quarta-feira, 4 de fevereiro de 2009

Hazrat Inayat Khan - A Música das Esferas

Por este título: 'A Música das Esferas' não quero encorajar qualquer superstição, ou qualquer idéia que possa atrair as pessoas para os campos da curiosidade. Através deste assunto gostaria de dirigir a atenção das pessoas que buscam a verdade, para a lei da música, que está trabalhando por todo o universo e que, em outras palavras, pode ser chamada de lei da vida, o sentido de proporção, a lei da harmonia, a lei que traz equilíbrio, a lei que está escondida atrás de todos os aspectos da vida, que mantém este universo intacto e trabalha seu destino ao longo de todo o universo, cumprindo seu propósito.
Música, como conhecemos na nossa linguagem cotidiana, é apenas uma miniatura: aquilo que nossa inteligência tem apreendido desta música ou harmonia de todo o universo e que está trabalhando por trás de nós. A música do universo é o pano de fundo da pequena imagem daquilo que nós chamamos música. Nosso senso de música, a nossa atração por música mostra que a música está nas profundezas do nosso ser. Música está por trás do trabalho de todo o universo. Música não é só o maior objeto da vida, mas música é a própria vida.
Hafiz, nosso grande e maravilhoso poeta da Pérsia, diz: "Muitos dizem que a vida entrou no corpo humano através da ajuda da música, mas a verdade é que a própria vida é música'. Gostaria de lhe dizer o que o fez dizer isso. Existe uma lenda no Oriente, que relata que Deus fez uma estátua de argila à Sua própria imagem, e pediu à alma para entrar nela. Mas a alma se recusou a entrar naquela prisão, pois sua natureza é voar livremente e não ser limitada ou estar vinculada a qualquer espécie de cativeiro. A alma não desejava de forma nenhuma entrar naquela prisão. Então, Deus pediu aos anjos para que tocassem sua música e, conforme os anjos tocaram, a alma foi movida para o êxtase. Sob o efeito daquele êxtase, a fim de tornar mais clara aquela música para si própria, ela entrou neste corpo. É uma bela lenda, e muito mais belo é o seu mistério. A interpretação dessa lenda explica-nos duas grandes leis. Uma delas é que a liberdade é a natureza da alma, e para a alma todo o drama da vida é a ausência de liberdade, que é pertencente à sua natureza original. O próximo mistério que essa lenda nos revela, é que a única razão pela qual a alma entrou no corpo de argila ou na matéria, foi a de experimentar a música da vida e tornar esta música clara para si mesma. E quando somamos esses dois grandes mistérios, um terceiro mistério, que é o mistério de todos os mistérios, vem à nossa mente: que a ilimitada parte de nós mesmos se torna limitada e presa à terra com o objetivo de tornar esta vida, que é a vida exterior, mais inteligível. Portanto, há uma perda e um ganho. A perda é a perda da liberdade e o ganho, é a experiência da vida que é totalmente adquirida pela vinda a esta limitação da vida que chamamos a vida de um indivíduo.
O que nos faz sentir atraídos por música é que todo o nosso ser é música: a nossa mente, nosso corpo, a natureza em que vivemos, a natureza que nos fez, tudo o que está por baixo e em torno de nós, tudo é música. Sendo que estamos perto de toda esta música e vivemos, nos movemos e temos nosso ser na música, por isso ela nos interessa. Ela atrai a nossa atenção e nos dá prazer, pois corresponde ao ritmo e ao tom que estão mantendo o mecanismo de todo o nosso ser intacto. O que nos agrada em qualquer uma das nossas artes, seja desenho, pintura, arquitetura ou escultura, e o que nos interessa na poesia, é a harmonia que está por detrás deles, que é a música. É música que a poesia sugere para nós: o ritmo da poesia ou a harmonia de idéias e frases. Além disso, na pintura e no desenho é o nosso senso de proporção e nosso senso de harmonia o que nos dá todo o prazer que obtemos ao admirar arte. O que nos compele a estar perto da natureza é a música da natureza e a música da natureza é mais perfeita do que a da arte. Temos uma sensação de exaltação ao nos deslocarmos por um bosque, olhar para o verde, estar perto da água corrente que têm o seu ritmo, seu tom e harmonia. O movimento pendular dos ramos na floresta, o surgimento e a queda das ondas - tudo tem a sua música. Depois de contemplarmos e nos tornarmos um com a natureza, nossos corações abrem-se para sua música. Nós dizemos: 'Gosto da natureza', e o que é que desfrutamos na natureza? É a sua música. Algo em nós foi tocado pelo movimento rítmico, pela harmonia perfeita que é tão raramente encontrada nesta nossa vida artificial. Ela nos eleva e nos faz sentir que é este o verdadeiro templo, a verdadeira religião. Um momento passado no meio da natureza com o coração aberto é toda uma vida, se estamos em sintonia com a natureza.
