembrança de si tinham me mostrado, muito em breve me convenceram que eu estava diante de um problema inteiramente novo com o qual a ciência e a filosofia não tinham se deparado até agora. Mas antes de fazer deduções, vou tentar descrever as minhas tentativas de lembrar de mim. A primeira impressão foi que as tentativas de me lembrar ou de ter consciência de mim mesmo, de dizer para mim mesmo: 'eu estou andando', 'eu estou fazendo' e continuamente sentir esse eu - paravam os pensamentos. Quando eu estava sentindo a mim mesmo, eu não podia pensar nem falar, mesmo as sensações se ofuscavam. Além disso, só era possível lembrar de si dessa forma por um tempo muito curto. Eu já tinha feito anteriormente algumas experiências em parar os pensamentos, que são mencionadas nos livros sobre práticas de Yoga. Por exemplo, há uma descrição desse tipo no livro de Edward Carpenter, 'Do pico de Adão à Elefanta', embora seja de uma forma muito geral. E minhas primeiras tentativas de lembrar de mim mesmo me recordaram exatamente aquelas minhas primeiras experiências. Na verdade, foi quase a mesma coisa, com a diferença que ao parar os pensamentos, a atenção é inteiramente direcionada para o esforço de não admitir pensamentos, enquanto que na lembrança de si a atenção se divide, uma parte é direcionada para o mesmo esforço e a outra parte para o sentimento de si (do Self). Essa última realização permitiu-me chegar a uma certa definição, possivelmente muito incompleta, da "lembrança de si", que, no entanto, provou ser muito útil na prática. Estou falando da divisão da atenção, que é o traço característico da lembrança de si. Eu representava isso para mim da seguinte forma: Quando eu observo algo, a minha atenção é dirigida para o que eu observo, uma linha com uma seta:

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Eu ----------------> o fenômeno observado.


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Quando ao mesmo tempo, eu tento lembrar de mim mesmo, a minha atenção é direcionada tanto para o objeto observado quanto para mim mesmo. Uma segunda seta aparece na linha: .

Eu <---------------> o fenômeno observado.


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Tendo definido isso, eu vi que o problema consistia em direcionar a atenção sobre si mesmo sem comprometer ou obliterar a atenção direcionada para outra coisa. Além disso, essa "outra coisa" poderia tanto estar dentro de mim como fora de mim. As primeiras tentativas de uma tal divisão de atenção me mostraram a sua possibilidade. Ao mesmo tempo, vi duas coisas claramente: Em primeiro lugar vi que a lembrança de si resultante desse método não tinha nada em comum com o "sentir-se", ou com "auto-análise." Era um estado novo e muito interessante, com um gosto estranhamente familiar. E em segundo lugar, percebi que os momentos de lembrança de si, ainda que raramente, podem ocorrer na vida. Apenas a produção intencional desses momentos criava a sensação de novidade. Na verdade eles tinham sido familiares a mim desde a infância. Eles vinham em ambientes novos e inesperados, em um lugar novo, entre pessoas novas durante uma viagem, quando, por exemplo, olhamos de repente ao nosso redor e dizemos: 'Que estranho! Eu e neste lugar', ou em momentos de grande emoção, em momentos de perigo, nos momentos em que é necessário se controlar para não perder a cabeça, quando ouvimos a nossa própria voz e nos vemos e nos observamos de fora. Eu vi muito claramente que minhas primeiras recordações da vida, que no meu caso eram bem prematuras, foram momentos de lembrança de si. Essa última realização revelou muito mais para mim. Ou seja, eu vi que eu só me lembrava realmente desses momentos do passado quando havia lembrado de mim mesmo. Dos outros eu só sabia que haviam ocorrido. Eu não sou capaz de revivê-los inteiramente, de experimentá-los novamente. Mas os momentos em que eu tinha lembrado de mim mesmo estavam vivos e não eram de maneira alguma diferentes do presente. Eu ainda estava receoso de chegar a conclusões. Mas já via que eu estava diante de uma descoberta muito grande. Sempre fiquei espantado com a fraqueza e a insuficiência de nossa memória. Tantas coisas desaparecem. Por algum motivo ou outro o principal absurdo da vida para mim consistia nisso. Por que experimentar tanta coisa para esquecê-las depois? Além disso, havia algo de degradante nisso. Um homem sente algo que lhe parece muito grande, muito importante, ele acha que nunca vai esquecê-lo; um ou dois anos passam e não resta mais nada daquilo. Agora ficava claro para mim porque isso era assim e porque não poderia ser diferente. Se nossa memória realmente mantém vivos apenas os momentos de lembrança de si, fica claro porque ela é tão pobre. Todas essas foram as percepções dos primeiros dias. Mais tarde, quando comecei a aprender a dividir a atenção, vi que a lembrança de si dava sensações maravilhosas que, de uma forma natural, isto é, por si só, vêm a nós só muito raramente e em condições excepcionais. Desse modo, por exemplo, naquele tempo eu costumava gostar muito de passear por São Petersburgo durante a noite e "sentir" as casas e as ruas. São Petersburgo está repleta dessas sensações estranhas. As casas, especialmente as antigas, eram muito vivas, eu não cessava de falar com elas. Não havia nenhuma "imaginação" nisso. Eu não pensava em nada, eu simplesmente caminhava enquanto tentava lembrar de mim e olhava à minha volta, as sensações vinham por si mesmas. Mais tarde vim a descobrir muitas coisas inesperadas da mesma maneira. Mas vou falar sobre isso mais adiante. Às vezes a lembrança de si não era bem sucedida, em outros momentos era acompanhada por observações curiosas.

