sábado, 28 de fevereiro de 2009

G. I. Gurdjieff - "Homem"

Um homem vem ao mundo como uma folha de papel em branco, e, imediatamente, todos em torno dele começam a competir uns com os outros para sujá-la e enchê-la com educação, moralidade, informação, que chamamos 'conhecimento' e com todos os tipos de idéias sobre deveres, honra, consciência e assim por diante. E cada um afirma imutabilidade e infalibilidade quanto aos métodos que utilizam para enxertar esses ramos no tronco principal, chamado 'personalidade' do homem. A folha de papel progressivamente torna-se suja e quanto mais suja se torna, isto é, quanto mais um homem é recheado com informações efêmeras e noções de dever, honra e assim por diante, que são empurradas para dentro dele ou sugeridas a ele pelos outros, mais "inteligente" e valoroso ele é considerado por aqueles à sua volta.
E, vendo que as pessoas olham sua sujeira como mérito, ele inevitavelmente passa a olhar a folha suja de papel sob a mesma luz. E então você tem um modelo daquilo a que chamamos de um 'homem', a quem tais palavras como "talentoso" e "gênio" são frequentemente aplicadas. E o temperamento do nosso 'gênio' quando ele acorda de manhã é estragado por todo o dia se ele não encontrar os seus chinelos ao lado da cama.
O homem comum não é livre em sua vida, em suas manifestações ou em seu humor. Ele não pode ser o que gostaria de ser e aquilo que considera ser; ele não é aquele “Homem", que soa poderoso! O próprio nome 'homem' significa - o "apogeu da criação", mas como é que esse título se aplica ao homem contemporâneo?

E ainda, o homem deveria realmente ser o apogeu da criação, uma vez que ele é formado e tem em si mesmo todas as possibilidades de aquisição de dados exatamente semelhantes àqueles do Concretizador de tudo o que existe no Universo. Para ter o direito ao nome de homem, devemos ser um. E para ser um homem, deve-se primeiro de tudo, com uma incansável persistência e um insaciável impulso de desejo proveniente de todas as distintas partes independentes que constituem sua inteira presença comum, ou seja, com um desejo vindo simultaneamente do pensamento, do sentimento e do instinto orgânico, trabalhar baseado num conhecimento de si mesmo total e abrangente, ao mesmo tempo lutando incessantemente contra suas fraquezas subjetivas, e em seguida - apoiando-se sobre os resultados obtidos pela consciência apenas no que diz respeito aos defeitos na sua subjetividade estabelecida, bem como os meios para a possibilidade de combatê-los - lutar pela sua erradicação sem misericórdia para com si próprio.
Falando francamente, o homem contemporâneo como podemos conhecê-lo, se formos capazes de imparcialidade, não é nada mais do que um mecanismo de relógio, apesar de ser uma construção muito complexa.
Um homem deve, sem falta, pensar profundamente sobre cada aspecto de sua mecanicidade e compreendê-la minuciosamente, a fim de apreciar plenamente o significado dessa mecanicidade e todas as consequências e resultados que ela implica, assim como sua própria vida e justificação do sentido e objetivo de seu surgimento e de sua existência.

sexta-feira, 27 de fevereiro de 2009

Hazrat Inayat Khan (1882–1927) - O Mistério da Cor e do Som

Tanto do ponto de vista Sufi quanto do de todos os místicos, o estado original de toda a criação é a vibração e a vibração manifesta-se em duas formas ou estágios. Na sua condição original a vibração é inaudível e invisível, mas, em seu primeiro estágio para a manifestação torna-se audível e no seu próximo estágio, visível. Na sua fase audível, em termos Vedânticos, é chamada Nada- uma palavra que significa som - ou Nada Brahma que representa: Som o Criador, Som o Espírito Criativo. A próxima etapa é chamada Jatanada - uma palavra que significa luz. São os diferentes graus dessa luz e a comparação entre eles, o que dá origem às diferentes cores. As cores são apenas as diferentes tonalidades da luz; comparadas umas com as outras são cores, mas na realidade, a luz faz todas as cores. Isso é demonstrado pela luz do sol que não tem nenhuma cor especial que lhe é própria, mas a luz que as plantas partilham manifesta-se nas cores das suas flores. Essas cores parecem ser as cores das flores, dos vegetais e folhas, quando na realidade são as cores do sol.

No caso das almas também podemos perceber que a manifestação de tal variedade entre elas é uma ilusão também. Esquecemos que todas as várias faces e as infinitas formas dos seres humanos pertencem a um Espírito e que são as manifestações daquele Espírito único. Quando começamos a compreender a teoria da cor e do som, podemos começar a entender isso também. Por exemplo, o que é o som? As diferentes notas são os diferentes graus de respiração: a respiração humana ou o eco proveniente de um vaso, de um instrumento, ou de um sino - pois isso também é respiração - a respiração dos seres humanos, bem como a respiração dos objetos. De uma respiração muitos sons manifestam-se, portanto, isso nos leva de volta à idéia de unidade. Toda essa variedade de cores, formas e sons provêm de uma única fonte.

Associado a isso, há a questão do misticismo do número. Essa é a idéia de ritmo. Cada movimento deve ter o seu ritmo. Não pode haver movimento sem ritmo. Por ritmo imaginamos os intervalos de tempo, como horas ou minutos ou como colcheia, semicolcheia e semibreve na música. Todos eles surgem do nosso hábito de dividir o tempo em ritmo. Fazemos isso porque a nossa própria vida depende de ritmo. O batimento do pulso, do coração, na cabeça - todos mostram o ritmo da vida. A ciência dos números vem da ciência do ritmo. Um certo número surge para denotar um certo período de tempo, cada ação ou movimento requer um certo tempo e tem um efeito correspondente. Todo efeito que é produzido por cor, som ou número depende de seu efeito harmonioso ou desarmonioso. Se o som não é harmonioso, não tem um efeito desejável sobre nós, se uma cor não é harmoniosa também tem um efeito indesejável. Isso mostra que não é o número ou o som particular que dá o efeito desejável, mas a harmonia. É por isso que o conhecimento do efeito do som, da cor ou do número é insuficiente sem um desenvolvimento de um sentido de harmonia em nós mesmos, para que possamos entender o efeito harmonioso dessas coisas.

Os místicos têm visto cinco tatwas, ou elementos, trabalhando por trás tanto do som quanto do ritmo, embora os músicos considerem sete notas em uma escala. A escala original conhecida pelos místicos tinha cinco números, e havia cinco tipos de escalas entre as pessoas antigas, com cinco diferentes classes de ritmos. Tomava-se cinco cores para representar os cinco elementos. As pessoas frequentemente dizem: "Esta cor dá sorte", e que "aquela dá azar". "Este número dá sorte e aquele dá azar". Mas são a cor ou o número especiais em si, é a harmonia da situação que dá sorte ou azar: em que relação aquele determinado número e cor estão a você, aos negócios da sua vida, à sua própria constituição e ao seu estágio de evolução. Se eles estão em harmonia com a sua vida, então são harmoniosos e dão sorte. Se não, eles são desarmônicos e dão azar. Isto não significa que uma determinada cor é desarmoniosa; o que decide se ela é ou não harmoniosa está relacionado apenas com o 'como' ela surge na sua vida.

Da mesma forma com os sons. Mas o poder do som é maior que o poder das cores. Por que é que isso acontece? É porque o som surge das profundezas de nosso ser e porque o som pode também tocar as profundezas do nosso ser. O mantra-yoga dos hindus é baseado nesse princípio. O termo Sufi para isso é Dhikr (Zikar): que é o uso das palavras para o desvendamento da alma. Mas não é meramente para trazer algum resultado desejado que as palavras podem ser utilizadas no dhikr. As pessoas muitas vezes cometem o erro de usar a palavra sem qualquer idéia espiritual por trás dela, simplesmente para atingir algum poder mágico. Os Sufis de todos os tempos têm alertado contra esse erro, e têm constantemente ensinado que existe apenas um objeto pelo qual vale a pena se esforçar, o objeto essencial da vida, ou seja, Deus. É apenas quando a ciência das palavras está sendo usada para a realização da verdade, isto é, para a realização de Deus, que está sendo utilizada no modo correto. Usá-la para qualquer outra finalidade que seja, é como pagar por pérolas e levar pedras sem valor.

Embora não haja mal algum em aprender tudo que pudermos, não é bom dar vasão à superstição. Caso contrário, seria melhor realmente nunca ter conhecido essas coisas. O objetivo de todo o Sufi é chegar à verdade, e qualquer coisa que diga respeito a superstição deve ser evitada. O que é a cor afinal? É uma ilusão. O que é o número? É uma ilusão. O que são as formas? Elas também são ilusões. É interessante até certo ponto saber sobre essas coisas e distingui-las. Isso dá um certo conhecimento. Mas uma vez que são todas ilusões, como pode ser útil dar-se totalmente a elas negligenciando o desvendamento do Ser (Self), além de, ao mesmo tempo, negligenciar a busca pela verdade - que é o único objetivo da alma? Por conseguinte, a todos os outros conhecimentos e todas as outras coisas almejadas devem ser dados um lugar secundário. Nossa principal busca deve ser pela Verdade, acreditando assim como nós acreditamos, que na verdade está Deus.

quinta-feira, 26 de fevereiro de 2009

Hafiz (1315-1390) - Uma raiz em cada ato e criatura

Os olhos do sol estão pintando campos novamente.
Suas chicotadas com golpes precisos
são arrebatadoras através da terra.

Uma grande paleta de luz abraçou esta terra.

Hafiz, se apenas um pouco de argila e água
Misturados na tigela Dele
Pode produzir tais requintados aromas, vistas,
Músicas e formas rodopiantes,

Que maravilhas indizíveis devem aguardar com
O começo da revelação
Do infinito número de pétalas
Que é a alma.

Que emoção irá renovar o seu corpo
Quando todos começarmos a ver
Que o coração Dele reside em Tudo?

Deus tem uma raiz em cada ato e criatura
das quais Ele extrai sua misteriosa vida Divina.

Os olhos Dele estão pintando campos novamente.

O amado com Suas próprias mãos está cuidando,
Emergindo como uma criança preciosa,
Ele mesmo em você.