Quando olhamos para o cosmos, os movimentos das estrelas e dos planetas, as leis da vibração e ritmo - tudo perfeito e imutável - isso nos mostra que o sistema cósmico está trabalhando pela lei da música, a lei da harmonia. Sempre que há falta de harmonia de qualquer tipo no sistema cósmico, de maneira proporcional, catástrofes acontecem no mundo e sua influência é vista em muitas forças destrutivas que manifestadas no mundo. Se há algum princípio sobre o qual toda a lei astrológica está baseada - e as ciências da magia e misticismo por trás dela - é o da música. Portanto, tanto no caso das almas mais iluminadas que já viveram neste mundo, como no dos maiores de todos os profetas da Índia - suas vidas foram música. A partir da miniatura de música que entendemos, eles se expandiram para todo o universo da música e dessa forma foram capazes de inspirar. Aquele que encontra a chave para a música de todo o trabalho da vida é aquele que passa a ser intuitivo, que tem inspiração; é ele a quem as revelações se manifestam, para, em seguida, sua linguagem tornar-se música.
Cada objeto que vemos é revelador. De que forma? Ele nos diz o seu caráter, sua natureza e seu segredo. Toda pessoa que vem até nós nos conta seu passado, presente e futuro. De que maneira? Cada presença explica-nos tudo o que contém. Como? Sob a forma de música - se apenas pudermos ouvi-la. Não existe nenhuma outra língua: é ritmo, é tom. Nós a escutamos, mas não com nossos ouvidos. Uma pessoa amigável mostra harmonia em sua voz, suas palavras, seus movimentos e forma. Uma pessoa não amigável, em todos os seus movimentos, no seu olhar e expressão, em sua caminhada, em tudo, vai mostrar desarmonia - apenas quando podemos ver. Eu costumava me divertir na Índia com um amigo que ficava contrariado muito facilmente. Às vezes, quando ele me visitava eu dizia: "Você está contrariado hoje?" Ele perguntava: "Agora, como você sabe que estou contrariado hoje?" Eu respondia: "Seu turbante me diz. A maneira que você prendeu seu turbante não mostra harmonia".
Cada ação nossa mostra uma atitude harmônica ou desarmônica. Há muitas coisas que você pode perceber na caligrafia, mas a principal coisa na leitura da escrita manual são as curvas harmoniosas e desarmoniosas. Elas quase falam com você, e dizem o humor em que a pessoa escreveu. A escrita à mão diz muitas coisas: o grau de evolução do escritor, a sua atitude perante a vida, o seu carácter. Você não precisa ler a carta, você só tem de ver a sua caligrafia, pois as linhas e curvas mostrarão se ele é harmonioso ou não - isso se você puder ver.
Mas em cada ser vivo você pode ver isso, e se você olhar com uma visão aberta para a natureza das coisas, irá ler até mesmo na árvore - a árvore que dá frutos ou flores - que música que ela expressa. Você pode ver a partir da atitude de uma pessoa se essa pessoa será seu amigo ou vai acabar sendo seu inimigo. Você não precisa esperar até o fim, você pode ver à primeira vista se ele está inclinado amigavelmente ou não, porque cada pessoa é música, música perpétua, continuamente tocando dia e noite. Sua faculdade intuitiva pode ouvir essa música e essa é a razão pela qual uma pessoa é repelente e a outra tão atraente: trata-se da música que elas exprimem. Suas atmosferas estão carregadas dela.
Existe uma história de Umar, o conhecido califa da Arábia. Alguém que queria prejudicar Umar estava procurando por ele, e ele soube que Umar não vivia em palácios - embora fosse um rei - mas que ele passava a maior parte do seu tempo com a natureza. Esse homem ficou muito feliz ao pensar que agora ele teria todas as oportunidades para realizar seu objetivo. Conforme ele se aproximou do local onde estava sentado Umar, quanto mais perto que ele chegava, mais sua atitude mudava, até que ao final ele deixou cair o punhal que estava em sua mão, e disse: "Eu não posso prejudicar-te. Diga-me, qual é o poder em você que me priva de conseguir o objetivo que vim levar a cabo?" Umar respondeu: "Meu 'em-um-mento' (at-one-ment -"união") com Deus". Sem dúvida este é um termo religioso, mas o que significa - "em-um-mento" (at-one-ment) com Deus? É estar em sintonia com o Infinito, em harmonia com todo o universo. Em palavras simples, Umar foi o receptáculo da música de todo o universo.