Certa vez eu estava andando na rua Liteiny na direção da Nevsky, e apesar de todos os meus esforços eu não conseguia manter minha atenção na lembrança de si. O barulho, o movimento, tudo me distraía. A cada minuto eu perdia o fio da atenção, encontrava-o novamente e depois perdia novamente. Finalmente senti uma espécie de irritação ridícula comigo mesmo e virei para a rua à esquerda tendo firmemente decidido manter minha atenção sobre o fato de que eu me lembraria de mim mesmo pelo menos por algum tempo, pelo menos até que eu chegasse à rua seguinte. Cheguei à Nadejdinskaya sem perder o fio da atenção, exceto talvez por breves momentos. Então, eu novamente voltei para a Nevsky percebendo que, em ruas tranquilas, era mais fácil para mim não perder a linha de pensamento, e desejando, desse modo, testar-me nas ruas mais ruidosas. Cheguei à Nevsky ainda me lembrando de mim mesmo, e já estava começando a experimentar o estranho estado emocional de paz interior e confiança que vem depois de grandes esforços desse tipo. Ao virar a esquina na Nevsky havia uma tabacaria onde faziam meus cigarros. Ainda lembrando de mim mesmo pensei em tocar lá e encomendar alguns. Duas horas depois eu acordei na Tavricheskaya, ou seja, muito longe. Eu estava indo de trenó para a gráfica. A sensação de despertar foi extraordinariamente vívida. Posso quase dizer que tinha voltado a mim. Lembrei-me de tudo de imediato. Como eu vinha andando na Nadejdinskaya, como eu tinha lembrado de mim mesmo, como eu havia pensado sobre os cigarros e como durante esse pensamento pareceu-me de repente cair e desaparecer num sono profundo. Ao mesmo tempo, enquanto imerso nesse sono, eu tinha continuado a realizar ações coerentes e convenientes. Saí da tabacaria, telefonei para meu apartamento na Liteiny e depois para a gráfica. Escrevi duas cartas. Então outra vez saí de casa. Andei no lado esquerdo da Nevsky até o Dvor Gostinoy com a intenção de ir para a Offitzerskaya. Então mudei de idéia, pois estava ficando tarde. Eu tinha tomado um trenó e estava seguindo para Kavalergardskaya até a gráfica. E no caminho enquanto seguia pela Tavricheskaya eu comecei a sentir um desconforto estranho, como se eu tivesse esquecido de algo. E de repente, eu lembrei que tinha esquecido de lembrar de mim mesmo.