quarta-feira, 25 de fevereiro de 2009

Shri Samartha Ramdas Maharaj (1608-1681) - O Puro Brahman

1. Brahman é mais claro do que o céu sem nuvens, que parece vazio ao olharmos para ele. Tal como o céu, Brahman é sem forma, enorme, e ilimitado.
2. Vinte e um céus e sete mundos inferiores (Patalas) em conjunto estão contidos na esfera da criação. O ilimitado, puro Brahman permeia tudo isso.
3. Brahman é interminável acima e abaixo do universo. Não há nem um lugar, nem mesmo a mais pequena partícula, que não seja permeada por Ele.
4. Brahman permeia toda a água, a terra, a madeira, bem como todas as pedras, e nem mesmo um único ser está sem Ele.
5. Assim como a água está dentro e em torno dos animais aquáticos, da mesma forma, este puro Brahman está dentro e em torno de todos os seres vivos.
6. No entanto, esta comparação com a água não é totalmente adequada, pois há lugares secos que existem além da água, enquanto que não se pode nunca sair de Brahman.
7. Se tentarmos fugir do céu, não é possível, porque, basicamente, só céu é encontrado à nossa frente. Do mesmo modo, não há fim ao interminável Brahman.
8. Mas ainda que seja apenas Brahman que encontramos continuamente - Ele que é indissociável do corpo, e que é o que está mais próximo a todos - Ele também está oculto.
9. Existimos dentro Dele mas não O conhecemos. Imaginamos tê-Lo entendido, mas na verdade, Parabrahman, a Suprema Realidade, não pode ser entendido.
10. Quando nuvens são vistas no céu, parece que o céu está de alguma maneira manchado ou que algo tenha sido misturado a ele, mas isso é falso, o céu permanece claro e puro.
11. Se fixarmos nosso olhar no céu, minúsculos salpicos, como pequenas bolhas ou gotículas, são vistos pelos olhos. Do mesmo modo, as aparências visíveis são irreais para os "conhecedores" (Jnanis).
12. Embora sejam falsas, ainda são vistas como um sonho para alguém que está dormindo. Somente após tornarmos-nos despertos compreenderemos que não são verdadeiras.
13. Do mesmo modo, uma pessoa torna-se desperta com o auto-conhecimento na sua própria experiência, e assim começa a compreender a natureza da ilusão.
14. Agora chega dessa fala enigmática. Aquilo que está além do universo será agora demonstrado por meio de explicação e análise seletiva para que possa ser profundamente compreendido.
15. Brahman está misturado à criação inteira, está permeando todos os objetos e difundido em todas as partículas em existência.
16. Toda a criação aparece em Brahman, e Brahman está em tudo da criação. No entanto, a experiência desta aparição do mundo, este aspecto, é apenas uma pequena fração de Brahman.
17. Apenas uma pequena fração de Brahman está dentro da totalidade da criação. Quem pode conhecer seus limites fora da criação? Como pode o todo de Brahman estar contido dentro da criação?
18. É como tentar colocar o céu inteiro num pequeno pote; não é possível. Por isso, dizemos que o pote contém uma fração pequena do céu.
19. Brahman está misturado a tudo, mas não é perturbado. Ele existe em tudo, mas ainda está além de tudo.
20. Brahman está misturado com os cinco elementos, mas também está além deles e não é limitado por eles; como o espaço que permeado por lama, ainda assim não é sujo por ela.
21. Nada pode ser comparado à Brahman, ainda assim, afim de compreender, a parábola do céu é dada e alguns meios para sua explicação são requeridos.
22. Os Upanishads e outros textos antigos dizem que Brahman é como o céu, então, de modo a manter em conformidade com os textos, a parábola do céu é usada para Brahman.
23. Na ausência de ouro, o latão é dourado apenas na cor. Do mesmo modo, na ausência do atributo de vazio, o céu seria puro Brahman incorruptível.
24. Brahman é como o céu, e a Ilusão é como o vento que pode ser sentido, mas não pode ser visto.
25. A criação que é constituída de palavras aparece e dissolve-se de momento a momento. Como o vento, ela não pode ficar parada.
26. A ilusão é falsa assim, deixe-a ser como ela é. O eterno Brahman é um, mesmo assim, ainda é visto permeando todas as coisas.
27. Brahman existe penetrando a terra, mas não é duro como a Terra. Ao mesmo tempo, nenhuma alegoria pode ser usada para a sua suavidade e sutileza.
28. Entenda que a água é mais suave do que a terra, o fogo é mais suave que a água, e o vento é mais suave do que fogo.
29. Entenda, que o céu, ou o espaço, é muito mais suave e mais sutil do que o vento, e que a plenitude de Brahman é mais sutil do que o céu.
30. Brahman penetrou a mais dura das armas, e ainda assim não perdeu a sua sutileza. Não é nem duro nem mole. Não existe alegoria precisa para Ele.
31. Brahman permeia a Terra, mas a terra é destrutível e Brahman não é. Brahman está na água, mas a água seca, enquanto Brahman não seca.
32. Brahman está no fogo, mas não pode ser queimado. Brahman está no vento, mas Ele não se move. Ele está no céu, mas, o céu é conhecido, enquanto que a Suprema Realidade, Parabrahman, não pode ser conhecida.
33. Ele está ocupando todo o corpo, mas não pode ser encontrado. Está ao mesmo tempo muito próximo de nós e ainda assim muito longe. Como isso é incrível!
34. Ele está na nossa frente e por todos os lados, e tudo o que é visto ocorre nele. Ele é "Auto-evidente" e "Auto-estabelecido."
35. Nosso ser está nele somente, e é apenas Ele quem está dentro e em torno de nós mesmos. Se tivéssemos que compará-Lo com algo, poderíamos dizer que ele é como o céu sem nada "mais" apareça nele.
36. Não é sentido como sendo algo, mas ainda assim está preenchendo todas as coisas. É como uma grande riqueza que pertença à própria pessoa e ainda assim não pode ser vista.
37. Ele é anterior a qualquer objeto que seja visto. É preciso resolver esse mistério com a própria experiência.
38. O espaço está dentro, ao redor, e contém todos os objetos. Ainda assim permanece o mesmo, mesmo sem a presença dos objetos. Com ou sem a presença da terra, o espaço continua a ser o mesmo.
39. O que quer que tenha nome e forma é Ilusão e inexistente. O segredo além do nome e forma é conhecido apenas pelos iniciados.
40. Tal como uma enorme nuvem de fumaça subindo para o céu tem a aparência de montanhas, de forma semelhante, a Deusa da Ilusão (Maya) mostra o seu truque que se parece com a criação do universo.
41. Entenda que a Ilusão é impermanente e Brahman é eterno e espalha-se por toda parte em todos os momentos.
42. Ao ler este texto espiritual, Brahman é as letras e as palavras, a visão delas, bem como a presença sutil que está nos olhos que estão vendo.
43. Aquele que ouve as palavras quando escutamos, aquele que é a mente que vê os pensamentos e que permeia a mente por completo, é a Suprema Realidade apenas, o Parabrahman propriamente dito.
44. Os pés que estão caminhando, o percurso que está sendo percorrido, tudo o que for encontrado pelo corpo, e tudo o que for pego com as mãos ao longo do caminho é apenas Brahman.
45. Deixe que seja assim. Tudo existe em Brahman apenas. A compreensão desse fato em si é o que destrói o desejo pelos objetos dos órgãos dos sentidos.
46. Brahman é o que está mais próximo de nós. Se tentarmos vê-Lo, não poderá ser visto, no entanto, ele existe mesmo que não seja visto.
47. Brahman só pode ser entendido pela experiência. É apenas a ausência de aparência do visível que leva a essa "auto-experiência"(experiência do Ser), que é a realização de Brahman.
48. A visão correta deve ser com os olhos do conhecimento e não com os olhos físicos. O reconhecimento dessa visão interior "correta", é a testemunha da própria visão interior.
49. Entenda que aquele que conhece tanto Brahman quanto a Ilusão é aquele que tem a experiência de ser a "Testemunha de Tudo", que é chamado de o "quarto estado", ou Turya. (Os três primeiros são os estados desperto, de sonho, e de sono profundo)
50. Testemunhar é a causa instrumental das atitudes da mente, ou o foco de atenção. Entenda que a ausência das atitudes da mente é "não-mente", onde até mesmo a própria consciência de si mesmo como um indivíduo é dissolvida. Isso é chamado de "Conhecimento espiritual", ou Vidynana.
51. Onde a Ignorância (Avidya) desapareceu e o Conhecimento (Dynana; Jnana) não permanece, e até mesmo o maior Conhecimento Espiritual (Vidynana) é dissolvido - isso é Parabrahman, a Suprema Realidade.
52. Dessa maneira, Brahman é eterno onde toda a imaginação termina. Entenda que essa é a "Solidão Feliz" dos Yogis.

sábado, 21 de fevereiro de 2009

Bernard de Clairvaux (São Bernardo séc - XII) - A Busca

"Durante toda a noite em meu leito procurei Aquele a quem ama a minha alma". (Cânt. cânt.3: 1) É um grande bem buscar a Deus, penso que nada vem antes disso dentre as boas coisas que a alma possa apreciar. É o primeiro de seus dons e seu objetivo final. Nenhuma das virtudes se aproxima dessa, e ela não dá lugar a nenhuma delas. O que poderia ser melhor, quando nada tem lugar mais alto? A quê poderia dar lugar, quando ela é a consumação de todas as coisas? Que virtude pode ser atribuída a quem não busca o bem? Que limite existe para quem procura por Ele? Diz o salmo 105:4. Penso que, mesmo depois de tê-Lo encontrado, a alma não deixará de procurá-Lo. Deus não é procurado à pé, mas sim pelo desejo. E a feliz descoberta da alegria não coloca fim no desejo, mas aumenta-o. A consumação da alegria não consome o desejo, consome? Pelo contrário, é óleo derramado sobre chamas que ateia fogo em si mesmo. Assim é. A alegria se satisfará. Mas não haverá um fim para o desejo e assim não há fim para a procura. Considere, se você quiser, a ausência de Deus como sendo a causa dessa ânsia de procurar por Ele; como Ele está sempre presente e a ansiedade na busca não pode falhar em encontrar Sua abundância.

quinta-feira, 19 de fevereiro de 2009

FIHI MA FIHI - Jalaluddin Rumi (séc. XIII) - Discursos

As pessoas que estão interessadas em seus estudos acadêmicos pensam que, se fielmente frequentarem nossas reuniões, irão esquecer e perder tudo o que aprenderam. Pelo contrário, quando elas vêm aqui suas ciências adquirem alma. Pois todas as ciências, quando adquirem alma, são como um corpo vazio que vem à vida. O coração do conhecimento se origina além deste mundo das letras e da linguagem. Ele chega até nós daquele mundo onde a fala é sem som ou sinal.

"E a Moisés, Deus falava diretamente".

Bem, Deus não fala com letras e sons, garganta e língua. Letras requerem garganta e lábios para serem ouvidas. Deus é exaltado muito acima dos lábios, boca e garganta. Então os profetas naquele mundo falam com Deus de uma forma que a inteligência parcial não pode compreender ou imaginar. No entanto, os profetas descem daquele mundo sem letras para esse mundo das letras do alfabeto e tornam-se crianças em prol destas crianças. Desse modo, Maomé disse, "fui enviado como um professor."
Embora as massas de pessoas neste mundo não chegam aos estados espirituais dos profetas, ainda assim este mundo deriva sua força dos santos e cresce e encontra conforto neles. Da mesma forma, um recém nascido, não conhecendo ou reconhecendo a sua mãe em detalhes, ainda assim encontra conforto e força nela; assim como o fruto é nutrido pelo galho, tornando-se doce e maduro sem que nada saiba sobre a árvore. Assim, os grandes santos, com suas letras e fala, ainda que as massas não os conheçam, elas ganham força dos santos e são por eles nutridas. Fixado dentro das almas existe (além da razão, da letra e do som), um macrocosmo. Porém, veja quantos procuraram aqueles gurus dementes que fazem revoltantes alegações. As pessoas pensam, "o que esses gurus dizem pode ser verdade. Essas coisas podem até existir, mesmo que eles estejam errados no presente caso. Nem tudo pode ser conhecido pela razão e pela lógica”. Mas isso não significa que tudo fora de razão e lógica é verdadeiro. "Toda noz é redonda, mas nem tudo que é redondo é uma noz", é um sinal disso. Embora um santo tenha um estado que não pode ser expressado através de palavras e escrita, ainda assim na presença dos santos a razão cresce e evolui.

quarta-feira, 18 de fevereiro de 2009

Meher Baba - O silêncio . . .

Na verdade, tudo na criação evolutiva é forjado exclusivamente pelo Poder Infinito de Deus, que trabalha em eterno silêncio - como que por trás da tela, desconhecido, não sentido ou mesmo insuspeitado pela maioria daqueles que estão atuando no flash de luz do palco. Alguns, através da graça do mestre, ou da graça de Deus, conseguem libertar de dentro do seu próprio ser a fonte escondida do amor divino, que revela a plena e certa compreensão da Infinita Divindade, que, em sua eternidade, engloba não só o passado aparentemente sem começo e o aparentemente transitório presente, mas também o aparentemente interminável futuro.
O aspecto aparentemente infinito da extensão do tempo, é, em última análise, irreal, da mesma maneira que o próprio tempo, em última análise, é irreal. Na compreensão espiritual definitiva (que facilita a Realização consciente da verdade absoluta), a infinitude ilusória do processo do tempo é confrontada na verdadeira eternidade da vida e do ser de Deus. O Deus-homem, que conscientemente se estabeleceu na compreensão ilimitada de Deus, pode conhecer o passado, o presente e o futuro. Mas para ele, esse conhecimento das sombras fugazes da Eternidade é muito menos importante do que completar a fusão no aspecto incompreensível de Deus, na Compreensão infinita, Verdade infinita ou Realidade.
De fato, todos sem exceção tem a sua verdadeira existência somente nesse, e como esse Ser de Deus ilimitado como verdade absoluta. Mas é como ter algum tesouro escondido que, embora esteja em nossa posse, é de benefício inexistente enquanto permanecer desconhecido. O único propósito da criação evolutiva é colocar a alma na posse consciente assim como na apreciação deste tesouro infinito. Naqueles que são Perfeitos, Deus trabalha para este fim conscientemente. Mas é Ele apenas que trabalha através de tudo e de todos, e, embora este trabalho seja essencialmente inconsciente, também leva ao mesmo fim.
Isso pode ser esclarecido usando-se a analogia da respiração. Respirar é o próprio fundamento da vida e a ausência da respiração significa abandonar o corpo físico (sem encerrar a existência da alma). Mas essa respiração é em sua maior parte desempenhada inconscientemente e nos tornamos conscientes dela só em casos de esforço excepcional. Da mesma maneira, o trabalho de Deus através dos processos evolutivos é na sua maior parte inconsciente e silencioso, e o cessar desse trabalho traz o final (pralaya) da criação (sem encerrar a existência do próprio Deus). Deus torna-se consciente de seu trabalho apenas em casos raros, dos Deuses-Homens que possuem e desfrutam Divindade na Vida Eterna.
Por eras e mais eras, Deus tem trabalhado em silêncio, não observado e despercebido, exceto por aqueles que experimentam Seu Silêncio infinito.

