segunda-feira, 27 de abril de 2009

Nisargadatta Maharaj - 23 de agosto de 1979

Maharaj: Há quanto tempo você tem usado essa vestimenta (um roupão laranja)?
Pergunta: Vinte e cinco anos.
M: Você realizou o seu Ser (Self)?
P: Eu não sou realizado. Estou apenas perambulando por aí, como se diz, na floresta escura, indo aqui e ali.
M: Quem é esse que fala isso?
P: Provavelmente o Ser.
M: Lembre que o que quer que seja chamado Deus ou Ser está no corpo, e enquanto Ele estiver lá, este sentido de ser (beingness) também estará. Quando o sentido de ser (beingness) não estiver lá, não haverá Deus, nem o Ser. Quando uma pessoa morre não é o Ser que é transformado num cadáver, é o corpo.
P: É verdade. Você vê, eu entendo tudo teoricamente, conheço como uma filosofia, mas quanto a experimentar o vácuo, conhecer o Real, estou na medida do possível.
M: O que quer que seja chamado de Deus ou de Ser existe porque existe o sentido de ser, o sentimento de “eu sou”. Esse é o princípio fundamental, a base por trás de todo o seu conhecimento, mas você está identificado com o corpo.
P: Verdade.
M: Quando não há alma não há Deus, e quando você não está, seu sentido de ser não está, não há nada.
P: Entendo a teoria disso. Tenho lido tantos livros... Mas como realizar isso?
M: Quando você entender o significado das palavras, você deve procurar descobrir quem é esse que entende.
P: Você vê, essa é a lacuna, conhecer é muito difícil.
M: Você está chamando isso de “eu”, de “mim”, isso que vai se transformar num cadáver. Esse é o pecado que você está cometendo e o obstáculo entre você e o conhecimento.
P: Essa é a diferença, a lacuna precisa ser ultrapassada.
M: Todas essas palavras são absolutamente desnecessárias. Porque você é, existe a luz, a luz do conhecimento, e quando você se for, a luz do conhecimento será extinta. Seu Guru não lhe falou isso?
P: É exatamente como ao dizer que esta bala é doce, você sente o gosto dela?
M: Seu Guru não lhe falou isso que você está escutando agora?
P: Sim, sim.
M: Isso quer dizer que você não confia nele. Você ainda não confiou nele.
P: Eu concordo, eu confio, mas talvez esteja faltando esforço de minha parte.
M: Não está faltando nada de sua parte! Você tem entendido a si mesmo como sendo um cadáver, um corpo. Você é isso que pode ser extinto?
P: Sei que não sou.
M: Então que tipo de Sadhana (prática espiritual) você vai praticar? Se você não é isso que pode ser extinto, você não vai morrer.
P: Eu entendo essa posição – não é isso que eu não entendo.
M: Então por que você tem viajado por aí ?
P: Estou procurando por algo. Estou tentando encontrar algo que não tenho conseguido encontrar.
M: Você diz que entende e ao mesmo tempo diz que não consegue encontrar; você está contando uma mentira?
P: Eu não conheço a mim mesmo. Você vê, para mim, está tudo lá. Eu sei que você não tem que ficar andando por aí. Você senta em um lugar, na sua casa, por exemplo e descobre; mas eu ainda tenho que encontrar. Então vem o pensamento de andar por aí, aquela impaciência por descobrir é que leva a pessoa de lugar a lugar, até que encontre algo. Bem, eu ainda não encontrei. O dia que eu encontrar, então eu direi, “sim, está dentro de mim”.
M: Quando você fecha seus olhos, internamente você vê Ganesan (a escuridão) com o sentimento “eu sou”, e quando você abre seus olhos, o mesmo lhe mostra o que está no exterior. Você não precisa pensar para realizar essa ação. Tudo apareceu sem a sua contribuição ativa.
P: Essa é a filosofia disso, mas fazer isso é a parte difícil, muito difícil.
M: Por que você não está aceitando esse fato? Qual é a utilidade de ficar indo de um lugar a outro? Você está difamando o roupão laranja.
P: Verdade.
M: Você vê, sua alma é tão maravilhosa, tão grandiosa e tão importante que se você sentar numa terra estéril, ela será coberta por lindos jardins. Você não entende a sua própria grandeza, o conhecimento que você é, o seu sentido de ser (de existir).