Falei de minhas observações e deduções para as pessoas no nosso grupo, bem como para vários de meus amigos do círculo literário e outros. Eu lhes disse que este era o centro de gravidade de todo o sistema e de todo o trabalho sobre si mesmo, que agora o trabalho sobre si mesmo não era apenas palavras vazias, mas um fato real cheio de significado, graças ao qual a psicologia se tornara uma ciência exata e ao mesmo tempo prática. Eu disse que a psicologia européia e ocidental, em geral, havia ignorado um fato de enorme importância, ou seja, que não nos lembramos de nós mesmos, que vivemos, agimos e raciocinamos num profundo sono, não metaforicamente, mas na realidade absoluta. E também que, ao mesmo tempo, podemos nos lembrar de nós se fizermos esforços suficientes, que podemos despertar. Fiquei impressionado com a diferença entre a compreensão das pessoas que pertenciam ao nosso grupo e das pessoas fora dele. As pessoas que pertenciam ao nosso grupo entendiam, embora não todos de uma vez, que havíamos entrado em contato com um "milagre", e que era algo "novo", algo que nunca existiu em nenhum lugar antes. As outras pessoas não entendiam isso, elas consideravam tudo de maneira muito leve e, às vezes até começavam a me provar que essas teorias tinham existido antes. A. L. Volinsky, que eu encontrava muitas vezes, com quem eu tinha falado muito desde 1909 e cujas opiniões eu valorizava muito, não achou na idéia da "lembrança de si" nada que não tivesse conhecido antes. "Isso é uma apercepção". Ele me disse: "Você já leu a Lógica de Wundt? Você vai encontrar lá sua mais recente definição de apercepção. É exatamente a mesma coisa que você fala. 'Simples observação', é percepção. Observação com a 'lembrança de si ', como você chama, é apercepção. Claro que Wundt sabia disso." Eu não queria discutir com Volinsky. Eu tinha lido Wundt. E é claro que o que Wundt havia escrito não era nada daquilo que eu tinha dito para Volinsky. Wundt havia chegado perto dessa idéia, mas outros tinham chegado igualmente perto e depois tinham ido em uma direção diferente. Ele não tinha visto a magnitude da idéia que estava escondida por trás de seus pensamentos sobre as diferentes formas de percepção. E não tendo visto a magnitude da idéia ele naturalmente não podia ver a posição central que a idéia da ausência de consciência e a idéia da possibilidade da criação voluntária dessa consciência deveria ocupar em nosso pensamento. Apenas pareceu-me estranho que Volinsky não pôde ver isso mesmo quando apontei para ele. Depois, eu me convenci de que essa idéia estava escondida por um véu impenetrável para muitas pessoas de outra maneira muito inteligentes, e ainda mais tarde, vi porque isso era assim.

segunda-feira, 10 de maio de 2010

Meher Baba - Meditação



Vou descrever e discutir os diversos métodos de diferentes Yogas e outras práticas que levam à Auto-realização. Mas antes de fazer isso, devo lhes dar informações sobre meditação, uma vez que isso está invariavelmente mais ou menos e de uma forma ou outra conectado com quase todas as práticas de Yoga e com os esforços práticos para a realização da Verdade. O que é meditação? Geralmente o termo é usado para expressar esforços mentais particulares e exercícios em conexão com idéias religiosas e espirituais, mas muitas pessoas na vida cotidiana mundana usam-na como recurso. Antes de fazer qualquer coisa, é preciso pensar a respeito, em outras palavras, é preciso meditar sobre a ação pretendida. O pensamento ou a meditação pode, na vida mundana, durar várias horas, ou apenas uma fração de um minuto, mas tem de ser efetuado, consciente ou inconscientemente, intencionalmente ou não, antes de qualquer coisa poder ser feita ou realizada. Agora, considere apenas que, se pensamento ou meditação são necessários para a obtenção de resultados grosseiros, o quanto eles devem ser necessários para alcançar as sutilezas espirituais que levam à Auto-Realização. Mas para esse último propósito o pensamento deve ser organizado com bases no princípio da Verdade, que é o da unidade, em contraste com o universo que é aparentemente baseado na multiplicidade. O pensamento é suposto ser, pelas pessoas do mundo, o processo que leva apenas à manifestação de força externa que é exibida numa ação grosseira. Mas esse não é o caso. Assim como até mesmo um pensamento aleatório pode manifestar força sob a forma de uma ação corporal, a meditação ou o pensamento profundo e apropriadamente organizado produz uma força própria que é muito útil e cooperante para um aspirante espiritual. A manifestação de tal força produzida através de profunda reflexão metódica pode não tornar-se evidente de imediato ou num curto período de tempo em todos os casos, mas a meditação está fadada a dar frutos a longo prazo. Existem vários métodos de meditação espiritual. Os seis seguintes são os mais importantes: 1) Para aqueles que estão inclinados a pensar no aspecto impessoal do Todo-Poderoso, ou seja, o Deus Impessoal, é aconselhável retirar-se em solidão e, achando um assento confortável, começar a refletir sobre Ele assim: "Deus é um. Deus é infinito. Deus está em toda parte. Deus está além de todas as coisas." Em seguida, deve-se trazer o espaço imensurável, comumente conhecido como o céu, ao olho de sua mente e começar a concentrar-se na idéia do Deus impessoal através deste pano de fundo imaginário do céu vazio e ilimitado por tanto tempo quanto possível. 2) Deve-se sentar para a meditação da mesma maneira mostrada no primeiro exemplo, mas a linha de pensamento neste método deve ser a seguinte: "Deus é verdade. Tudo o mais é falso. O mundo e tudo o que é visto e percebido é um sonho, uma miragem, um fenômeno irreal. Deus está vivo dentro de meu próprio Ser, como a Alma de minha alma." Depois de contemplar esses pensamentos por algum tempo, a pessoa deve voltar sua atenção para o coração - imaginar uma chama na forma do próprio Atman-Alma estando ali - e concentrar-se tanto tempo quanto possível sobre este lugar imaginário em chamas no coração. 3) A linha de pensamento a ser seguida neste tipo de meditação (as outras condições preliminares sendo as mesmas que a dos dois primeiros métodos) é a seguinte: "Eu não sou este corpo. Eu não sou finito. Eu sou o Ser. Eu sou eterno." Depois de um pouco de contemplação dessa forma, deve-se fechar subitamente os dois olhos externos, o mais cerrados possível mas de modo que não seja desconfortável, e depois mentalmente olhar atentamente para o centro da testa a partir do interior tanto quanto possível e pelo tempo que for possível, evitando todos os outros pensamentos, sejam eles elevados ou inferiores, durante esta concentração. 4) Este é um tipo de meditação ao mesmo tempo muito simples e muito difícil. Tudo o que a pessoa tem de fazer é retirar-se em solidão e se sentar numa posição confortável, com ambos os olhos externos fechados e tentar manter a mente vazia. Não se deve nem pensar sobre Deus nem sobre o diabo, nem sobre a imortalidade, nem sobre a eternidade, nem sobre a existência do mundo, nem sobre a sua não-existência. Em suma, nesta meditação é preciso tentar manter-se mentalmente vazio ao longo da sessão, por um período tão longo quanto possível. 5) A pessoa deve sentar-se sozinha, fechar os olhos, contemplar e mentalmente dizer e repetir o seguinte: "Deus é meu Amado. Eu sou Seu amante. Eu quero a união com o meu Amado, o Senhor, o grande Deus." Na sequência deste processo, por um tempo, deve-se começar a repetir mentalmente qualquer um dos nomes do Todo-Poderoso em qualquer idioma, mas de tal modo que metade do nome seja pronunciado (mentalmente, é claro) durante a inalação, e metade dele pronunciado durante a exalação. Durante a execução desta repetição rítmica, deve-se tentar concentrar toda a atenção sobre a repetição do nome apenas.