Ramakrishna - Março de 1885


Pergunta: Narendra diz que Deus é infinito; não podemos sequer dizer que as coisas ou as pessoas que percebemos são partes de Deus. Como pode o Infinito ter partes? Não pode.
Ramakrishna: Mesmo sendo Deus grande e infinito, sua essência pode manifestar-se e o faz através do homem, por Sua mera vontade. A Encarnação de Deus, como homem, não pode ser explicada por analogia. Deve-se sentir por si mesmo e dar-se conta por percepção direta. Uma analogia pode nos dar apenas um pequeno vislumbre. É certo que quando tocamos os chifres, as patas ou a cauda de uma vaca, tocamos a própria vaca, mas para nós a coisa essencial de uma vaca é o seu leite, que corre a partir do seu úbere. A Encarnação Divina é o úbere. Deus se encarna como homem de tempos em tempos para ensinar às pessoas devoção e amor divino.
Quem pode compreender tudo sobre Deus? Não é dado ao homem conhecer nenhum aspecto de Deus, grande ou pequeno. E que necessidade há em saber tudo sobre Deus? É suficiente se só o alcançarmos. E vemos Deus propriamente, apenas quando vemos Sua Encarnação. Suponha que uma pessoa vá ao Ganges e toque suas águas. Ela dirá: 'Sim, eu vi e toquei o Ganges.' Para dizer isso não é necessário que ela toque o rio em toda sua extensão, de Hardwar até Gangaságar.
Pergunta: Narendra disse:"É possível, eventualmente, conhecer tudo de Deus? Ele é infinito".
Ramakrishna: Se eu tocasse seus pés, seguramente seria o mesmo que tocar em você. Se uma pessoa vai ao oceano e toca, mesmo que num ponto da água, não há dúvida de que ela tocou o mesmo oceano. O fogo como elemento, existe em todas as coisas, mas está manifestado num maior grau na madeira.
Pergunta: Estou procurando o fogo. Claro que quero ir a um lugar onde possa consegui-lo.
Ramakrishna: Sim, o elemento fogo está presente na madeira mais do que em qualquer outro objeto. Se você estiver procurando por Deus, então busque-o no homem, Ele se manifesta mais no homem do que em qualquer outra coisa. Se você ver um homem de amor extático, embriagado por Prema, louco por Deus, intoxicado com o Seu amor, então pode estar certo de que Deus se tornou encarnado neste homem.
Não há dúvida de que Deus existe em todas as coisas mas as manifestações de Seu poder são diferentes nos diferentes seres. A maior manifestação de Seu poder é por meio de uma encarnação. Além disso, em algumas encarnações há uma manifestação Plena do Poder de Deus. É Shakti, o poder de Deus, que nasce como uma encarnação.
Pergunta: Narendra diz que Deus está além do nosso pensamento e discurso.
Ramakrishna: Isso não está completamente certo. Ele é certamente impossível de ser conhecido por esta mente comum, mas pode sim, ser conhecido pela mente pura. A mente e o intelecto tornam-se puros quando são libertados de seu apego a "mulher e ouro". A mente pura e o intelecto puro são a mesma coisa. Deus é conhecido pela mente pura. Será que os sábios e profetas do passado não viram Deus? Eles alcançaram a consciência que permeia tudo, através da sua consciência interior.

terça-feira, 17 de fevereiro de 2009

Bhagavan Sri Ramana Maharshi - 7 de janeiro de 1935

Devoto: É necessário um mestre para a realização?
Maharshi: A realização é o resultado da graça do mestre, mais do que os ensinamentos, que os discursos, que a meditação, etc. Essas são apenas ajudas secundárias, enquanto que a graça do mestre é a causa principal e essencial.
D.: Quais são os obstáculos que impedem a realização do ‘Ser’ (Self)?
M.: São os hábitos da mente (Vasanas).
D.: Como vencer os hábitos mentais (Vasanas)?
M.: Realizando o ‘Ser’.
D.: Isso é um círculo vicioso.
M.: É o ego que levanta tais dificuldades, criando obstáculos e depois sofre a perplexidade dos aparentes paradoxos. Encontre quem faz as perguntas e o ‘Ser’ será encontrado.
D.: Quais são os auxílios para a realização?
M.: Os ensinamentos das Escrituras e das almas realizadas.
D.: Podem esses ensinamentos ser debates, discussões e meditações?
M.: Sim, todos esses são apenas auxílios secundários, o essencial é a graça do Mestre.
D.: Quanto tempo leva para se obter isso?
M.: Por que você deseja saber?
D.: Para me dar esperança.
M.: Mesmo tal desejo é um obstáculo. O ‘Ser’ está sempre aqui, não há nada sem ele. Seja o ‘Ser’, e os anseios e as dúvidas desaparecerão. Esse ‘Ser’ é o presenciador nos estados de sono profundo, do sono com sonhos e do estado de vigília. Esses estados pertencem ao ego. O ‘Ser' transcende até mesmo o ego. Você não existia no sono profundo? Naquele estado você sabia que estava dormindo ou que não estava ciente do mundo? É apenas no estado desperto que você descreve a experiência do sono profundo como inconsciência, portanto, a consciência quando você está dormindo é a mesma que quando você está acordado. Se você conhece o que é essa consciência desperta, conhecerá a consciência que presencia os três estados. Essa consciência pode ser encontrada buscando a consciência como ela era no sono profundo.
D.: Nesse caso, eu adormeço.
M.: Não há mal nisso!
D.: É um vazio.
M.: Para quem é o vazio? Descubra. Você não pode negar a si mesmo nunca. O ‘Ser’ está sempre ali e continua em todos os estados.
D.: Devo permanecer como se estivesse no sono profundo e ser vigilante ao mesmo tempo?
M.: Sim. A vigilância é o estado desperto. Portanto, o estado não será de sono, mas de sono sem sono. Se você seguir os passos de seus pensamentos, será extraviado por eles e se encontrará num labirinto sem fim.
D.: Então, devo retornar traçando a origem dos pensamentos.
M.: Exatamente, dessa maneira os pensamentos vão desaparecer e só o ‘Ser’ permanecerá. Na verdade, para o ‘Ser’ não existe nem dentro e nem fora. São projeções do ego também. O ‘Ser’ é puro e absoluto.
D.: Isso se entende apenas intelectualmente. O intelecto não é uma ajuda para a realização?
M.: Sim, até uma determinada fase. Porém, ainda assim, compreenda que o ‘Ser’ transcende o intelecto; o intelecto deve desaparecer para se obter o ‘Ser’.
D.: A minha realização ajuda aos outros?
M.: Sim, certamente. É a melhor ajuda possível. Mas não existe ninguém para ajudar. Pois um ser realizado vê o ‘Ser’ da mesma forma que um ourives aprecia o ouro em diferentes jóias. Apenas enquanto você se identifica com o corpo, as formas e as figuras estão aqui. Porém, quando você transcende seu corpo, os outros desaparecem juntamente com sua consciência do corpo.
D.: Isso também acontece com as plantas, árvores, etc.?
M.: Podem eles existir separados do ‘Ser’? Descubra. Você acha que os vê. O pensamento é projetado a partir do seu ‘Ser’. Descubra de onde eles surgem. Os pensamentos deixarão de surgir e apenas o ‘Ser’ sobrará.
D.: Eu entendo teoricamente. Mas os objetos ainda estão aqui.
M.: Sim. É como um filme no cinema. Há a luz na tela e as sombras que passam rapidamente impressionam a audiência, na forma de uma atuação de alguma peça. Similarmente, será também assim se na mesma representação o público também for mostrado. Aquele que vê e aquilo que é visto estarão então apenas na tela. Aplique isso a você mesmo. Você é a tela, o ‘Ser’ criou o ego, o ego acrescenta os pensamentos que se mostram como o mundo, as árvores, as plantas, etc., sobre os quais você está perguntando. Na realidade, tudo isso não é nada além do ‘Ser’. Se você ver o ‘Ser’, perceberá que ele é tudo em toda a parte e sempre. Nada além do ‘Ser’ existe.
D.: Sim, mas compreendo apenas teoricamente. No entanto, as respostas são simples, bonitas e convincentes.
M.: Mesmo o pensamento, “eu não entendo" é um obstáculo. Na verdade, apenas o ‘Ser’, É.

Kabir (poeta místico e santo indiano - séc.XV) - A luz do sol, da lua e das estrelas brilha claro

A luz do sol, da lua e das estrelas brilha claro:
A melodia de amor se expande, o ritmo do desapego do amor vence o tempo.
Dia e noite, o coro da música enche os céus, e Kabir diz
"Meu amado brilha como o relâmpago no céu."

Você sabe como os momentos realizam sua adoração?
Ondulando sua fileira de lâmpadas, o universo canta em adoração dia e noite,
Existe a bandeira escondida e a abóboda secreta:
Lá é ouvido o som dos sinos invisíveis.
Kabir diz: "Lá a adoração nunca cessa, lá o Senhor do Universo

está sentado em Seu trono."
O mundo todo realiza seus trabalhos e comete seus erros, mas poucos são os amantes que conhecem o Amado.
O buscador devotado é aquele que mescla em seu coração as correntes duplas do amor e do desapego, como a mistura dos fluxos do Ganges e do Jumna;
Em seu coração a água sagrada flui dia e noite, e assim o ciclo de nascimentos e mortes é levado a um fim.


Vê que descanso maravilhoso está no Espírito Supremo! E aprecia esse descanso aquele que se adequar a ele.
Sustentado pelas cordas do amor, o balanço do Oceano da Alegria oscila para lá e para cá e um poderoso som irrompe
em canção.
que um lótus lá floresce sem água! e Kabir diz
"A abelha do meu coração bebe seu néctar."
Que lótus maravilhoso é esse, que floresce no coração da roda de fiar do universo! Apenas poucas almas puras sabem do seu verdadeiro deleite.
Música está toda ao seu redor, e lá o coração participa da alegria do mar infinito.
Kabir diz: "Mergulha dentro desse oceano de doçura: assim deixa todos os erros da vida e da morte fugirem para longe."



Vê como a sede dos cinco sentidos é saciada lá! E as

três formas da miséria não existem mais!
Kabir diz: "Esse é o esporte Daquele inatingível: olha para dentro e contempla como os raios do luar Daquele que está oculto brilham em ti."
Ali se insere a batida rítmica da vida e da morte:
O arrebatamento nasce adiante, e todo espaço está radiante com a luz.
Lá a Música inatingível é soada, é a música do amor dos três mundos.
Lá milhões de luzes de sol e de lua estão queimando;
Lá bate o tambor, e o amante balança brincando.
Lá ressoam as canções de amor e a luz chove em cântaros e o

Adorador está encantado no sabor do néctar celestial.
Olha para a vida e para a morte: não há separação entre elas,
A mão direita e a esquerda são uma e a mesma mão.
Kabir diz: "Lá o homem sábio é mudo; pois esta verdade

nunca poderá ser encontrada nos Vedas ou em livros."


