quarta-feira, 7 de janeiro de 2009

Farid ud-Din Attar


No começo dos séculos Deus usou as montanhas como pregos para fixar a terra; depois lavou-lhe a face com as águas dos oceanos. Colocou a terra sobre o dorso de um touro; o touro sobre um peixe, e o peixe está no ar. Mas sobre o que repousa o ar? Sobre nada. Mas nada é nada, e tudo isso é nada. Admira, pois, a obra desse Rei, ainda que ele mesmo não a considere mais do que puro nada. Visto que existe unicamente a essência Dele, certamente não há nada fora ela. Seu trono está sobre a água, e o mundo está no ar; mas deixa água e ar, pois tudo é Deus: o Trono celeste e o mundo não são mais que um talismã. Deus é tudo, e as coisas têm somente um valor nominal. Saiba que o mundo visível e o mundo invisível são Ele mesmo. Não há nada além Dele, e o que é, é Ele. Porém, ai! Ninguém tem a possibilidade de vê-Lo. Os olhos são cegos, ainda que o mundo esteja iluminado por um sol brilhante. Se chegas a percebê-lo, perdes o juízo; se o vires completamente, perdes a ti mesmo. Coisa admirável !

Gurdjieff - Cristianismo

Pergunta: O senhor é cristão? O que pensa disso? Deveríamos amar o próximo? E quem pode amar como um cristão?
Gurdjieff: O cristianismo implica muitas coisas. Tomemos apenas uma como exemplo: Quem pode amar ou detestar quando quer? Entretanto, o ensinamento cristão diz claramente que se deve amar os homens. Mas é impossível.
Contudo, é uma verdade absoluta que é necessário amar. Primeiro, é preciso ser capaz, só então se pode amar. Infelizmente, com o tempo, os cristãos de hoje só retiveram desse ensinamento a segunda metade, que é: amar, e perderam de vista a primeira - a religião que deveria tê-la precedido. Mas seria totalmente absurdo que Deus exigisse do homem aquilo que ele não tem condições de dar.
A metade do mundo é cristã, a outra metade segue outras religiões. Para mim, que sou um homem sensato, não há nenhuma diferença: elas se assemelham à religião cristã. É possível dizer que o mundo inteiro é cristão. Só diferem os nomes. O mundo foi cristão não desde ontem, mas desde milhares de anos. Havia cristãos bem antes do advento do cristianismo. Assim, o bom senso me faz dizer: há tantos anos que os homens são cristãos! como podem ser tão insensatos para exigir o impossível?
Mas a realidade é completamente diferente. As coisas nem sempre foram como são agora. Foi só há pouco tempo que os homens esqueceram a primeira parte desse ensinamento. Tendo esquecido, eles perderam o meio que tinham de se tornarem capazes. E, na verdade, isso se tornou impossível para eles.
Cada um de vocês se pergunte simplesmente, com franqueza, se pode amar todos os homens. Se bebeu uma xícara de café, ele ama; do contrário, ele não ama. Como se pode chamar isso de cristianismo?
No passado, todos os homens não eram chamados indistintamente de cristãos. Numa mesma família, uns eram chamados de cristãos, outros de pré-cristãos e outros ainda de não-cristãos. Desse modo, no seio de uma só e mesma família, poderia haver membros pertencentes à primeira, segunda e terceira categoria. Hoje, porém, todos se dizem cristãos. É ingênuo, desonesto, irrefletido e mesmo desprezível usar esse nome quando ele não é justificado. Um cristão é um homem capaz de observar os Mandamentos.
Um homem que é capaz de cumprir simultaneamente, com seu pensamento e sua essência, tudo que é pedido de um cristão, é chamado cristão sem aspas. Um homem que em pensamento, tem o desejo de cumprir o que se pede a um cristão, mas que só pode fazê-lo com seu pensamento, e não com sua essência, chama-se pré-cristão. O homem que não pode fazer nada, nem sequer com seu pensamento, chama-se não-cristão.