6) Aquele que está inclinado a pensar no aspecto pessoal do Senhor, isto é, o Deus pessoal, deve sentar-se com sua alma como companheira em um local tranquilo, fechar os olhos, em seguida, tentar trazer diante dos olhos da mente a totalidade da face de algum Profeta, alguma Encarnação de Deus, ou Sadguru, de épocas passadas ou do presente, e concentrar-se nele o maior tempo possível. A fim de facilitar a entrada dos traços de algum Mestre Perfeito nos olhos da mente, o seu retrato deve ser olhado profundamente, antes de fechar os olhos em meditação.


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a) Quando e onde for possível, deve-se selecionar um local calmo e solitário ou em torno de uma colina ou montanha, ou à beira de um rio para se sentar em meditação. Caso contrário, a pessoa deve retirar-se para um quarto sozinha e manter a porta fechada durante a meditação. b) Não é necessário estabelecer regras rígidas quanto à postura. Qualquer postura sentada, que a pessoa ache mais conveniente pode ser adotada. Mas uma vez que seja adotada, deve ater-se a ela e sentar-se da mesma forma diariamente. Sempre que houver uma necessidade de reiteração mental do nome de Deus, deve-se selecionar qualquer nome e aderir a ele diariamente. Portanto, a posição mais confortável sentada (não deitada) e o nome mais atraente devem ser cuidadosamente selecionados definitivamente. c) Não há período de tempo que possa ser chamado de muito longo para qualquer uma das meditações, e cada hora do dia e da noite é adequada para qualquer meditação, mas o melhor período para a meditação são as primeiras horas da manhã, das 4:00 às 07:00. d) É preferível, embora não seja absolutamente necessário, tomar um banho antes de sentar-se em meditação.