Tenho tido meu lugar naquele que é Auto-equilibrado,
Tenho bebido da taça do Indizível,
Eu encontrei a chave do mistério,
Alcancei a raiz da União.
Viajando por trilha nenhuma, vim para a Terra onde não existe pesares: muito facilmente a misericórdia do grande Senhor caiu sobre mim.
Eles têm cantado sobre Ele como infinito e inatingível, mas em minhas

meditações eu O vi sem a visão.
Essa é, de fato, a terra sem pesares, e ninguém sabe o caminho que conduz até lá:
Apenas aquele que está nesse caminho certamente transcendeu todos os pesares.
Maravilhosa é aquela terra de descanso, a qual mérito nenhum pode ganhar;
É o sábio que a viu, é o sábio que a tem cantado.
Esta é a palavra final: mas é possível alguém expressar seu sabor maravilhoso?
Aquele que a saboreou uma vez, aquele que sabe que alegria ela pode dar.
Kabir diz: "Sabendo disso, o homem ignorante torna-se sábio e o homem sábio torna-se mudo ficando em silêncio,
O adorador fica totalmente inebriado,
Sua sabedoria e seu desapego são tornados perfeitos;
Ele bebe da taça das inspirações e expirações do amor.”

Lá todo o céu está preenchido com som e lá a música é feita

sem dedos e sem cordas;
Lá o jogo de prazer e dor não cessa.
Kabir diz: "Se você submergir sua vida no oceano da vida, você encontrará sua vida estando na Terra Suprema do contentamento".

Que frenesi de êxtase existe em todas as horas! E o adorador está

Espremendo e bebendo a essência das horas: ele vive na vida de Brahma.
Falo a verdade, pois aceitei a verdade na vida, estou agora apegado

à verdade, varri para longe tudo de falso valor.
Kabir diz: "Assim o adorador é libertado do medo, assim, todos os erros da vida e da morte o abandonaram."

Lá o céu está preenchido de música:
Lá chove néctar:
Lá as cordas da harpa soam, e lá os tambores rufam.
Que esplendor secreto está ali, na mansão do céus!
Lá nenhuma menção é feita sobre o nascer e o pôr do sol;
No oceano da manifestação, que é a luz do amor, o dia e a noite

São sentidos como sendo um.
Alegria para sempre, sem tristeza - sem luta!
Lá eu vi alegria cheia até a borda, a perfeição da alegria;
Nenhum espaço para erro existe lá.
Kabir diz: "Lá eu testemunhei o esporte do deleite uno!"

Conheci em meu corpo o esporte do universo: Escapei do erro deste mundo.
O interno e o externo são tornados como um céu, o Infinito e

o finito são unidos: estou embriagado com a visão de tudo isto!
Esta Luz de Ti preenche o Universo: a lâmpada do amor que arde sobre a bandeja do conhecimento.
Kabir diz: "Lá o erro não pode entrar e o conflito da vida e da morte não é mais sentido."

sexta-feira, 13 de fevereiro de 2009

Phiokalia - São Gregório do Sinai (séc. XIII)

Os Discursos são proferidos a todos os seres sencientes para serem usados, e assim como o valor derivado de diferentes tipos de alimentos varia, o mesmo acontece com o lucro do discurso à alma e à satisfação dele derivada. A palavra de um ensinamento atua como um professor que molda a disposição da alma e as palavras derivadas da leitura são como 'águas tranquilas', que alimentam-na; a palavra que vem da prática é como as "verdes pastagens"(salmo 23-2,5), tornando-a mais fértil; a palavra da graça é como uma taça que transbordou matando a sede da alma e tornando-a feliz e a alegria indescritível da graça é como "fazer o rosto brilhar com o óleo"(salmo 104-15), que alegra o coração e preenche-o de luz.

Na verdade, a alma não só contém-no em si mesma como a própria vida, mas quando ela escuta este tipo de ensinamento de outros, entende imediatamente, uma vez que ambos são guiados pelo amor e pela fé - quando um escuta com fé e o outro ensina com amor, falando das virtudes, sem arrogância ou vaidade. Então, a alma aceita a palavra do ensinamento como um professor, a palavra da leitura como um nutridor, a palavra derivada da prática (a palavra mais íntima), como o mais belo adorno da noiva, a palavra iluminadora do Espírito como a palavra do noivo, unindo-se à noiva e fazendo-a feliz. Cada palavra, proveniente dos lábios de Deus, ou é uma palavra da boca dos santos tornada ativa pelo Espírito, ou a mais deleitável inspiração do Espírito que não todos, mas apenas alguns, são dados a desfrutar. Pois, embora todos os seres inteligentes desfrutem das palavras, há muito poucos neste mundo que se alegram com as palavras do Espírito. A maior parte sabe apenas pela memória as diversas formas de palavras espirituais; eles só podem participar das mesmas dessa forma, uma vez que não podem ainda apreender diretamente a Palavra de Deus, aquele verdadeiro pão da vida por vir. Pois, apenas lá esse pão é oferecido em abundância para aqueles que são dignos de todo o tipo de apreciamento, pois nunca é consumido, gasto e nem roubado.

Se um homem não tem sensibilidade espiritual, seus sentidos não podem saborear a doçura das coisas divinas. Pois, assim como um homem cujos sentidos estão apagados não pode perceber as coisas sensoriais, não vê, não escuta, não sente cheiro, sendo bastante fraco ou semi-morto; um homem, que através de paixões tem mortificado os poderes naturais de sua alma, torna-os insensíveis para a ação dos, e a comunhão com, os mistérios do Espírito. Pois aquele que é espiritualmente cego, surdo e insensível, está morto no Espírito, uma vez que Cristo não habita nele e ele próprio não age e se desloca em Cristo.

Igualmente aos poderes da alma, esses sentidos têm uma semelhante, se não idêntica ação, especialmente quando são saudáveis. Então os sentidos vêem as coisas sensoriais claramente, ao passo que os poderes da alma discernem coisas mentais, especialmente quando eles estão livres das investidas de Satanás, o qual declara guerra contra a lei mental e espiritual. Mas quando eles são transformados em um pelo Espírito, e têm apenas uma perspectiva, então sabem direta e essencialmente o que é divino e o que é humano, claramente discernindo a sua natureza e seu significado, e vêem, tão claro quanto possível, a única causa de tudo - a Trindade.

Sri Nisargadatta Maharaj - "I-am-ness" ...

Estou te perguntando: sem o corpo, como passar o tempo? Para um sábio, é esse princípio que é anterior ao corpo, atemporal. Como ele passou o tempo quando o corpo não estava lá? Isto é, quando a consciência não estava lá, quantos anos se passaram sem o conhecimento da existência? É um estado atemporal. Apenas quando você testemunha, existe o tempo. O tempo e a consciência aparecem juntos. Sem consciência não existe tempo. E não existe consciência antes do corpo.
Para a paz eterna você deve residir no seu próprio Ser. Conheça como esse toque de 'eu sou' apareceu. Todos os outros conhecimentos são inúteis.
Eu estou tentando dizer: abandone todo esse lixo, o que quer que esteja estudando em nome da religião, em nome da espiritualidade. Entenda apenas uma coisa: Aquele princípio divino está lá – aquele 'sentido de que eu sou” (I-am-ness) ou consciência – esse é o mais divino de todos os princípios. Ele está lá enquanto a respiração vital está lá. A respiração vital tem cinco aspectos e é chamada panchaprana. É a força motriz de todas as atividades. Quando a força vital de cinco aspectos está lá, então, apenas assim, essa qualidade do sentido de ser (beingness) está lá, que é chamada Guna. Esse sentido de ser (beingness) no momento é sua natureza – você é isso apenas. Portanto, adore esse princípio. Essa qualidade, esse toque de 'eu-sou-ência' (I-am-ness) ou consciência, é algo como a doçura da cana de açúcar.
A cana de açúcar está lá, o caldo está lá, e a doçura é o final. Similarmente neste caso, a coisa final, é aquela qualidade, aquele toque de sentido de ser – aquele é o princípio Ishwara (Deus). Você é isso, resida ali e adore isso apenas. Então, apenas assim você irá alcançar e residir na paz eterna e não ao discutir nenhum outro preceito relacionado à espiritualidade.
Uma pessoa teve um bebê, o bebê foi entregue para a mãe. Infelizmente, a força vital havia abandonado o corpo, a criança estava morta e o corpo foi levado. A pergunta agora é: o que exatamente abandonou o corpo? A respiração vital. Mas suponha que a respiração vital estivesse lá; então o toque do sentido de 'eu sou' (I-am-ness) teria estado presente na criança; e aquela consciência teria estado lá. Os pais teriam acariciado aquele corpo, um bebê vivo. Mas como a respiração vital tinha ido, aquela vida se foi, o sentido de ser (Beingness) não estava mais lá. Portanto era só um corpo morto.
Onde há respiração vital, o conhecimento 'eu sou' está presente. Não havendo a respiração vital, o conhecimento do 'sentido de eu-sou' (I am ness) está ausente. Tome vantagem total deste capital naturalmente disponível a você, isto é, a sua força da vida e o conhecimento 'eu sou'; eles sempre vão de mãos dadas. Agora mesmo, explore isso no seu máximo. Todas as atividades do mundo estão acontecendo apenas por causa do conhecimento 'eu sou' junto com a força motriz, que é a força da vida, a respiração vital (prana). E isso não é algo separado de você; você é isso apenas. Investigue e estude isso apenas.
Praneshwar significa “o Deus da respiração vital”. Agora, esta respiração ou força da vida e o conhecimento, a qualidade do sentido de ser (beingness) – ambos são eu mesmo. Afortunadamente, você tem ambos os aspectos juntos dentro de você. Você é isso apenas. Investigue e estude isso apenas.

terça-feira, 10 de fevereiro de 2009

Shri Siddharameshwar Maharaj - O sonho dentro do sonho

O Ser (Atman), que é sem nascimento e sem morte, dormiu; e em seu sonho, ele teve um sonho. Que tipo de sonho era esse? A aparição do mundo foi o sonho, e nesse sonho, ele sonhou que se tornou um indivíduo (Jiva). Então, a ilusão só aumentou. A aparência desta vida como sendo real, é um sonho. Aquele que era Deus, se tornou um servo. Conceber como reais todas as pessoas, como a mãe, o pai, o irmão, os outros e o mundo todo, é o sonho. Todos os seres do mundo estão se revelando neste sonho. É muito raro e muito importante que uma dentre todas as pessoas deva pensar bastante à frente.
Ter confiança em um santo é uma coisa muito rara. Um aspirante assim, age de uma forma não egoísta. Aquele que está cheio de ego não vai nem mesmo jogar um pedaço de pão para um cachorro. Depois de realizar alguma caridade com a ausência do ego, há muitas vezes a experiência de altruísmo ou de pura inteligência que surge. É uma grande coisa sentir respeito pelo Santos. Grande é o fruto das bênçãos de nossos antepassados, os Santos que vieram antes.
Discernimento (Viveka) entre o essencial e o não essencial durante esta vida-sonho é raro.
A riqueza é uma espécie de narcótico como o vinho.
Por causa dos méritos do último nascimento, a pessoa volta-se para o Guru, e fica curiosa a seu respeito. É ela que pode verdadeiramente utilizar o poder de discernimento. Essa pessoa vai até o guru e pensa sobre o que é essencial e o que não é essencial, e chega ao entendimento de que, "eu sou Brahman". Só então ela pode perceber que o mundo é ilusão, e se tornar desperta daquele sonho. Ela experimenta a pura essência do Ensinamento, e entende que o mundo todo é uma ilusão, e que "O Ser Supremo (Paramatman) é a única verdade." Torna-se então aquela "Existência, Consciência e Graça(SatChitAnanda) encarnadas", tornando-se um com Brahman.
Quando você vem a conhecer o significado, e, quando pensa sobre isso, dizendo "Agora, eu tive a experiência, e, agora estou acordado." Quem é esse ‘eu’ que adquiriu a experiência? Quando você diz que você experimentou alguma coisa, existe o ego ou o "eu sou" (Aham). A coisa que diz "eu", ou "Você" não é nada.