O grande encanto que a personalidade dos santos tem mostrado em todos os tempos foi sua resposta à música de todo o Ser. Esse tem sido o segredo de como eles se tornaram os amigos dos seus piores inimigos. Mas este não é unicamente um poder dos santos, ele é manifesto em toda pessoa em maior ou menor grau. Todos mostram harmonia ou desarmonia de acordo com o quanto estão abertos para a música do universo. Quanto mais estamos abertos a tudo o que é belo e harmonioso, mais nossa vida está sintonizada com essa harmonia universal, e quanto mais você mostrar uma atitude amigável para com todos que encontra, sua própria atmosfera criará música em torno de si.
A diferença entre o ponto de vista material e o espiritual é que o ponto de vista material vê a matéria como a primeira coisa, a partir da qual a inteligência, a beleza e tudo o mais evoluem posteriormente. Do ponto de vista espiritual, vemos a inteligência e a beleza em primeiro lugar e com elas vem tudo o que existe. De um ponto de vista espiritual, vemos que o que consideramos por último é o mesmo que o primeiro. Portanto, na essência de todo este Ser - como sua base - há música, da mesma forma que podemos ver que, na essência da semente da rosa existe a rosa, a sua fragrância, forma e beleza. Apesar da semente não estar manifesta, ao mesmo tempo isso está lá na sua essência. Aquele que se sintoniza não apenas com o Ser exterior, mas também com o interior e com a essência de todas as coisas, recebe um insight sobre a essência de todo o Ser, e, portanto, pode encontrar e apreciar o aroma e flor que ele vê na rosa, na mesma medida, mesmo sendo na semente.
O grande erro desta era é que a atividade tem aumentado tanto, que há pouca margem deixada para o descanso da vida cotidiana. Repouso é o segredo de toda a contemplação e meditação, o segredo de ficar em sintonia com esse aspecto da vida que é a essência de todas as coisas. Quando não se está acostumado a ter descanso, não se sabe o que está por detrás do seu ser. Essa condição é experimentada primeiro ao preparar o corpo e também a mente, por meio da purificação. E, tornando os sentidos mais refinados, tornamos-nos capazes de sintonizar nossa alma com todo o Ser. Parece complexo, e ainda é tão simples. Quando estamos abertos a um velho amigo na vida, sabemos muito sobre ele. É apenas a abertura do coração, é o 'em-um-mento' com nosso amigo; sabemos seus defeitos e os seus méritos. Sabemos como experimentar e desfrutar da amizade. Onde há ódio, preconceito e amargura, existe perda de compreensão. Quanto mais profunda é a pessoa, mais amigos ela tem. É pequenez, estreiteza, falta de desenvolvimento espiritual, o que torna uma pessoa exclusivista, distante e diferente dos outros. Ela sente-se superior, maior e melhor do que os outros; sua atitude amiga parece ter sido perdida. Dessa forma ele se aparta dos outros, e nisso reside a sua tragédia. Essa pessoa nunca é feliz. Aquele que é feliz é o que está pronto para ser amigo de todos. Sua visão sobre a vida é amigável. Ele não é amigável apenas com as pessoas, mas também com objetos e condições. É por essa atitude de amizade que o homem se expande e quebra aqueles muros que o mantém na prisão. E, é ao quebrar os muros que ele experimenta o 'em-um-mento' com o Absoluto. Este 'em-um-mento' com o Absoluto manifesta-se como a música das esferas, e isso ele experimenta de todos os lados: a belezas da natureza, a cor das flores, tudo o que vê, todos que encontra. Nas horas de contemplação e solidão e nas horas em que está no mundo, a música sempre está ali e ele está sempre desfrutando da harmonia.

Bhagavan Sri Ramana Maharshi - Nan Yar? (Quem sou eu?)