Agora, qual dos métodos é o melhor? Não o método, mas a força que se usa por trás de um método é que conta. O provérbio: "a comida de um homem é o veneno de outro homem", se aplica igualmente para meditação como para a gastronomia. Seria temerário dizer que este ou aquele determinado tipo de meditação é o melhor. Aquele que atende às próprias inclinações da pessoa ou que mais a atrai é o melhor tipo de meditação para aquela pessoa. A questão do sucesso depende do próprio ser da pessoa. A pureza conta tanto quanto a perseverança e a devoção tanto quanto a determinação. Não há dúvidas sobre os benefícios da meditação. O principais deles são os seguintes: 1. Quem medita com sinceridade pode, mais cedo ou mais tarde, tornar-se livre das garras de maya e ser atraído para a Verdade ou Deus. 2. Se, juntamente com a sinceridade, a meditação for praticada com regularidade e por um tempo suficientemente longo, ela é capaz de tornar a mente da pessoa pura e permanentemente inclinada ao caminho divino. 3. A terceira vantagem da meditação reside no fato de que, se a meditação for muito profunda e intensa, ela está suscetível a produzir o estado de Yoga Samadhi. Embora o Yoga Samadhi não tenha nada a ver com o Nirvikalpa Samadhi, e não deve ser confundido com a Perfeição espiritual, o aspirante deverá tirar benefícios dele. 4. Mas a maior vantagem da meditação é a que consiste numa oportunidade para Realização de Deus direta! Sim, não é impossível conseguir o Nirvikalpa Samadhi, o Haqikat, a realização completa do estado - "Eu sou Deus" - através da meditação. Mas é possível, desde que o praticante tenha se colocado sob a influência de um Mestre Perfeito vivo, que tenha um caráter puro e imaculado e seja possuidor de uma determinação obstinada que não conhece derrota. Mesmo que se trate da questão de abandonar sua própria vida pela causa. Com essas qualidades, é preciso meditar, sem qualquer outro objetivo em vista salvo o de tornar-se um com o Todo-Poderoso.

Tenha em mente que não deve haver limite ou um período fixo determinado apenas para a meditação. Se a meditação não pode ser mantida durante todo o estado de vigília, sem pausa, deve ser tão longa quanto possível. A intensidade da meditação é proporcional ao desejo pelo Objetivo. A cada hora, a cada minuto, é preciso ansiar por Deus, como um homem se afogando anseia pela vida. O anseio por Deus traz uma inquietação extrema, uma espécie de intensa tortura mental e essa tortura deve ser tão forte que nenhum pensamento exceto aqueles de Deus penetrem na mente do devoto. Esse desejo intenso é muito raro nesta era materialista. Para gerar esse anseio, a ajuda de um Mestre Perfeito é requerida na maioria dos casos. A graça de um Mestre que realizou Deus faz maravilhas, mas deve-se, por assim dizer, exortar essa graça Dele. Deve-se notar que a meditação, ou qualquer coisa feita em prol da Verdade, nunca passa em vão. Está, como já foi dito, fadada a dar frutos mais cedo ou mais tarde.

domingo, 9 de maio de 2010

Hazrat Inayat Khan - A vida do pensamento



Deus é onisciente, onipotente, todo-penetrante e o Único Ser. Isso sugere-nos que o Absoluto é um Ser vivo – o único Ser – que não existe tal coisa como a morte, que não existe tal coisa como o fim, que tudo, todos os seres, toda partícula tem uma continuidade, pois a vida é contínua.


O fim ou a morte é apenas uma mudança. Portanto, todo pensamento que uma vez passou por nossa mente, todo sentimento que já passou por nosso coração, toda palavra que foi uma vez dita e talvez nunca mais tenhamos pensado a respeito, cada ação feita e esquecida, recebe uma vida e continua a viver. É exatamente como um viajante que está viajando e que no seu percurso tem algumas sementes em suas mãos e que ele joga ao chão. Quando as plantas crescem naquele lugar, ele nunca as vê. Ele apenas joga as sementes e elas ficam ali. A terra as tomou, a água as criou, o sol e o ar ajudaram-nas a crescer.


A vida é uma acomodação e nela tudo – pensamento, palavra, ação ou sentimento – uma vez nascido, é cuidado, é criado e é tornado frutífero. Dificilmente pensaríamos que é possível que seja assim. Pensamos: foi falado e se foi – mas ainda está ali. Permanece e toma seu curso, pois está vivo. Como tudo é vida, não há morte.


Sem dúvida o nascimento e a morte, o começo e o fim são nomes dos diferentes aspectos deste trabalho mecânico de todo o universo. É um tipo de trabalho automático que nos dá a idéia de algo começando e algo terminando. Quando tocamos um sino a ação toma apenas um momento, mas a ressonância perdura. De acordo com nosso conhecimento ela dura tanto quanto é audível; então ela segue adiante e não é mais audível para nós – mas ela existe. Ela existe em alguma parte, ela prossegue.


Se uma pedrinha atirada no mar coloca a água em ação, dificilmente paramos para pensar até onde essa vibração age no mar. O que podemos ver são as pequenas ondas e círculos que a pedrinha produz diante de nós. Vemos isso, mas as vibrações que foram produzidas no mar chegam muito mais longe do que jamais poderíamos imaginar.