Você diz que sabe, mas isso é apenas ego. É engano na ilusão. Por exemplo, você pode pensar que, "ele é", ou "você é" a mesma entidade antiga a quem as pessoas chamavam de Sr. Smith, mas agora "Sr. Smith" tornou-se Brahman. Se você decidir que o antigo Sr. Smith era só ilusão e que aquela "não-entidade" agora se tornou realidade, então a sua ilusão ainda não foi dissipada. O que é naturalmente o seu Ser, é a realidade como ela é. Não existe "eu" ali, mesmo na forma mais sutil. Enquanto for sentido mesmo que no mínimo, que há qualquer necessidade de proteger o corpo, o "eu" não desapareceu. Deveria haver o próprio sentimento efetivo, a experiência, que o universo inteiro está dentro de você. Este é o entendimento de que "Tudo é Ele", e "Eu sou Ele".

O bicho da seda constrói a sua própria casa, um casulo, e depois morre nela. Você também está se atando similarmente. Você se considera ser o corpo físico. Isto em si é o cativeiro. Você tem se tornado como o casulo do bicho da seda. Água morna é derramada sobre o casulo, o bicho da seda é morto e, em seguida, a seda é colhida. Se você mantiver o sentimento que o universo inteiro, bem como o vento e o espaço que estão contidos dentro dele, é o seu corpo, então você automaticamente é Brahman. Existe apenas Brahman, que é apenas Um. Aquele que sabe que não há mais nada, é ele próprio Brahman. Aquele cujos anseios pelos objetos dos sentidos se foram, cujo sentido de "eu", como separado de tudo o resto se foi, e cujo orgulho se foi, é aquele que realmente realizou Brahman.

Shri Sadguru Upasni Maharaj - 'Sat-Chit-Ananda' (existência-consciência-graça)

Todos os objetos que são vistos no mundo, falando realmente, são não-existentes. Eles são transformações da própria mente da pessoa. Isso é o siddhanta. Quando podem os objetos do mundo não serem experimentados? Eles não serão experimentados apenas quando a própria mente da pessoa, que transforma a si mesma naqueles objetos, tornar-se não–existente. No caso da pessoa que atinge esse estado de não-mente, a mente não se transforma em objetos, para tal pessoa o mundo torna-se não-existente.
Se todas as pessoas do mundo atingissem esse estado, então o mundo todo se tornaria completamente não-existente. Todos então permaneceriam num estado de graça infinita e se fundiriam naquele Um sem forma. Eu mesmo estou neste estado. Quando estou neste estado, oposto àquele do mundo, eu me torno um e sigo apreciando aquela pura, singular e infinita graça. Experimento a mim mesmo como permeando tudo, formando tudo. Quando nenhum objeto é visto, então em frente aos olhos outra escuridão é experimentada.
É essa escuridão que traz à tona toda a criação. Essa escuridão que foi chamada de Adi Maya, Adi Shakti, ou o Prakriti primordial.
Quando a mente se torna completamente estável então o mundo não é visto; todos os pensamentos sobre qualquer coisa no mundo e do mundo automaticamente cessam.
Naturalmente o prazer e a dor provenientes das coisas do mundo, e consequentemente o corpo que os sofre, tornam-se não-existentes. Isso significa que a causa raiz de tudo isso se funde no próprio ser da pessoa, e com isso o que permanece é o Ser apenas, nosso Ser sem nenhuma forma ou sentimento.
É para experimentar nosso próprio estado real que temos de nos evoluir na forma do mundo e experimentar o mundo. E, portanto, torna-se essencial experimentar o mundo primeiro e depois experimentar nosso próprio estado real. Nosso Ser original não tinha nenhuma experiência de nós mesmos, mesmo sendo Sat-chit-ananda (existência-consciência-graça). Nós mesmos somos auto-iluminados e nossa natureza real é de infinita graça sem limites. E é isso que experimentamos, é isso o que nos tornamos.
No sono profundo o mundo todo submerge no próprio Ser, e ao acordar podemos novamente ver nosso corpo e o mundo. O estado de graça sem fim lembra o sono profundo, mas difere em um ponto; durante o sono profundo o homem não está consciente de nada, enquanto que nesse estado ele está consciente daquela graça infinita.
Estou explicando para vocês o que estou realmente experimentando. Aqueles que estão qualificados ao escutarem esse discurso irão se beneficiar. Eles experimentarão que suas mentes estão sendo purificadas gradualmente, permitindo assim que se qualifiquem para aquela graça infinita.

segunda-feira, 9 de fevereiro de 2009

Shankara (Santo Indiano - séc. IX) - Aparokshanubhuti (Realização do Ser)

*Assim como não é possível que um objeto seja visto sem o auxílio da luz (embora tenhamos outros auxílios), para chegar ao conhecimento não nos serve nenhum método além do discernimento.

*Quem sou eu? Como foi criado este mundo? Quem foi o Criador? De que matéria é feito o mundo? - Esse é o caminho para analisar.

*Eu não sou o corpo, nem a combinação dos cinco elementos materiais, nem o conjunto dos sentidos. Sou algo diferente disso. - Essa é a maneira de fazer a introspecção.

*Tudo isto é um produto de avidya (a não-verdade), e desaparece completamente com o despertar do conhecimento. Os diversos pensamentos (modificações do Antahkarana, a mente) devem ser o criador. - Essa é a maneira de fazer a introspecção.

*A causa material da ignorância e do pensamento é a existência única, sutil e imutável, da mesma maneira que a argila é a única causa material de várias vasilhas feitas de argila. - Esse é o caminho para a introspecção.

*Como eu também sou aquele único, sutil, conhecedor, testemunha, sempre existente e Imutável, não posso duvidar de que eu sou 'Aquele' (Brahman). - Essa é a forma de fazer a introspecção.
*Atman é na verdade aquele sem componentes, enquanto que o corpo é constituído por várias partes; a maioria das pessoas confundem os dois considerando-os idênticos. A que pode-se chamar de ignorância senão isso?

*Atman é o interior e o governador do corpo, e o corpo é o governado e o exterior. Considerar ambos idênticos é o cúmulo da ignorância.

*Atman é todo consciência e todo santidade, e o corpo é todo carne e impureza. Considerar os dois como sendo idênticos é o cúmulo da ignorância.

*Atman é o iluminador supremo e a própria pureza, e o corpo é dito ser opaco e ter natureza densa e escura. Considerar os dois idênticos é o cúmulo da ignorância.

*Atman é eterno porque é a própria existência, o corpo é transitório, porque é essencialmente inexistente. Considerar ambos idênticos é o cúmulo da ignorância.

*Atman é auto-luminoso (pois não necessita nem de sol nem luz alguma para sua iluminação), sua luminosidade é o conhecimento e se manifesta igualmente através de todos os objetos; e não é o oposto da escuridão. Entretanto, até mesmo o próprio sol, como todos os corpos incandescentes, depende de certas combinações para se iluminar, e enquanto combate a escuridão, não consegue removê-la completamente.

*Que estranho que uma pessoa, sabendo perfeitamente que o seu corpo lhe pertence, como qualquer mobília, ainda prossiga com a idéia de que ela seja o corpo!

*Eu sou, na verdade, Brahman, sendo justo e imperturbável, minha natureza é Existência-Conhecimento-Graça (Sat-Chit-Ananda). Eu não sou o corpo (em nenhuma forma, seja grosseiro, sutil ou causal), que é a própria inexistência. A isso os sábios chamam de Verdadeiro Conhecimento.

*Eu sou invariável, sem forma, imaculado e eterno. Não sou o corpo que é a própria inexistência. A isso os sábios chamam de Verdadeiro Conhecimento.

*Eu sou imune a toda doença, estou além de toda compreensão, livre de todas alternativas e sou aquele que dá sentido a tudo, que penetra tudo. Não sou o corpo que é a própria inexistência. A isso os sábios chamam de Verdadeiro Conhecimento.

*Sem atributos ou atividades, eu sou eterno, sempre livre e imperecível. Eu não sou o corpo que é a própria inexistência. A isso os sábios chamam de Verdadeiro Conhecimento.

*Estou livre de qualquer impureza, sou ilimitado, sagrado, sem velhice e imortal. Não sou o corpo que é a própria inexistência. A isso os sábios chamam de Verdadeiro Conhecimento.

*Oh você, ignorante! Por que afirma que o sempre existente e feliz Atman, que reside em seu próprio corpo, é absolutamente inexistente? E que seu corpo por sua vez, é diferente daquele que os Vedas estabelecem e chamam de idêntico à Brahman?

*Oh você, ignorante! Trata de compreender, com a ajuda das Escrituras Sagradas e do discernimento, que o seu próprio Ser, o Purusha, que é diferente do corpo, não é a inexistência (mesmo que seja vazio), e sim a própria existência, mas é muito difícil de ser percebido por pessoas como você.

sábado, 7 de fevereiro de 2009

Meher Baba - O Eterno Agora




Não existe tempo, só a eternidade. Como você pode agarrar a eternidade? Aquele que realizou Deus, percebe que não existem tais coisas como o tempo, o espaço ou qualquer coisa; não há nada além de Deus. Deus é Todo-Conhecimento; Ele é Todo-Sozinho; Ele é Um. Mas o estado infinito de Deus se perde no infinito emaranhado de contradições infinitas. Então Deus, apesar de Todo-Sabedor, pergunta: "Quem sou eu?" através de cada um de vocês - isso também é uma contradição.
Quando ele alcança aquele estado-Cristo, ele diz: "Ah, eu sou Deus!" Leva muitos, muitos nascimentos para alguém chegar a essa resposta pelo questionamento "Quem sou eu?" Entre a resposta final e a pergunta original, existem infinitas contradições, muitas respostas falsas, tais como: "Eu sou fulano, eu sou homem, sou mulher, sou grande, eu sou pequena, sou rico, eu sou pobre, sou branco, sou colorido." E assim por diante.

Ontem já passou, hoje é hoje, e amanhã hoje terá se tornado ontem, e novamente vem outro hoje. Por isso, é eternamente HOJE, AGORA. Não existe ontem, não há amanhã. Existe apenas agora - o momento, o instante - e eternamente é só este Agora. Não há tempo. Novamente, o tempo é o intervalo entre sua primeira imaginação de todas e sua última imaginação. Para estar sempre presente com Deus, nunca esteja ausente Dele.

sexta-feira, 6 de fevereiro de 2009

Jalaluddin Rumi (séc. XIII) - FIHI MA FIHI (discursos do Rumi)

Alguém perguntou: "O que é superior à oração?" Rumi disse: Uma resposta é que a alma da oração é superior à oração, como já expliquei. Uma segunda resposta é que a fé é maior. A oração consiste em uma série de ações diárias, enquanto que a fé é contínua. A oração pode ser abandonada por uma razão válida ou pode ser adiada, mas é impossível abandonar ou adiar a fé por qualquer desculpa. E enquanto a oração sem fé não ganha nada, como no caso dos hipócritas, a fé sem oração é valiosa. Outro ponto: enquanto a oração de cada religião é bem diferente uma da outra, ainda assim, a fé não muda de religião para religião. Os estados que ela produz, o seu lugar na vida e seus efeitos, são os mesmos em toda a parte. Há outras vantagens da fé, mas sua descoberta depende da consciência interior do ouvinte. Cada ouvinte é como farinha nas mãos de um padeiro. As palavras são como água derramada sobre a farinha de acordo com a umidade necessária. Mas a menos que a água seja absorvida, não se pode fazer a massa.

Um poeta disse:
"Meu olho está fixo em outra pessoa, o que devo fazer?
Olhe para si mesmo, pois aquela luz do olho é você.”

"Meu olho está fixo em outra pessoa." Isso significa que você está procurando algo fora de si mesmo, como a secura da farinha que anseia por água das mãos do padeiro. "O que devo fazer?" Saiba que você procura apenas a si próprio, aquele seu anseio é por você. A luz que você procura é a sua própria luz refletida, mas você não vai escapar desta cegueira dos reflexos das luzes externas até que sua própria luz interior torne-se cem mil vezes maior.