1. Quem sou eu?
O corpo grosseiro, que é composto dos sete humores (dhatus), não sou eu; os cinco órgãos de cognição sensitiva, ou seja: os sentidos de ouvir, tocar, ver, saborear, e cheirar, que apreendem seus respectivos objetos, ou seja: som, toque, cor, sabor, e odor, não sou eu; os cinco órgãos sensoriais cognitivos, ou seja: os órgãos da fala, locomoção, compreensão, excreção e procriação, que têm como suas respectivas funções aquelas de falar, movimentar, compreender, excretar, e desfrutar, não sou eu; as cinco respirações vitais, prana, aprana, vyana, udana e samana; que atuam respectivamente nas cinco funções do inspirar, expirar, etc... não sou eu; mesmo a mente que pensa, não sou eu; e também a ignorância, que é provida apenas com as impressões residuais dos objetos e nas quais não há objetos e nenhuma função, não sou eu.
2. Se não sou eu nenhum desses, então quem sou eu?
Depois de negar tudo mencionado acima por meio do ‘não sou isto’, ‘não sou aquilo’, aquela Consciência que permanece sozinha – isso sou Eu.
3. Qual é a natureza da Consciência?
A natureza da Consciência é Satchiananda (existência/consciência/graça).
4. Quando a realização do Ser será obtida?
Quando o mundo, que é aquilo que é visto for removido, haverá realização do Ser, o qual é o observador.
5. Não haverá realização do Ser enquanto o mundo estiver lá (sendo tomado como real)?
Não
6. Por quê?
O observador e o objeto visto são como a corda e a cobra. Assim como o conhecimento da corda, que é o substrato, não surgirá a menos que o falso conhecimento da ilusória serpente saia; assim a realização do Ser, que é o substrato, não será obtida a menos que a crença de que o mundo é real seja removida.
7. Quando o mundo, que é o objeto visto, será removido?
Quando a mente, que é a causa de todas as cognições e de todas as ações tornar-se quieta, o mundo desaparecerá.
8. Qual é a natureza da mente?
Aquilo que é chamado de ‘mente’ é um notável poder que reside no Ser. Ele causa o surgimento de todos os pensamentos. Sem os pensamentos não existe tal coisa como a mente. Portanto, o pensamento é a natureza da mente. Sem os pensamentos não há uma entidade independente chamada mundo. No sono profundo não existem pensamentos e também não há mundo. Assim como uma aranha emite o fio (da teia) para fora e de novo o recolhe para dentro de si, da mesma forma a mente projeta o mundo fora dela e de novo o analisa dentro de si mesma. Quando alguém persistentemente investiga a natureza da mente, a mente termina por deixar o Ser (como o resíduo).
O que é referido como o Ser é o Atman. A mente existe apenas em dependência de algo denso; ela não pode permanecer sozinha. É a mente que é chamada de corpo sutil ou de alma individual (jiva).
9. Qual é o caminho de investigação para compreender a natureza da mente?
Aquilo que surge como ‘eu’ neste corpo é a mente. Se alguém perguntasse qual é o primeiro lugar no corpo em que o pensamento ‘eu’ surge, ele descobriria que ele surge no coração. Esse é o lugar da origem da mente.
Mesmo se alguém pensasse constantemente em ‘eu’ ‘eu’, ele seria conduzido àquele lugar. De todos os pensamentos que surgem na mente, o pensamento ‘eu’ é o primeiro. É somente depois de seu surgimento que outros pensamentos surgem. É depois do aparecimento do pronome de primeira pessoa que os de segunda e terceira pessoa aparecem; sem o pronome de primeira pessoa não haveria os de segunda e terceira.
10.Como a mente se tornará quieta?
Pela investigação ‘Quem sou eu?’. O pensamento ‘quem sou eu?’ irá destruir todos os outros pensamentos, e como a vareta usada para avivar uma fogueira, será ele próprio destruído no final. Então, surgirá a realização do Ser (Auto-realização).
11. Quais são os meios para manter-se constantemente no pensamento ‘Quem sou eu?’?
Quando outros pensamentos surgem, não devemos segui-los, mas sim perguntar: “Para quem eles surgem?” Não importa quantos pensamentos surjam. Para cada pensamento que surgisse, deveria ser questionado com diligência: “Para quem este pensamento surgiu?”. A resposta que emergiria seria “Para mim”. Logo em seguida se perguntássemos “Quem sou eu?”, a mente irá retornaria para sua fonte; e o pensamento surgido ficaria quieto. Com repetida prática, dessa maneira, a mente desenvolverá o conhecimento para permanecer em sua fonte. Quando a mente que é sutil, passa através do cérebro e dos órgãos sensitivos, os nomes densos e as formas aparecem, quando ela fica no coração, os nomes e as formas desaparecem.