O que chamamos de espaço é um mundo muito mais fino. Se o chamarmos de mar, é o mar com o fluído mais sutil. Se o chamarmos de terra, é uma terra que é incomparavelmente mais fértil do que a terra que conhecemos. Essa terra toma todas as coisas para dentro de si e as cria, nutre, permite que elas cresçam – nossos olhos não vêem isso, nossos ouvidos não escutam.


Essa idéia não nos torna responsáveis por cada movimento que fazemos, por cada pensamento que pensamos, por cada sentimento que passa por nossa mente e coração? Não há um único momento de nossa vida que seja desperdiçado, se apenas soubermos como utilizar nossa atividade aqui, como direcionar nosso pensamento, como expressá-lo em palavras, como promovê-lo com nossos movimentos, como senti-lo de modo que ele crie sua própria atmosfera. Que responsabilidade! A responsabilidade que cada homem tem é maior que a responsabilidade de um rei. É como se cada homem tivesse um reino que fosse seu e pelo qual fosse responsável – um reino que de maneira alguma é menor que qualquer reino conhecido por nós e sim, incomparavelmente maior que os reinos da terra. Isso nos ensina a sermos cuidadosos, conscienciosos e a sentirmos nossa responsabilidade a cada movimento que fizermos. Quando um homem não sente isso, ele não está ciente de si mesmo, ele está inconsciente do segredo da vida. Ele segue como um bêbado andando pela cidade. Ele não sabe o que está fazendo, tanto para si mesmo quanto contra si mesmo.


Agora você pode perguntar: 'Como um pensamento pode viver?' De que maneira ele vive? Ele tem um corpo no qual viver, tem uma mente, tem uma respiração?' Sim. A primeira coisa que deveríamos saber é que um sopro que vem direto da fonte busca um corpo, uma acomodação onde possa funcionar. Um pensamento é um corpo. O sopro que vem da fonte – um raio do Espírito que pode ser comparado ao sol – faz do pensamento uma entidade e ele vive como uma entidade.


São essas entidades que são chamadas na terminologia Sufi de muwakkals, que significa elementais. Eles vivem, eles têm um certo propósito a cumprir. São produzidos pelo homem e por trás deles há um propósito dirigindo suas vidas. Imagine que terrível se num momento de absorção uma pessoa expressasse sua ira, sua cólera, seu ódio! Uma palavra expressada em tal momento deve viver e levar a cabo seu propósito. É como criar um exército de inimigos em torno de si mesmo. Talvez um pensamento tenha uma vida mais curta que outro, depende de que corpo lhe foi dado. Se o corpo é mais forte, então ele vive mais. A força do corpo daquele pensamento depende da energia da mente.


Elementais são criados pelo homem. Quando os ventos sopram e as tempestades se enfurecem, criando toda destruição, olhamos para isso como uma ação mecânica da natureza. Mas não é apenas ação mecânica, é dirigida por sentimentos humanos, pelos sentimentos intensos dos seres humanos. Esses sentimentos transformam-se em vidas imensas. Eles impulsionam como uma bateria por trás dos ventos e tempestades, das inundações e vulcões.


E também outros pensamentos que clamam por bênçãos, como a chuva, por exemplo, devem trazer a piedade de Deus sobre a terra. No oriente eles chamam a chuva de piedade divina. O brilho do sol, quando o céu está limpo, as as outras bênçãos da natureza – o ar puro que está animando, a primavera, as boas colheitas, as frutas, as flores e os vegetais, todas as diferentes bênçãos da terra ou do céu que nos são dadas – também são dirigidas pelas forças por trás deles.


Assim como o trabalho mecânico da natureza eleva para o céu os vapores que juntos tornam-se nuvens e causam a chuva, também os pensamentos e os sentimentos, as palavras e as ações têm seu trabalho mecânico a fazer. Esse trabalho dirige a ação do universo. Isso nos mostra que não é apenas um trabalho mecânico da natureza, mas inteligência humana, trabalhando mecanicamente, que dirige todo o trabalho da natureza.