Era uma vez um homem muito magro, frágil como um pardal, e muito feio. Era tão feio que até mesmo as outras pessoas feias olhavam para ele com contentamento e davam graças a Deus, embora antes costumassem se queixar da sua própria feiúra. No entanto, por tudo isso, ele era muito grosseiro em sua maneira de falar e esbravejava enormemente. Ele estava no tribunal do rei, e seu comportamento magoava o Vizir, mas o Vizir engolia aquilo. Então um dia o Vizir perdeu seu temperamento. "Pessoas da corte", ele gritou. "Eu tirei esta criatura da sarjeta e o nutri. Ao comer o meu pão e sentar à minha mesa, ao gozar a caridade e a riqueza provenientes de mim e de meus antepassados, ele se tornou alguém. Agora ele chegou ao ponto de dizer tais coisas para mim! "
"Pessoas da corte," clamou o homem, voltando-se face ao Vizir, “nobres e pilares do Estado! O que ele diz é bem verdade. Fui alimentado pela riqueza e caridade dele e dos seus ancestrais até que eu cresci, desprezível e bruto como vocês me vêem. Se eu tivesse sido alimentado do pão e da riqueza de outra pessoa, certamente minha aparência, minha educação e meu valor teriam sido melhores do que isto. Ele me pegou da sarjeta, mas tudo o que posso dizer é: Oh, desejaria que eu fosse poeira. Se outra pessoa tivesse me tirado da sarjeta, eu não teria virado essa chacota."

O discípulo que é alimentado à mesa de um amante de Deus, tem um espírito limpo e verdadeiro. Mas aqueles que são alimentados pelas mãos de um impostor e um fanfarrão, aprendendo a ciência a partir deles, tornam-se assim como seu professor, desprezíveis e frágeis, fracos e incapazes de conformarem suas mentes a qualquer coisa.
Dentro de nosso ser todas as ciências eram originalmente unidas como uma, de forma que nosso espírito exibia todas as coisas escondidas, como a água clara que mostra tudo dentro dela - seixos, cacos e coisas desse tipo - e reflete o céu em sua superfície como um espelho. Essa é a verdadeira natureza da alma, sem tratamento ou treinamento. Mas uma vez que a alma tenha se misturado com a terra e seus elementos terrenos, essa clareza a deixa e ela é esquecida. Então, Deus envia os profetas e santos, como um grande oceano translúcido que aceita todas as águas e, no entanto, não importa o quão escuros ou sujos sejam os rios que desaguam nele, aquele oceano permanece sempre puro. Então a alma lembra. Quando vê o seu reflexo na água que é sem mácula, ela sabe com certeza que no início ela também era pura e essas sombras e cores são meros acidentes.
Os profetas e os santos, portanto, lembram-nos do nosso estado original, eles não implantam nada de novo. Agora, toda água, não importa o quão escura, que reconhece aquela grande água, dizendo: "Eu venho disto e pertenço à isto," é realmente uma parte desse oceano. Mas os elementos escuros que não reconhecem aquele oceano e acreditam que são parentes de outro tipo, fazem suas casas com as cores e as sombras da Terra. Foi por essa razão que o Profeta disse: "Agora, vem a vocês um mensageiro do vosso meio." Em outras palavras, o grande oceano é daquela mesma substância que a sua própria água, é tudo vindo de um Ser e uma fonte. Mas para aqueles elementos que não sentem a atração de familiaridade, esse fracasso não provém da água em si, mas da poluição na água. Essa poluição está misturada tão intimamente que a água não sabe se esse afastamento do oceano vem de si mesmo ou da essência daquela poluição. E assim, os homens maus não sabem se sua atração pelo mal vem da sua própria natureza ou de algum elemento escuro misturado.

Cada linha de poesia que os santos e profetas trazem, cada tradição, cada verso que escrevem, é como uma testemunha que presta testemunho. Eles prestam testemunho a cada situação, de acordo com sua natureza. Da mesma forma, temos duas testemunhas na herança de uma casa, duas testemunhas na venda de uma loja e duas testemunhas em um casamento. Assim também, os santos testemunham. A forma interior de seu testemunho é sempre a mesma, é a forma exterior que difere. Rezo para que Deus possa fazer com que estas palavras prestem testemunho a Ele e a você do mesmo modo.

Bernard de Clairvaux (São Bernardo-séc.XII) - As obras feitas nesta vida são como as sementes de recompensa eterna


Embora o mundo pareça agora dar para aqueles que o amam coisas grandes e honrosas, todos sabem que ele é infiel. Certamente estas coisas não duram e é incerto até quando irão durar. Muitas vezes elas são perdidas pelo homem enquanto ele ainda está vivo. E é certo que irá perdê-las quando ele morrer. E o que na vida humana é mais certo do que a morte e mais incerto do que a hora da morte? A morte não é misericordiosa com a pobreza. Ela não é respeitadora de riquezas. Ela não poupa ninguém por causa de seu nascimento nobre, de seu comportamento, até mesmo de sua idade; ela aguarda na porta pelos velhos e arma emboscadas para os jovens. Infeliz é aquele que, no escuro e nos lugares escorregadios de sua vida, dá suas energias para o trabalho que não pode durar e não reconhece que é vapor que aparece por um instante e vaidade das vaidades.
Homem ambicioso, você obteve alguma dignidade, essa que há muito deseja? Segure-se ao que você tem. Senhor, você já encheu seus cofres? Tem cuidado para não perder tudo. Suas terras têm sido frutíferas? Derrube os celeiros e construa maiores. Torne quadrados os edifícios redondos. Diga a sua alma: "Deves ter bens guardados para muitos anos". Haverá alguém para dizer: "Tolo, esta noite sua alma será exigida de si. A quem vai pertencer tudo o que você tem armazenado?"(Lucas 12:18) E será que somente essa coleção de coisas perecerá e não o seu colecionador também!? Ele irá perecer mais terrivelmente ainda.
Será melhor suar por um trabalho que não se esvairá, que não tennha um resultado fatal. Mas aqui o salário do pecado é a morte, e quem semeia na carne colherá corrupção da carne. Pois nossos atos não passam como parecem passar. Pelo contrário, cada ato realizado nesta vida é a semente da colheita a ser feita na eternidade. Você, tolo, ficará espantado quando ver o enorme rendimento das sementes de sentimento que semeou, boas ou más, de acordo com a qualidade da semente. Aquele que tem isso em mente, nunca pensa que o pecado é uma ninharia, porque ele vai olhar para a colheita futura em vez de olhar o que semeia. Homens semeiam inconscientemente, eles semeiam, escondendo os mistérios da iniquidade e disfarçando as notas da vaidade; o negócio das trevas é feito no escuro.