Não deixar a mente fugir, mas mantê-la no Coração é o que é chamado “intimidade” (antarmukha).
Deixar a mente fugir do Coração é conhecido como “exteriorização” (bahir-mukha). Portanto, quando a mente fica no Coração, o ‘eu’ que é a fonte de todos os pensamentos passará, e o Ser que sempre existiu brilhará. Qualquer coisa que se faça deve ser feita sem o “eu” egoísta. Se alguém age deste modo, tudo se mostrará ser da natureza de Shiva (Deus).
12. Não existem outros meios para fazer a mente aquietar-se?
Além da investigação de si, não existem meios adequados. Se através de outros meios pudéssemos buscar o controle da mente, a mente pareceria estar controlada, mas de novo seguiria adiante. Também, através do controle da respiração, a mente se tornará quieta; mas ela estará quieta somente durante o tempo que a respiração permanecer controlada; e quando a respiração retomar seu fluxo, a mente também começará a mover-se de novo e irá vagar impelida por impressões residuais.
A fonte é a mesma tanto para a mente como para a respiração. Pensamento, de fato, é a natureza da mente. O pensamento ‘eu’ é o primeiro pensamento da mente; e isso é egoísmo. É dali que se origina o egoísmo e também a respiração. Portanto, quando a mente torna-se quieta, a respiração é controlada, e quando a respiração é controlada a mente torna-se quieta. Mas, em sono profundo, embora a mente torne-se quieta, a respiração não pára. Isso ocorre pela vontade de Deus, de modo que o corpo possa ser preservado e outras pessoas possam não estar sob a impressão de que ele está morto. No estado desperto e no samadhi, quando a mente torna-se quieta, a respiração é controlada. Respiração é a forma densa da mente. Até o momento da morte, a mente mantém a respiração no corpo; e quando o corpo morre a mente leva a respiração junto com ela. Portanto, o exercício de controle respiratório é somente um auxílio para deixar a mente quieta (manonigraha); ele não destruirá a mente (manonash).
Assim como a prática do controle respiratório, meditar sobre as formas de Deus, repetir mantras, restringir a alimentação, etc são apenas auxiliares para render a mente quieta.
Através da meditação nas formas de Deus e através da repetição de mantras, a mente torna-se focada. A mente sempre está vagando. Assim como quando uma corrente é dada a um elefante para que ele a segure em sua tromba, ele segue agarrado à corrente e nada mais, do mesmo modo, quando a mente está ocupada com um nome ou uma forma, ela apenas se agarrará àquilo. Quando a mente se expande na forma de incontáveis pensamentos, cada pensamento torna-se fraco; mas assim que os pensamentos conseguem poder de decisão, a mente torna-se focada e forte: para uma mente assim a Auto-investigação torna-se fácil. De todas as regras restritivas, aquela relacionada a comer alimentos ‘sattvicos’ em quantidades moderadas é a melhor; através da observação desta regra, a qualidade ‘sattvica’ da mente crescerá, e isso será útil para a Auto-investigação.
13. As impressões residuais (pensamentos) de objetos parecem ir como as ondas de um oceano. Quando todas elas serão destruídas?
Quando a meditação no Ser elevar-se mais e mais alto, os pensamentos serão destruídos.
14. É possível que as impressões residuais de objetos que vêm de tempos imemoriais, por assim dizer, sejam dissolvidas e que uma pessoa permaneça como o puro Ser?
Sem submeter-se à dúvida “É possível, ou não?”, uma pessoa deve persistentemente manter-se na meditação do Ser. Mesmo que seja uma grande pecadora, ela não deveria nem se preocupar e nem chorar: “Oh! Eu sou um pecador, como posso ser salvo?" Ela deveria renunciar completamente ao pensamento “Eu sou um pecador” e concentrar-se agudamente na meditação do Ser; então, ela certamente será bem sucedida. Não há duas mentes – uma boa e outra má; a mente é apenas uma. São as impressões residuais que são de dois tipos – favoráveis ou desfavoráveis. Quando a mente está sob a influência de impressões favoráveis ela é chamada boa e quando está sob a influência de impressões desfavoráveis é considerada má.