Isso nos dá a idéia de que a responsabilidade do homem é maior do que a de qualquer outro ser no mundo. É dito no Alcorão que Deus disse: “Depositamos nossa confiança nas montanhas e elas não puderam suportar o fardo, depositamos nossa confiança nas árvores e elas não puderam sustentá-la; então, depositamos nossa confiança no homem e foi o homem que conseguiu suportá-la”. Essa confiança é a nossa responsabilidade, não apenas nossa responsabilidade por aqueles a nossa volta, que encontramos em nosso dia a dia, ou pelo trabalho com que estamos comprometidos, ou pelos interesses que temos na vida – mas nossa responsabilidade perante toda esta criação: o que contribuímos para esta criação, seja isso algo que traga condições melhores e mais harmoniosas na esfera, no mundo, na terra! Se fizermos assim então saberemos de nossa responsabilidade. Se não estivermos cientes disso, ainda não descobrimos o propósito de estarmos aqui.


Há a infância, onde a criança não sabe nada. Ela destrói coisas de valor e de beleza devido à sua curiosidade, seu desejo. Mas quando cresce, a criança começa a sentir sua responsabilidade. O sinal da maturidade é o sentimento de responsabilidade, então, quando a alma amadurece ela começa a sentir sua responsabilidade, e é a partir desse momento que a pessoa começa sua vida. É a partir desse momento que a alma é nascida de novo, e enquanto a alma não nascer de novo ela não entrará no reino de Deus. O reio de Deus está aqui. Enquanto o homem não está consciente de sua responsabilidade ele não conhece o reino de Deus. É o tornar-se consciente de sua responsabilidade que o desperta para o reino de Deus, no qual está o nascimento da alma.


Além do mais, apoiando essa idéia, há uma palavra que em Sanskrito é usada para as pessoas conscientes de Deus. Essa palavra é Brahman, que significa criador. Assim que uma alma realiza essa idéia ela começa a saber que cada momento de sua vida é criativo, seja automaticamente ou intencionalmente. E se ela for responsável por sua criação, ela é responsável por cada momento de sua vida. Desse modo não há nada na vida que é desperdiçado. Qualquer que seja a condição do homem, não importa o quanto miserável e desamparada seja, ainda assim sua vida não é desperdiçada, pois há o poder criativo operando através de cada movimento que ele faz, todo pensamento que ele pensa, todo sentimento que ele tem. Ele sempre está fazendo algo.


Há uma outra palavra em Sanskrito para Bramhan que é Duija, que significa a alma que nasce de novo. Pois no momento em que a pessoa percebe tudo isso, a alma nasce de novo: sua percepção da vida fica diferente, desse modo, seus planos de vida tonam-se diferentes, suas ações tornam-se diferentes.


Agora indo um pouco mais adiante, existem algumas almas que parecem não estar fazendo nada, e pensamos: “Sim, são pessoas muito espirituais, eu suponho – mas o que elas fazem?” - pois entendemos esse 'fazer algo' como movimentação, agitação, estar ocupado o tempo todo. Não importa o quão trivial, ainda assim algo é feito! Esse é o pensamento. Mas quando uma pessoa é evoluída, mesmo que externamente pareça não estar fazendo coisa alguma, ela está fazendo e pode fazer trabalhos muito maiores internamente do que possam ser externamente notados.


Há uma história de um madzub. Um madzub é alguém que não é considerado ser uma pessoa ativa no mundo. Muitos pensam que eles são pessoas não muito equilibradas. No oriente existem alguns que sabem a respeito de tais seres, e eles têm consideração por eles. Havia um madzub em Kashmir alguns séculos atrás, o qual era permitido pelo Marajá perambular por onde quer que ele desejasse no palácio e nos jardins, e foi-lhe dado um pedaço de terra onde ele podia residir.


Ele costumava andar por todos os cantos dos jardins do Marajá que lhe era permitido entrar. Havia uma miniatura de um canhão de brinquedo no jardim, e algumas vezes esse madzub gostava de brincar com ele. Ele costumava pegar a arminha e virá-la em direção ao norte, ao sul ou para uma outra direção. Então ele a virava novamente e fazia todo tipo de gestos. Após fazer aqueles gestos ele ficava deleitado. Era como se ele estivesse lutando e que após aquela luta ele fosse vitorioso e com isso deleitava-se. Era em tais momentos que o Marajá Ranjit Singh costumava dar ordens ao seu exército: 'Agora preparem-se para a luta!' E ele obtinha êxito. A guerra prosseguia a muitos e muitos anos e continuava lentamente; nada acontecia, mas toda vez que o madzub brincava com o canhão, resultados eram alcançados.