quarta-feira, 4 de fevereiro de 2009

Hazrat Inayat Khan - A Música das Esferas

Por este título: 'A Música das Esferas' não quero encorajar qualquer superstição, ou qualquer idéia que possa atrair as pessoas para os campos da curiosidade. Através deste assunto gostaria de dirigir a atenção das pessoas que buscam a verdade, para a lei da música, que está trabalhando por todo o universo e que, em outras palavras, pode ser chamada de lei da vida, o sentido de proporção, a lei da harmonia, a lei que traz equilíbrio, a lei que está escondida atrás de todos os aspectos da vida, que mantém este universo intacto e trabalha seu destino ao longo de todo o universo, cumprindo seu propósito.
Música, como conhecemos na nossa linguagem cotidiana, é apenas uma miniatura: aquilo que nossa inteligência tem apreendido desta música ou harmonia de todo o universo e que está trabalhando por trás de nós. A música do universo é o pano de fundo da pequena imagem daquilo que nós chamamos música. Nosso senso de música, a nossa atração por música mostra que a música está nas profundezas do nosso ser. Música está por trás do trabalho de todo o universo. Música não é só o maior objeto da vida, mas música é a própria vida.
Hafiz, nosso grande e maravilhoso poeta da Pérsia, diz: "Muitos dizem que a vida entrou no corpo humano através da ajuda da música, mas a verdade é que a própria vida é música'. Gostaria de lhe dizer o que o fez dizer isso. Existe uma lenda no Oriente, que relata que Deus fez uma estátua de argila à Sua própria imagem, e pediu à alma para entrar nela. Mas a alma se recusou a entrar naquela prisão, pois sua natureza é voar livremente e não ser limitada ou estar vinculada a qualquer espécie de cativeiro. A alma não desejava de forma nenhuma entrar naquela prisão. Então, Deus pediu aos anjos para que tocassem sua música e, conforme os anjos tocaram, a alma foi movida para o êxtase. Sob o efeito daquele êxtase, a fim de tornar mais clara aquela música para si própria, ela entrou neste corpo. É uma bela lenda, e muito mais belo é o seu mistério. A interpretação dessa lenda explica-nos duas grandes leis. Uma delas é que a liberdade é a natureza da alma, e para a alma todo o drama da vida é a ausência de liberdade, que é pertencente à sua natureza original. O próximo mistério que essa lenda nos revela, é que a única razão pela qual a alma entrou no corpo de argila ou na matéria, foi a de experimentar a música da vida e tornar esta música clara para si mesma. E quando somamos esses dois grandes mistérios, um terceiro mistério, que é o mistério de todos os mistérios, vem à nossa mente: que a ilimitada parte de nós mesmos se torna limitada e presa à terra com o objetivo de tornar esta vida, que é a vida exterior, mais inteligível. Portanto, há uma perda e um ganho. A perda é a perda da liberdade e o ganho, é a experiência da vida que é totalmente adquirida pela vinda a esta limitação da vida que chamamos a vida de um indivíduo.
O que nos faz sentir atraídos por música é que todo o nosso ser é música: a nossa mente, nosso corpo, a natureza em que vivemos, a natureza que nos fez, tudo o que está por baixo e em torno de nós, tudo é música. Sendo que estamos perto de toda esta música e vivemos, nos movemos e temos nosso ser na música, por isso ela nos interessa. Ela atrai a nossa atenção e nos dá prazer, pois corresponde ao ritmo e ao tom que estão mantendo o mecanismo de todo o nosso ser intacto. O que nos agrada em qualquer uma das nossas artes, seja desenho, pintura, arquitetura ou escultura, e o que nos interessa na poesia, é a harmonia que está por detrás deles, que é a música. É música que a poesia sugere para nós: o ritmo da poesia ou a harmonia de idéias e frases. Além disso, na pintura e no desenho é o nosso senso de proporção e nosso senso de harmonia o que nos dá todo o prazer que obtemos ao admirar arte. O que nos compele a estar perto da natureza é a música da natureza e a música da natureza é mais perfeita do que a da arte. Temos uma sensação de exaltação ao nos deslocarmos por um bosque, olhar para o verde, estar perto da água corrente que têm o seu ritmo, seu tom e harmonia. O movimento pendular dos ramos na floresta, o surgimento e a queda das ondas - tudo tem a sua música. Depois de contemplarmos e nos tornarmos um com a natureza, nossos corações abrem-se para sua música. Nós dizemos: 'Gosto da natureza', e o que é que desfrutamos na natureza? É a sua música. Algo em nós foi tocado pelo movimento rítmico, pela harmonia perfeita que é tão raramente encontrada nesta nossa vida artificial. Ela nos eleva e nos faz sentir que é este o verdadeiro templo, a verdadeira religião. Um momento passado no meio da natureza com o coração aberto é toda uma vida, se estamos em sintonia com a natureza.
Quando olhamos para o cosmos, os movimentos das estrelas e dos planetas, as leis da vibração e ritmo - tudo perfeito e imutável - isso nos mostra que o sistema cósmico está trabalhando pela lei da música, a lei da harmonia. Sempre que há falta de harmonia de qualquer tipo no sistema cósmico, de maneira proporcional, catástrofes acontecem no mundo e sua influência é vista em muitas forças destrutivas que manifestadas no mundo. Se há algum princípio sobre o qual toda a lei astrológica está baseada - e as ciências da magia e misticismo por trás dela - é o da música. Portanto, tanto no caso das almas mais iluminadas que já viveram neste mundo, como no dos maiores de todos os profetas da Índia - suas vidas foram música. A partir da miniatura de música que entendemos, eles se expandiram para todo o universo da música e dessa forma foram capazes de inspirar. Aquele que encontra a chave para a música de todo o trabalho da vida é aquele que passa a ser intuitivo, que tem inspiração; é ele a quem as revelações se manifestam, para, em seguida, sua linguagem tornar-se música.
Cada objeto que vemos é revelador. De que forma? Ele nos diz o seu caráter, sua natureza e seu segredo. Toda pessoa que vem até nós nos conta seu passado, presente e futuro. De que maneira? Cada presença explica-nos tudo o que contém. Como? Sob a forma de música - se apenas pudermos ouvi-la. Não existe nenhuma outra língua: é ritmo, é tom. Nós a escutamos, mas não com nossos ouvidos. Uma pessoa amigável mostra harmonia em sua voz, suas palavras, seus movimentos e forma. Uma pessoa não amigável, em todos os seus movimentos, no seu olhar e expressão, em sua caminhada, em tudo, vai mostrar desarmonia - apenas quando podemos ver. Eu costumava me divertir na Índia com um amigo que ficava contrariado muito facilmente. Às vezes, quando ele me visitava eu dizia: "Você está contrariado hoje?" Ele perguntava: "Agora, como você sabe que estou contrariado hoje?" Eu respondia: "Seu turbante me diz. A maneira que você prendeu seu turbante não mostra harmonia".
Cada ação nossa mostra uma atitude harmônica ou desarmônica. Há muitas coisas que você pode perceber na caligrafia, mas a principal coisa na leitura da escrita manual são as curvas harmoniosas e desarmoniosas. Elas quase falam com você, e dizem o humor em que a pessoa escreveu. A escrita à mão diz muitas coisas: o grau de evolução do escritor, a sua atitude perante a vida, o seu carácter. Você não precisa ler a carta, você só tem de ver a sua caligrafia, pois as linhas e curvas mostrarão se ele é harmonioso ou não - isso se você puder ver.
Mas em cada ser vivo você pode ver isso, e se você olhar com uma visão aberta para a natureza das coisas, irá ler até mesmo na árvore - a árvore que dá frutos ou flores - que música que ela expressa. Você pode ver a partir da atitude de uma pessoa se essa pessoa será seu amigo ou vai acabar sendo seu inimigo. Você não precisa esperar até o fim, você pode ver à primeira vista se ele está inclinado amigavelmente ou não, porque cada pessoa é música, música perpétua, continuamente tocando dia e noite. Sua faculdade intuitiva pode ouvir essa música e essa é a razão pela qual uma pessoa é repelente e a outra tão atraente: trata-se da música que elas exprimem. Suas atmosferas estão carregadas dela.
Existe uma história de Umar, o conhecido califa da Arábia. Alguém que queria prejudicar Umar estava procurando por ele, e ele soube que Umar não vivia em palácios - embora fosse um rei - mas que ele passava a maior parte do seu tempo com a natureza. Esse homem ficou muito feliz ao pensar que agora ele teria todas as oportunidades para realizar seu objetivo. Conforme ele se aproximou do local onde estava sentado Umar, quanto mais perto que ele chegava, mais sua atitude mudava, até que ao final ele deixou cair o punhal que estava em sua mão, e disse: "Eu não posso prejudicar-te. Diga-me, qual é o poder em você que me priva de conseguir o objetivo que vim levar a cabo?" Umar respondeu: "Meu 'em-um-mento' (at-one-ment -"união") com Deus". Sem dúvida este é um termo religioso, mas o que significa - "em-um-mento" (at-one-ment) com Deus? É estar em sintonia com o Infinito, em harmonia com todo o universo. Em palavras simples, Umar foi o receptáculo da música de todo o universo.
O grande encanto que a personalidade dos santos tem mostrado em todos os tempos foi sua resposta à música de todo o Ser. Esse tem sido o segredo de como eles se tornaram os amigos dos seus piores inimigos. Mas este não é unicamente um poder dos santos, ele é manifesto em toda pessoa em maior ou menor grau. Todos mostram harmonia ou desarmonia de acordo com o quanto estão abertos para a música do universo. Quanto mais estamos abertos a tudo o que é belo e harmonioso, mais nossa vida está sintonizada com essa harmonia universal, e quanto mais você mostrar uma atitude amigável para com todos que encontra, sua própria atmosfera criará música em torno de si.
A diferença entre o ponto de vista material e o espiritual é que o ponto de vista material vê a matéria como a primeira coisa, a partir da qual a inteligência, a beleza e tudo o mais evoluem posteriormente. Do ponto de vista espiritual, vemos a inteligência e a beleza em primeiro lugar e com elas vem tudo o que existe. De um ponto de vista espiritual, vemos que o que consideramos por último é o mesmo que o primeiro. Portanto, na essência de todo este Ser - como sua base - há música, da mesma forma que podemos ver que, na essência da semente da rosa existe a rosa, a sua fragrância, forma e beleza. Apesar da semente não estar manifesta, ao mesmo tempo isso está lá na sua essência. Aquele que se sintoniza não apenas com o Ser exterior, mas também com o interior e com a essência de todas as coisas, recebe um insight sobre a essência de todo o Ser, e, portanto, pode encontrar e apreciar o aroma e flor que ele vê na rosa, na mesma medida, mesmo sendo na semente.
O grande erro desta era é que a atividade tem aumentado tanto, que há pouca margem deixada para o descanso da vida cotidiana. Repouso é o segredo de toda a contemplação e meditação, o segredo de ficar em sintonia com esse aspecto da vida que é a essência de todas as coisas. Quando não se está acostumado a ter descanso, não se sabe o que está por detrás do seu ser. Essa condição é experimentada primeiro ao preparar o corpo e também a mente, por meio da purificação. E, tornando os sentidos mais refinados, tornamos-nos capazes de sintonizar nossa alma com todo o Ser. Parece complexo, e ainda é tão simples. Quando estamos abertos a um velho amigo na vida, sabemos muito sobre ele. É apenas a abertura do coração, é o 'em-um-mento' com nosso amigo; sabemos seus defeitos e os seus méritos. Sabemos como experimentar e desfrutar da amizade. Onde há ódio, preconceito e amargura, existe perda de compreensão. Quanto mais profunda é a pessoa, mais amigos ela tem. É pequenez, estreiteza, falta de desenvolvimento espiritual, o que torna uma pessoa exclusivista, distante e diferente dos outros. Ela sente-se superior, maior e melhor do que os outros; sua atitude amiga parece ter sido perdida. Dessa forma ele se aparta dos outros, e nisso reside a sua tragédia. Essa pessoa nunca é feliz. Aquele que é feliz é o que está pronto para ser amigo de todos. Sua visão sobre a vida é amigável. Ele não é amigável apenas com as pessoas, mas também com objetos e condições. É por essa atitude de amizade que o homem se expande e quebra aqueles muros que o mantém na prisão. E, é ao quebrar os muros que ele experimenta o 'em-um-mento' com o Absoluto. Este 'em-um-mento' com o Absoluto manifesta-se como a música das esferas, e isso ele experimenta de todos os lados: a belezas da natureza, a cor das flores, tudo o que vê, todos que encontra. Nas horas de contemplação e solidão e nas horas em que está no mundo, a música sempre está ali e ele está sempre desfrutando da harmonia.

Bhagavan Sri Ramana Maharshi - Nan Yar? (Quem sou eu?)