Não deveríamos permitir que a mente vagasse na direção de objetos mundanos e nem na direção daquilo que concerne às outras pessoas. Não importa quão ruins as outras pessoas possam ser, não deveríamos sustentar nenhuma aversão para com elas. Tanto o desejo quanto a aversão deveriam ser evitados. Tudo aquilo que damos aos outros damos a nós mesmos. Se essa verdade é compreendida, quem não irá dar aos outros? Quando alguém se eleva tudo se eleva; quando alguém torna-se quieto, tudo torna-se quieto. Na medida em que nos comportarmos com humildade, haverá proporcionalmente bom resultado. Se a mente torna-se quieta, a pessoa pode viver em qualquer lugar.
15. Por quanto tempo a investigação deve ser praticada?
Enquanto existirem impressões de objetos na mente, a investigação “Quem sou eu?” é necessária. Assim que surgem os pensamentos, eles devem ser destruídos ali mesmo no exato lugar de sua origem através da investigação. Se alguém faz uso da contemplação do Ser ininterruptamente, até que o Ser seja obtido, isso por si só já é suficiente. Enquanto houverem inimigos dentro da fortaleza, eles continuarão atacando; se forem destruídos assim que emergirem, a fortaleza cairá em nossas mãos.
16. Qual é a natureza do Ser?
O que existe na verdade é somente o Ser. O mundo, a alma individual e Deus são aparências, aspectos dele. Como a prata na madrepérola, esses três aspectos aparecem ao mesmo tempo e desaparecem ao mesmo tempo. O Ser é o lugar onde não há absolutamente nenhum pensamento de ‘eu’. Isso é chamado “silêncio”. O próprio Ser é o mundo; o próprio Ser é o ‘Eu’; o próprio Ser é Deus; tudo é Shiva, o Ser.
17. Não são todas as coisas o trabalho de Deus?
Sem desejo, decisão ou esforço, o sol surge; e em sua mera presença, a pedra-sol emite fogo, o lótus floresce, a água evapora, as pessoas executam suas várias funções e então descansam. Assim como só pela presença do magneto a agulha já se move, é pela virtude da mera presença de Deus que as almas, governadas pelas três funções cósmicas ou pelas cinco atividades divinas, executam suas ações e então descansam, de acordo com seus respectivos karmas. Deus não tem intenção; nenhum karma vincula-se a Ele. São como ações mundanas que não afetam o sol, ou como os méritos e desméritos dos quatro elementos que não afetam o espaço todo-abrangente que eles ocupam.
18. Dos devotos, quem é o maior?
Aquele que entrega a si mesmo ao Ser o qual é Deus, é o mais excelente dos devotos. Entregar-se a Deus significa permanecer constantemente no Ser sem dar espaço para o surgimento de quaisquer pensamentos além daquele do Ser. Quaisquer que sejam os fardos, são descarregados em Deus, Ele os carrega. Já que o supremo poder de Deus faz todas as coisas se moverem, porque deveríamos, sem que nos submetermos a Ele, constantemente nos preocupar com pensamentos sobre aquilo que deveria ser feito e como deveria ser feito, e aquilo que não deveria ser feito e como não deveria? Nós sabemos que o trem carrega todas as cargas, e assim, depois de pegá-lo, por que deveríamos carregar nossa pequena bagagem na cabeça para nosso desconforto ao invés de colocá-la no chão do trem e nos sentirmos aliviados?
19. O que é o não-apego?
Assim que os pensamentos surgem, destruí-los sem deixar qualquer resíduo no exato lugar de sua origem, é o não-apego. Assim como um catador de pérolas amarra uma pedra na sua cintura, submerge para o fundo do mar e lá pega as pérolas, de mesmo modo, cada um de nós deveria ser dotado com o não-apego e mergulhar dentro de si para obter o Ser-Pérola.
20. É possível para Deus e para o Guru efetuar a libertação de uma alma?
Somente Deus e o Guru mostrarão o caminho para a libertação; por si mesmos eles não levarão a alma ao estado de libertação. Na verdade, Deus e o Guru não são diferentes. Assim como a presa que caiu na jaula de um tigre não tem escapatória, aqueles que chegaram dentro do âmbito do gracioso olhar do Guru serão salvos pelo Guru e não ficarão perdidos; ainda assim, cada um deve por seu próprio esforço percorrer o caminho mostrado por Deus ou pelo Guru e obter a libertação. Uma pessoa pode conhecer a si mesma somente com o próprio olho do conhecimento e não com o de outra pessoa. Aquele que é Rama precisa da ajuda de um espelho para saber que ele é Rama?