P: Não, eu não sou grande. Sou muito humilde, muito pequeno.
M: O que é humilde e o que é pequeno? O que existe sem o seu sentido de ser? Mesmo se você fizesse grandes penitências, você poderia no máximo punir o seu corpo. Você pode punir o seu sentimento de ser?
P: Não
M: Quando mandam um homem para a forca, eles podem enforcar a alma dele, o sentido de ser dele? Este corpo é enforcado. É possível punir o sentido de ser?
P: Não.
M: Portanto, Ele não é humilde e nem pequeno. Ele aprecia todas as maravilhosas qualidades, mas Ele é totalmente desapegado, não é tingido por nenhuma delas. Você vê, sua vestimenta está mostrando que você tem isso. Nós não usamos tais vestimentas. Ninguém irá chamar-me de Mahatma.
P: Eu não sou um Mahatma.
M: Então por que está usando essas roupas? Você não se preocupa com o que você está dizendo aos outros ao usar tais roupas, mas você gosta de sentir “eu sou o grande Mahatma, sou o maior de todos”. Porque você sabe e ainda não desfruta desse conhecimento, isso é um pecado pelo qual você vai ter que sofrer. Se uma grande alma, um Mahatma, chama você de tolo, você tem que sofrer isso. Se o Mahatma chama qualquer um de tolo, ele tem que sofrer, e você está chamando o seu Ser de ainda não conhecido, não compreendido. Esse é o pecado que você comete. Você está insultando sua grande alma.
Eu não quero ensinar nada para ninguém, eu apenas seguro um espelho para aqueles que vêm aqui. Eu farei você ficar diante do espelho e olhar para si mesmo. Você tem que ter a visão de si mesmo na luz que está emanando do seu próprio Ser.
Nos bhajans (práticas devocionais) dizemos, “Feche os olhos e veja que em toda parte Ele está, em todo lugar – dentro, fora, acima, abaixo”, e isso você tem que experimentar. Se Deus não estiver residindo no seu corpo você não estará ali.
P: Verdade. Com essa visão clara Maharaj pode ver e dizer. Eu posso dizer, mas não ver.
M: Se você não O reconhece bem agora neste nascimento, vários milhares de nascimentos não lhe darão a oportunidade de conhecê-Lo. Pelo menos agora você tentaria agarrá-Lo com atenção concentrada?
P: Nós tentamos.
M: Quem é esse que está tentando? Por que você está preocupado com os outros? E você? Estou endereçando isso a você!
P: Isso para mim significa o mesmo que respondi. É endereçado ao Ser e o Ser está respondendo.
M: Não perguntei o que o Ser está fazendo. Estou lhe perguntando o que você está fazendo em relação a você mesmo?
P: Onde está a diferença? Eu e o Atma somos duas coisas diferentes?
M: Está vendo, quando você fala, você se refere à consciência que está limitada ao seu corpo. Se você se refere à consciência universal, essa é Atma ou Deus. Portanto, torne claro se você refere-se a si mesmo como limitado ou ilimitado.
P: Eu sou limitado. De acordo com o que me falaram, entendo que deveria dizer que sou ilimitado. Com o conhecimento que eu tenho, com o que os mestres me disseram, sou ilimitado, e ainda assim sei que sou limitado.
M: Porque você se identifica com o corpo, é por isso que você está condicionando a si mesmo. Pela sua identificação com o corpo manifesto você perdeu de vista sua natureza real. Você deve estar sempre consciente Dela. Esse estado de consciência é a coisa natural, apenas não se separe dele.
Você vê, eu não exponho as acrobacias dos Vedas para as massas aqui. Isso é para outras pessoas fazerem, os que se interessam no corpo-mente.
P: Há tanto conhecimento impresso e disseminado em toda parte, ainda assim eu diria que a maioria das pessoas vive na escuridão, mesmo com esse conhecimento.
M: Eu não peço a ninguém para seguir nenhum caminho particular. Apenas falo para as pessoas serem o que elas são, estarem no seu estado natural, estado espontâneo. Estabilize-se ali, no sentido de ser.
P: Essas são exatamente as mesmas palavras que Baba usa. Apenas seja.
M: Tendo o servido por vinte e cinco anos, por que você negou?
P: Eu não sei.