1. Quem sou eu?
O corpo grosseiro, que é composto dos sete humores (dhatus), não sou eu; os cinco órgãos de cognição sensitiva, ou seja: os sentidos de ouvir, tocar, ver, saborear, e cheirar, que apreendem seus respectivos objetos, ou seja: som, toque, cor, sabor, e odor, não sou eu; os cinco órgãos sensoriais cognitivos, ou seja: os órgãos da fala, locomoção, compreensão, excreção e procriação, que têm como suas respectivas funções aquelas de falar, movimentar, compreender, excretar, e desfrutar, não sou eu; as cinco respirações vitais, prana, aprana, vyana, udana e samana; que atuam respectivamente nas cinco funções do inspirar, expirar, etc... não sou eu; mesmo a mente que pensa, não sou eu; e também a ignorância, que é provida apenas com as impressões residuais dos objetos e nas quais não há objetos e nenhuma função, não sou eu.
2. Se não sou eu nenhum desses, então quem sou eu?
Depois de negar tudo mencionado acima por meio do ‘não sou isto’, ‘não sou aquilo’, aquela Consciência que permanece sozinha – isso sou Eu.
3. Qual é a natureza da Consciência?
A natureza da Consciência é Satchiananda (existência/consciência/graça).
4. Quando a realização do Ser será obtida?
Quando o mundo, que é aquilo que é visto for removido, haverá realização do Ser, o qual é o observador.
5. Não haverá realização do Ser enquanto o mundo estiver lá (sendo tomado como real)?
Não
6. Por quê?
O observador e o objeto visto são como a corda e a cobra. Assim como o conhecimento da corda, que é o substrato, não surgirá a menos que o falso conhecimento da ilusória serpente saia; assim a realização do Ser, que é o substrato, não será obtida a menos que a crença de que o mundo é real seja removida.
7. Quando o mundo, que é o objeto visto, será removido?
Quando a mente, que é a causa de todas as cognições e de todas as ações tornar-se quieta, o mundo desaparecerá.
8. Qual é a natureza da mente?
Aquilo que é chamado de ‘mente’ é um notável poder que reside no Ser. Ele causa o surgimento de todos os pensamentos. Sem os pensamentos não existe tal coisa como a mente. Portanto, o pensamento é a natureza da mente. Sem os pensamentos não há uma entidade independente chamada mundo. No sono profundo não existem pensamentos e também não há mundo. Assim como uma aranha emite o fio (da teia) para fora e de novo o recolhe para dentro de si, da mesma forma a mente projeta o mundo fora dela e de novo o analisa dentro de si mesma. Quando alguém persistentemente investiga a natureza da mente, a mente termina por deixar o Ser (como o resíduo).
O que é referido como o Ser é o Atman. A mente existe apenas em dependência de algo denso; ela não pode permanecer sozinha. É a mente que é chamada de corpo sutil ou de alma individual (jiva).
9. Qual é o caminho de investigação para compreender a natureza da mente?
Aquilo que surge como ‘eu’ neste corpo é a mente. Se alguém perguntasse qual é o primeiro lugar no corpo em que o pensamento ‘eu’ surge, ele descobriria que ele surge no coração. Esse é o lugar da origem da mente.
Mesmo se alguém pensasse constantemente em ‘eu’ ‘eu’, ele seria conduzido àquele lugar. De todos os pensamentos que surgem na mente, o pensamento ‘eu’ é o primeiro. É somente depois de seu surgimento que outros pensamentos surgem. É depois do aparecimento do pronome de primeira pessoa que os de segunda e terceira pessoa aparecem; sem o pronome de primeira pessoa não haveria os de segunda e terceira.
10.Como a mente se tornará quieta?
Pela investigação ‘Quem sou eu?’. O pensamento ‘quem sou eu?’ irá destruir todos os outros pensamentos, e como a vareta usada para avivar uma fogueira, será ele próprio destruído no final. Então, surgirá a realização do Ser (Auto-realização).
11. Quais são os meios para manter-se constantemente no pensamento ‘Quem sou eu?’?
Quando outros pensamentos surgem, não devemos segui-los, mas sim perguntar: “Para quem eles surgem?” Não importa quantos pensamentos surjam. Para cada pensamento que surgisse, deveria ser questionado com diligência: “Para quem este pensamento surgiu?”. A resposta que emergiria seria “Para mim”. Logo em seguida se perguntássemos “Quem sou eu?”, a mente irá retornaria para sua fonte; e o pensamento surgido ficaria quieto. Com repetida prática, dessa maneira, a mente desenvolverá o conhecimento para permanecer em sua fonte. Quando a mente que é sutil, passa através do cérebro e dos órgãos sensitivos, os nomes densos e as formas aparecem, quando ela fica no coração, os nomes e as formas desaparecem.
Não deixar a mente fugir, mas mantê-la no Coração é o que é chamado “intimidade” (antarmukha).
Deixar a mente fugir do Coração é conhecido como “exteriorização” (bahir-mukha). Portanto, quando a mente fica no Coração, o ‘eu’ que é a fonte de todos os pensamentos passará, e o Ser que sempre existiu brilhará. Qualquer coisa que se faça deve ser feita sem o “eu” egoísta. Se alguém age deste modo, tudo se mostrará ser da natureza de Shiva (Deus).
12. Não existem outros meios para fazer a mente aquietar-se?
Além da investigação de si, não existem meios adequados. Se através de outros meios pudéssemos buscar o controle da mente, a mente pareceria estar controlada, mas de novo seguiria adiante. Também, através do controle da respiração, a mente se tornará quieta; mas ela estará quieta somente durante o tempo que a respiração permanecer controlada; e quando a respiração retomar seu fluxo, a mente também começará a mover-se de novo e irá vagar impelida por impressões residuais.
A fonte é a mesma tanto para a mente como para a respiração. Pensamento, de fato, é a natureza da mente. O pensamento ‘eu’ é o primeiro pensamento da mente; e isso é egoísmo. É dali que se origina o egoísmo e também a respiração. Portanto, quando a mente torna-se quieta, a respiração é controlada, e quando a respiração é controlada a mente torna-se quieta. Mas, em sono profundo, embora a mente torne-se quieta, a respiração não pára. Isso ocorre pela vontade de Deus, de modo que o corpo possa ser preservado e outras pessoas possam não estar sob a impressão de que ele está morto. No estado desperto e no samadhi, quando a mente torna-se quieta, a respiração é controlada. Respiração é a forma densa da mente. Até o momento da morte, a mente mantém a respiração no corpo; e quando o corpo morre a mente leva a respiração junto com ela. Portanto, o exercício de controle respiratório é somente um auxílio para deixar a mente quieta (manonigraha); ele não destruirá a mente (manonash).
Assim como a prática do controle respiratório, meditar sobre as formas de Deus, repetir mantras, restringir a alimentação, etc são apenas auxiliares para render a mente quieta.
Através da meditação nas formas de Deus e através da repetição de mantras, a mente torna-se focada. A mente sempre está vagando. Assim como quando uma corrente é dada a um elefante para que ele a segure em sua tromba, ele segue agarrado à corrente e nada mais, do mesmo modo, quando a mente está ocupada com um nome ou uma forma, ela apenas se agarrará àquilo. Quando a mente se expande na forma de incontáveis pensamentos, cada pensamento torna-se fraco; mas assim que os pensamentos conseguem poder de decisão, a mente torna-se focada e forte: para uma mente assim a Auto-investigação torna-se fácil. De todas as regras restritivas, aquela relacionada a comer alimentos ‘sattvicos’ em quantidades moderadas é a melhor; através da observação desta regra, a qualidade ‘sattvica’ da mente crescerá, e isso será útil para a Auto-investigação.
13. As impressões residuais (pensamentos) de objetos parecem ir como as ondas de um oceano. Quando todas elas serão destruídas?
Quando a meditação no Ser elevar-se mais e mais alto, os pensamentos serão destruídos.
14. É possível que as impressões residuais de objetos que vêm de tempos imemoriais, por assim dizer, sejam dissolvidas e que uma pessoa permaneça como o puro Ser?
Sem submeter-se à dúvida “É possível, ou não?”, uma pessoa deve persistentemente manter-se na meditação do Ser. Mesmo que seja uma grande pecadora, ela não deveria nem se preocupar e nem chorar: “Oh! Eu sou um pecador, como posso ser salvo?" Ela deveria renunciar completamente ao pensamento “Eu sou um pecador” e concentrar-se agudamente na meditação do Ser; então, ela certamente será bem sucedida. Não há duas mentes – uma boa e outra má; a mente é apenas uma. São as impressões residuais que são de dois tipos – favoráveis ou desfavoráveis. Quando a mente está sob a influência de impressões favoráveis ela é chamada boa e quando está sob a influência de impressões desfavoráveis é considerada má.
Não deveríamos permitir que a mente vagasse na direção de objetos mundanos e nem na direção daquilo que concerne às outras pessoas. Não importa quão ruins as outras pessoas possam ser, não deveríamos sustentar nenhuma aversão para com elas. Tanto o desejo quanto a aversão deveriam ser evitados. Tudo aquilo que damos aos outros damos a nós mesmos. Se essa verdade é compreendida, quem não irá dar aos outros? Quando alguém se eleva tudo se eleva; quando alguém torna-se quieto, tudo torna-se quieto. Na medida em que nos comportarmos com humildade, haverá proporcionalmente bom resultado. Se a mente torna-se quieta, a pessoa pode viver em qualquer lugar.
15. Por quanto tempo a investigação deve ser praticada?
Enquanto existirem impressões de objetos na mente, a investigação “Quem sou eu?” é necessária. Assim que surgem os pensamentos, eles devem ser destruídos ali mesmo no exato lugar de sua origem através da investigação. Se alguém faz uso da contemplação do Ser ininterruptamente, até que o Ser seja obtido, isso por si só já é suficiente. Enquanto houverem inimigos dentro da fortaleza, eles continuarão atacando; se forem destruídos assim que emergirem, a fortaleza cairá em nossas mãos.
16. Qual é a natureza do Ser?
O que existe na verdade é somente o Ser. O mundo, a alma individual e Deus são aparências, aspectos dele. Como a prata na madrepérola, esses três aspectos aparecem ao mesmo tempo e desaparecem ao mesmo tempo. O Ser é o lugar onde não há absolutamente nenhum pensamento de ‘eu’. Isso é chamado “silêncio”. O próprio Ser é o mundo; o próprio Ser é o ‘Eu’; o próprio Ser é Deus; tudo é Shiva, o Ser.
17. Não são todas as coisas o trabalho de Deus?
Sem desejo, decisão ou esforço, o sol surge; e em sua mera presença, a pedra-sol emite fogo, o lótus floresce, a água evapora, as pessoas executam suas várias funções e então descansam. Assim como só pela presença do magneto a agulha já se move, é pela virtude da mera presença de Deus que as almas, governadas pelas três funções cósmicas ou pelas cinco atividades divinas, executam suas ações e então descansam, de acordo com seus respectivos karmas. Deus não tem intenção; nenhum karma vincula-se a Ele. São como ações mundanas que não afetam o sol, ou como os méritos e desméritos dos quatro elementos que não afetam o espaço todo-abrangente que eles ocupam.
18. Dos devotos, quem é o maior?
Aquele que entrega a si mesmo ao Ser o qual é Deus, é o mais excelente dos devotos. Entregar-se a Deus significa permanecer constantemente no Ser sem dar espaço para o surgimento de quaisquer pensamentos além daquele do Ser. Quaisquer que sejam os fardos, são descarregados em Deus, Ele os carrega. Já que o supremo poder de Deus faz todas as coisas se moverem, porque deveríamos, sem que nos submetermos a Ele, constantemente nos preocupar com pensamentos sobre aquilo que deveria ser feito e como deveria ser feito, e aquilo que não deveria ser feito e como não deveria? Nós sabemos que o trem carrega todas as cargas, e assim, depois de pegá-lo, por que deveríamos carregar nossa pequena bagagem na cabeça para nosso desconforto ao invés de colocá-la no chão do trem e nos sentirmos aliviados?
19. O que é o não-apego?
Assim que os pensamentos surgem, destruí-los sem deixar qualquer resíduo no exato lugar de sua origem, é o não-apego. Assim como um catador de pérolas amarra uma pedra na sua cintura, submerge para o fundo do mar e lá pega as pérolas, de mesmo modo, cada um de nós deveria ser dotado com o não-apego e mergulhar dentro de si para obter o Ser-Pérola.
20. É possível para Deus e para o Guru efetuar a libertação de uma alma?
Somente Deus e o Guru mostrarão o caminho para a libertação; por si mesmos eles não levarão a alma ao estado de libertação. Na verdade, Deus e o Guru não são diferentes. Assim como a presa que caiu na jaula de um tigre não tem escapatória, aqueles que chegaram dentro do âmbito do gracioso olhar do Guru serão salvos pelo Guru e não ficarão perdidos; ainda assim, cada um deve por seu próprio esforço percorrer o caminho mostrado por Deus ou pelo Guru e obter a libertação. Uma pessoa pode conhecer a si mesma somente com o próprio olho do conhecimento e não com o de outra pessoa. Aquele que é Rama precisa da ajuda de um espelho para saber que ele é Rama?
21. É necessário para aquele que anseia pela libertação investigar sobre a natureza das categorias (tattvas)?
Assim como alguém que quer jogar o lixo fora não precisa analisá-lo e ver o que ele é, do mesmo modo, aquele que quer conhecer o Ser não tem que contar o número de categorias ou investigar sobre suas características; o que ele tem de fazer é rejeitar todas as categorias que escondem o Ser. O mundo deveria ser considerado como um sonho.
22. Não há diferenças entre a vigília e o sonho?
A vigília é longa e o sonho é curto, além dessa não há outra diferença. Assim como os acontecimentos da vigília parecem ser reais enquanto estamos despertos, do mesmo modo nos parecem os de um sonho enquanto sonhamos.
No sonho a mente toma outro corpo. Tanto no estado de sonho como no de vigília, os pensamentos, nomes e formas ocorrem simultaneamente.
23. Ler livros é de alguma utilidade para aqueles que desejam a libertação?
Todos os textos dizem que para obter a libertação uma pessoa deve tornar a mente quieta; portanto, o ensinamento conclusivo é de que a mente deve se fazer quieta; uma vez que isso tenha sido entendido, não há necessidade de intermináveis leituras. Para aquietar a mente, uma pessoa tem somente que investigar dentro de si aquilo que é o Ser; como essa busca poderia ser feita em livros? A pessoa deve conhecer o seu Ser com o seu próprio olho da sabedoria. O Ser está dentro dos cinco invólucros; enquanto que os livros estão fora deles. Já que o Ser tem de ser investigado através do descarte dos cinco invólucros, é fútil procurar por ele em livros. Chegará um momento em que a pessoa terá de esquecer tudo aquilo que aprendeu.
24. O que é felicidade?
Felicidade é a real natureza do Ser; felicidade e o Ser não são diferentes. Não há felicidade em qualquer objeto do mundo. Nós imaginamos através da nossa ignorância que recebemos felicidade dos objetos. Quando a mente vai para fora, ela experimenta miséria. Na verdade, quando seus desejos são satisfeitos, ela retorna ao seu próprio lugar e desfruta da felicidade que é o Ser. Do mesmo modo, nos estados de sono profundo, samadhi e desfalecimento, e quando o objeto desejado é obtido ou quando o objeto indesejado é removido, a mente torna-se direcionada para o interior e desfruta a pura felicidade do Ser. Assim, a mente move-se alternadamente sem descanso indo para fora do Ser e retornando a ele. Debaixo da árvore a sombra é agradável; fora dela, em área aberta, o calor é escaldante. Uma pessoa que esteve sob o sol, sente-se refrescada quando chega na sombra. Alguém que insiste em ir da sombra ao sol e logo volta à sombra é um tolo. Um homem sábio fica permanentemente na sombra. Similarmente, a mente de alguém que conhece a verdade não abandona Brahma. A mente do ignorante, ao contrário, revolve-se no mundo sentindo-se miserável, retornando por um breve tempo a Brahma para experimentar felicidade. De fato, aquilo que é chamado mundo é somente pensamento. Quando o mundo desaparece, isto é, quando não há pensamento, a mente experimenta felicidade; e quando o mundo aparece, ela experimenta miséria.
25. O que é sabedoria-intuitiva (jnana-drishti)?
Permanecer quieto é chamado de sabedoria-intuitiva. Permanecer quieto é dissolver a mente no Ser. Telepatia, saber dos acontecimentos passados, presentes e futuros, assim como a clarividência, não constituem sabedoria-intuitiva.
26. Qual é a relação entre ausência de desejo e sabedoria?
Ausência de desejo é sabedoria. Os dois não são diferentes; eles são o mesmo. Ausência de desejo é evitar voltar a mente em direção a qualquer objeto. Sabedoria significa a aparição de nenhum objeto. Em outras palavras, não buscar qualquer outra coisa além do Ser é desapego ou ausência de desejo; não deixar o Ser é sabedoria.
27. Qual é a diferença entre investigação e meditação?
Investigação consiste em reter a mente no Ser. Meditação consiste em pensar que o próprio Ser é Brahma, existência-consciência-graça.
28. O que é libertação?
Investigar sobre a natureza do seu Ser que está escravizado e perceber sua verdadeira natureza é libertação.