21. É necessário para aquele que anseia pela libertação investigar sobre a natureza das categorias (tattvas)?
Assim como alguém que quer jogar o lixo fora não precisa analisá-lo e ver o que ele é, do mesmo modo, aquele que quer conhecer o Ser não tem que contar o número de categorias ou investigar sobre suas características; o que ele tem de fazer é rejeitar todas as categorias que escondem o Ser. O mundo deveria ser considerado como um sonho.
22. Não há diferenças entre a vigília e o sonho?
A vigília é longa e o sonho é curto, além dessa não há outra diferença. Assim como os acontecimentos da vigília parecem ser reais enquanto estamos despertos, do mesmo modo nos parecem os de um sonho enquanto sonhamos.
No sonho a mente toma outro corpo. Tanto no estado de sonho como no de vigília, os pensamentos, nomes e formas ocorrem simultaneamente.
23. Ler livros é de alguma utilidade para aqueles que desejam a libertação?
Todos os textos dizem que para obter a libertação uma pessoa deve tornar a mente quieta; portanto, o ensinamento conclusivo é de que a mente deve se fazer quieta; uma vez que isso tenha sido entendido, não há necessidade de intermináveis leituras. Para aquietar a mente, uma pessoa tem somente que investigar dentro de si aquilo que é o Ser; como essa busca poderia ser feita em livros? A pessoa deve conhecer o seu Ser com o seu próprio olho da sabedoria. O Ser está dentro dos cinco invólucros; enquanto que os livros estão fora deles. Já que o Ser tem de ser investigado através do descarte dos cinco invólucros, é fútil procurar por ele em livros. Chegará um momento em que a pessoa terá de esquecer tudo aquilo que aprendeu.
24. O que é felicidade?
Felicidade é a real natureza do Ser; felicidade e o Ser não são diferentes. Não há felicidade em qualquer objeto do mundo. Nós imaginamos através da nossa ignorância que recebemos felicidade dos objetos. Quando a mente vai para fora, ela experimenta miséria. Na verdade, quando seus desejos são satisfeitos, ela retorna ao seu próprio lugar e desfruta da felicidade que é o Ser. Do mesmo modo, nos estados de sono profundo, samadhi e desfalecimento, e quando o objeto desejado é obtido ou quando o objeto indesejado é removido, a mente torna-se direcionada para o interior e desfruta a pura felicidade do Ser. Assim, a mente move-se alternadamente sem descanso indo para fora do Ser e retornando a ele. Debaixo da árvore a sombra é agradável; fora dela, em área aberta, o calor é escaldante. Uma pessoa que esteve sob o sol, sente-se refrescada quando chega na sombra. Alguém que insiste em ir da sombra ao sol e logo volta à sombra é um tolo. Um homem sábio fica permanentemente na sombra. Similarmente, a mente de alguém que conhece a verdade não abandona Brahma. A mente do ignorante, ao contrário, revolve-se no mundo sentindo-se miserável, retornando por um breve tempo a Brahma para experimentar felicidade. De fato, aquilo que é chamado mundo é somente pensamento. Quando o mundo desaparece, isto é, quando não há pensamento, a mente experimenta felicidade; e quando o mundo aparece, ela experimenta miséria.
25. O que é sabedoria-intuitiva (jnana-drishti)?
Permanecer quieto é chamado de sabedoria-intuitiva. Permanecer quieto é dissolver a mente no Ser. Telepatia, saber dos acontecimentos passados, presentes e futuros, assim como a clarividência, não constituem sabedoria-intuitiva.
26. Qual é a relação entre ausência de desejo e sabedoria?
Ausência de desejo é sabedoria. Os dois não são diferentes; eles são o mesmo. Ausência de desejo é evitar voltar a mente em direção a qualquer objeto. Sabedoria significa a aparição de nenhum objeto. Em outras palavras, não buscar qualquer outra coisa além do Ser é desapego ou ausência de desejo; não deixar o Ser é sabedoria.
27. Qual é a diferença entre investigação e meditação?
Investigação consiste em reter a mente no Ser. Meditação consiste em pensar que o próprio Ser é Brahma, existência-consciência-graça.
28. O que é libertação?
Investigar sobre a natureza do seu Ser que está escravizado e perceber sua verdadeira natureza é libertação.