Eu mesmo vi em Hyderabad um madzub cujo hábito era insultar todo mundo, chamar as pessoas de tais nomes que elas se afastavam dele. Ainda assim, um homem ousava ir lá a despeito de todos os insultos. O madzub disse a ele: “O que você quer?” Ele disse: “Meu caso está indo à julgamento daqui a seis dias e eu não tenho dinheiro e nenhum meio. O que devo fazer?” “Diga-me qual é a condição” disse o madzub, “Mas diga-me a verdade”. Então o homem lhe contou tudo. O madzub escutou, e então escreveu no chão: “ Parece não haver nada neste caso, então ele deve ser encerrado”. Em seguida ele disse: “Vá, está concluído”. O homem foi ao tribunal. Do lado oposto haviam muitos advogados, do lado dele não havia ninguém, porque ele era um homem pobre. O juíz escutou o caso de ambas as partes e em seguida falou as mesmas palavras que o madzub tinha escrito no chão .


O que isso significa? Isso apenas nos explica as palavras que Cristo disse: “Entrai no Reino de Deus”, significando que cada alma tem em si mesma um reino de Deus. Tornar-se consciente desse mistério da vida é abrir os nossos olhos para o reino de Deus, e assim, o que quer que façamos tem um significado, uma influência. Nunca é perdido. Se não é materializado, não importa: é espiritualizado. Nada se vai, nada aqui é perdido. Se não foi produzido neste plano, é produzido em outro plano – mas desse modo é refletido neste plano, pois sempre há uma ação e uma reação entre os dois planos. Isso significa apenas que o que fazemos – se não for materializado neste plano – é refletido do outro plano neste plano, e então é materializado. Isso é tudo. Se uma pessoa pensa: “Eu tenho pensado repetidamente sobre certo assunto e ainda ele não foi realizado”, isso apenas significa que a hora e as condições não permitiram isso se materializar. Mas uma vez enviado, ele deve finalmente ser materializado.

terça-feira, 4 de maio de 2010

Jetsun Milarepa - As Bolhas Fugazes



Quando viajava com seus discípulos, Milarepa chegou a Din Ri Namar onde ele perguntou pelo nome de um cidadão proeminente. Ao descobrir que o médico Yang Nge era um budista devotado, ele foi até a sua casa, onde o médico disse: "É dito que Jetsun Milarepa pode usar qualquer coisa à mão como uma metáfora para ensinar. Agora, por favor, use as bolhas de água nesta fossa diante de nós como uma metáfora e nos dê um discurso." Em resposta, Jetsun cantou uma canção ...


As bolhas fugazes Presto homenagem ao meu gracioso Guru - Rogo-o para fazer com que todos aqui pensem no Dharma! Como ele disse uma vez: "Esta vida é Como as bolhas, transitória e fugaz - Nela, nenhuma garantia pode ser encontrada". A vida de um leigo é como um ladrão Que entra sorrateiramente numa casa desocupada. Você não percebe a insensatez disso?


A juventude é como uma flor de verão - De repente, ela murcha. A velhice é como um fogo se espalhando Através dos campos - de repente está nos seus calcanhares. O Buda certa vez disse: "O nascimento e a morte São como o nascer e o pôr do sol - Ora vêm, ora vão." A doença é como um passarinho Ferido por um estilingue. Você não sabe que a saúde e a força uma hora irão lhe abandonar? A morte é como uma lâmpada cujo óleo secou (Após sua última centelha). Nada, eu lhe asseguro, Neste mundo é permanente. O Karma maligno é como uma cachoeira Que eu nunca vi fluir para cima. Um homem pecador é como uma árvore venenosa - Se você encostar nele, será prejudicado. Os transgressores são como ervilhas deterioradas pelo frio- Como a gordura estragada, estragam tudo. Os praticantes do Dharma são como os camponeses no campo - Com cuidado e vigor serão bem sucedidos. O Guru é como remédio e néctar - Confiando nele, a pessoa terá êxito. Disciplina é como uma torre de vigia - Observando-a, a pessoa atingirá a Realização. A Lei do Karma é como a roda de Samsara, Quem quebrá-la vai sofrer uma grande perda. Samsara é como um espinho venenoso Na carne - se não for retirado, O veneno irá aumentar e se espalhar. A vinda da morte é como a sombra De uma árvore no pôr do sol - Ela anda rápido e ninguém pode detê-la. Quando essa hora chega, O que mais pode ajudar a não ser o Dharma Sagrado? Embora o Dharma seja a fonte da vitória, Aqueles que aspiram a ele são raros. Milhares de homens estão emaranhados nas Misérias de Samsara; Nascidos neste infortúnio, Eles se esforçam para obter vantagens através de roubo e pilhagem. Aquele que fala sobre o Dharma É inspirado com exaltação, Mas quando uma tarefa lhe é colocada, Ele é arruinado e se perde. Caros cidadãos, não falem demais, Mas pratiquem o Dharma Sagrado.